A Próxima (2019)

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A Próxima
Original:Sunod
Ano:2019•País:Filipinas
Direção:Carlo Ledesma
Roteiro:Anton Santamaria, Carlo Ledesma
Produção:Carlo Ledesma, Gino delos Reyes
Elenco:Carmina Villaroel, Mylene Dizon, Krystal Brimmer, JC Santos, Rhed Bustamante, Susan Africa, Kate Alejandrino

Quais horrores uma mãe estaria disposta a suportar para salvar a vida de sua filha? Muitos, segundo o terror sobrenatural filipino Sunod (2019), dirigido e escrito por Carlo Ledesma. Lançado em dezembro de 2019, no longa acompanhamos Olívia (Carmina Villarroel), uma mãe solo em busca de condições financeiras para bancar um tratamento de saúde que pode salvar a vida de sua filha Annelle (Krystal Brimmer).

Olivia, após certa insistência, consegue um emprego em um call center. Durante o dia ela acompanha sua filha no hospital e de madrugada parte para o trabalho para poder pagar as contas. E é neste trabalho que um espírito de uma criança começa a acompanhá-la, ao ponto de possuir o corpo de sua filha, que é curada de repente. O que acaba se tornando um preço ainda mais caro a ser pago.

Os desafios da maternidade e o laço entre mãe e filha são a força motriz do filme, dando um tom muito emocional ao plot. Com as contas acumulando, a saúde de Annelle deteriorando leva Olívia ao desespero para manter em sua vida seu único amor. O desamparo é tão real e palpável que nos evoca empatia pelas escolhas e riscos tomados por Olivia. Seu emprego é abusivo, seus chefes pouco compreensivos e dar conta de tudo parece estar sempre na corda bamba.

O prédio onde trabalha acaba inclusive se tornando um personagem secundário na trama. Apesar do local assombrado ser o ponto de encontro para o início do terror, não convence em sua suposta importância. Parece inclusive um desvio, um episódio à parte, que não conecta muito bem aos personagens e suas interações.

Ao chegarmos no clímax da história, o roteiro tenta mais uma vez amarrar os pontos, tentando mostrar o passado por trás dos elementos de horror do espírito e do prédio, mas se perde. São recortes jogados apressadamente que se apoiam no visual e falham no desenvolvimento e profundidade que serviriam de base para o plot principal. Não traz respostas concretas, faltando clarificação das motivações.

A história é baseada em uma lenda urbana sobre Call Centers nas Filipinas (conhecida como uma grande capital desse tipo de emprego), que são assombrados por fantasmas durante o trabalho e ligações, onde funcionários acabam ouvindo e vendo pessoas mortas. Com roteiro original e boas atuações, Sunod possui ótimos elementos técnicos. Não depende, em sua maioria, de efeitos especiais. Sua ambientação com cenas em tons escurecidos e uma trilha sonora que acompanha os momentos de tensão inicialmente dão o tom de angústia e medo que variam de acordo com os sentimentos da protagonista. Um ótimo uso das câmeras são os cortes e transições de cena quando Olívia emenda e mescla seus compromissos sem conseguir o sono e descanso necessários.

A construção do ritmo se dá em passos lentos, onde no primeiro ato deixa a sensação de que estamos assistindo a um drama. Quando entra no horror e acompanhamos a possessão, esse ritmo muda para uma história acelerada e sem muito desenvolvimento. O último ato entra numa bagunça ao atingir seu clímax, apresentando alguns clichês como jumpscares, claustrofobia em elevadores barulhentos, luzes piscando, vozes distorcidas para a criança possuída cheia de risadas sarcásticas em momentos inapropriados, entre outros.

A cena inicial e dos sonhos de Olivia são as que mais chamam atenção, causando curiosidade por sua execução sem falas além de serem belíssimas visualmente. Outra cena que parece à parte do resto da história é quando alguns personagens estão envolvidos como uma teia de aranha, submersos e emaranhados em fios vermelhos (elementos mitológicos que acabam sendo meros figurantes). Cenas e símbolos que poderiam ter sido muito mais explorados e explicados, e enalteceriam o terror proposto inicialmente.

Apesar de não ser uma história muito diferente e original, levanta uma crítica social a que ponto extremo podem chegar a exploração do ambiente no trabalho e escolhas que pessoas fazem e se submetem para arcar com suas prioridades. Tanto do lado do trabalhador como daqueles detentores do meio de produção. Questionando também todo o sistema de saúde do país.

É um filme mais focado em sua atmosfera do que no seu aprofundamento. Críticas sobre maternidade e trabalho são claras, mas que de certo modo acabam sendo deixadas de lado. O que me lembrou o ótimo filme In My Mother’s Skin, também Filipino e que quem se identificar com a temática poderá encontrar uma execução diferente e eficaz.

Até a possessão como chave parece leve por conta do drama em evidência. Uma das cenas mais assustadoras é quando Annelle acorda a mãe no meio da noite mostrando uma batalha interna e perdendo o controle do seu próprio corpo. Mesmo bem executada leva a um outro fator clichê e um pouco fraco que anda famoso nas obras atuais: procurar no google. Não julgo, pois é bem provável que a maioria de nós faria o mesmo. Mas em viés narrativo, pelo menos aqui, quebra um pouco do ritmo.

A dinâmica entre mãe e filha é belíssima, com atuações convincentes e cheias de talento. Um dos momentos tocantes entre ambas é quando Annelle toca e canta uma música para mãe em uma cena no hospital. Krystal Brimmer tem grande potencial em sua carreira e é alguém que gostaria de acompanhar, principalmente se voltar a participar de obras de terror.

Sunod não é um filme para se assistir mais de uma vez, mas merece ser visto para dar uma chance ao cinema filipino. Seu final não é satisfatório, e a conexão de seus pontos assombrosos falha ao ser deixada de lado. Apesar de uma boa atmosfera sustentada pelo visual e ser bem filmado, tem boa trilha sonora e boas atuações. Ainda assim é bem feito e tem um ótimo tom dramático. A mitologia filipina e a lenda em que foi baseada para sua criação poderiam ser a chave do sucesso se estivessem sob o holofote do desenvolvimento por seus 106 minutos de duração.

Não assusta muito. E todo susto é previsível. Mas por ser um longa de baixo orçamento, lançado como um terror indie em festival (Metro Manila Film Festival), tem seu mérito. Drama e terror são gêneros que podem conversar muito bem entre si, dependendo dos temas abordados. Mães que lutam para salvar suas filhas possuídas já são abordadas há muito tempo (como o inigualável O Exorcista), e é uma temática que tem muito a ser explorada. Mas em Sunod, o que dá mais medo é realmente o valor da conta do hospital.

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Natalia Malini

Final girl nas horas vagas e psicóloga nas horas não vagas que não nega convites para cafés e jogos de tabuleiro. Mãe de pet integral de dois chihuahuas, fã de punk rock e musicais da broadway. Escreve contos de terror publicados em antologias e uma newsletter sobre tudo e nada ao mesmo tempo. Residente de São Paulo que ainda acredita em conexões da vida real por meio do online. Bissexual consumidora assídua de obras criadas e protagonizadas por mulheres.

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