![]() Extermínio: A Evolução
Original:28 Years Later
Ano:2025•País:EUA, UK Direção:Danny Boyle Roteiro:Alex Garland Produção:Bernard Bellew, Danny Boyle, Alex Garland, Andrew Macdonald, Peter Rice Elenco:Jodie Comer, Aaron Taylor-Johnson, Ralph Fiennes, Rocco Haynes, Haley Flaherty, Harriet Taylor, Kim Allan, Sandy Batchelor, Alfie Williams, Christopher Fulford, |
Os infectados de Danny Boyle figuraram o subgênero zumbis e mortos-vivos em um patamar ainda mais assustador. Lançado em 2002, os monstros, consequentes de uma associação do vírus da raiva com os símios, regurgitavam sangue gosmento e perseguiam suas vítimas como predadores vorazes. Houve quem utilizasse a expressão “zumbis velocistas” para caracterizar uma nova concepção de ameaça e que depois inspiraria diversos outros produtos como os mortos-vivos de Madrugada dos Mortos (Dawn of the Dead, 2004) e os também infectados de [Rec] (2007), além de muitos outros. Extermínio (28 Days Later, 2002) foi um dos primeiros destaques de horror do século XXI, provocando a realização de uma continuação, Extermínio 2 (28 Weeks Later, 2007), sem o envolvimento de Boyle ou do roteirista Alex Garland.
Para contextualizar, o primeiro filme mostrava um grupo de ativistas invadindo um laboratório para libertar os animais utilizados em experiências, ignorando o aviso de um cientista sobre eles terem sido contaminados com o vírus da raiva – um dos macacos é visto em um processo de psicologia traumática ao estilo Malcolm McDowell em Laranja Mecânica (Clockwork Orange, 1971). Vinte e oito dias depois, o entregador Jim (Cillian Murphy) acordou no hospital em um Reino Unido pós-apocalíptico, numa ideia posteriormente copiada em The Walking Dead. Após circular pelas ruas desertas de Londres, descobre em jornais soltos espalhados e nos cartazes sobre a evasão em massa da Grã-Bretanha (só faltou referenciar Dia dos Mortos com uma manchete com os dizeres “Os Mortos Andam“).
Ao entrar em uma igreja, entre um amontado de corpos, ele nota que alguns ainda se movem, até a chegada do padre trazer a ele a nova realidade. Ele se une a Selena (Naomie Harris) e posteriormente a Frank (Brendan Gleeson) e sua filha Hannah (Megan Burns), para tentar alcançar um posto militar que anuncia a resposta para o vírus e um abrigo. Boyle faz uso de temáticas sobre família, religiosidade e militarismo, resgatando posicionamentos já trabalhados por George A.Romero em seus filmes como Exército de Extermínio (The Crazies, 1973) e Dia dos Mortos (Day of the Dead, 1985). Com a ótima trilha de John Murphy, Extermínio soube explorar a raiva não apenas como doença, mas consequência da dificuldade de convivência e como ferramenta vingativa, quando Jim percebe as verdadeiras intenções dos militares. Boyle filma com câmeras agitadas, em cortes rápidos, para ainda mais transmitir o estado de loucura de um mundo pós-apocalíptico.
A segunda parte, sob o comando de Juan Carlos Fresnadillo, também se saiu bem nos mesmos moldes, mostrando militares eliminando não somente infectados e a ação de um pai, Don (Robert Carlyle), deixando para trás a esposa Alice (Catherine McCormack) pela própria sobrevivência, tentando enganar seus filhos sobre o passado. Apesar da importância do primeiro filme, considero esta continuação superior por envolver um bom elenco (Jeremy Renner, Rose Byrne, Harold Perrineau, Idris Elba e Imogen Poots) e explorar ambientações urbanas como uma cidade morta e a escuridão dos metrôs. Efeitos melhores, sensação pessimista e as hélices de um helicóptero remetendo a Demons (1985) completaram um pacote bem sucedido nas bilheterias.
Desde 2007, tem se falado sobre uma continuação. Boyle e Garland diziam em entrevistas sobre o interesse em retornar a esse mundo apocalíptico, mas também sobre a dificuldade no desenvolvimento. Foi uma longa jornada, entre argumentos e pré-produção, até finalmente o projeto ter a luz verde necessária. Cillian Murphy assumiu a participação na produção, e Boyle trouxe a boa nova que comandaria o pontapé inicial de uma nova trilogia – realizada caso este primeiro fosse bem nas bilheterias. E que esta iria contar com o retorno de Murphy como Jim, mostrando como ele está depois de tantos anos, contrariando a imagem positiva do final do longa original.
Extermínio 3 começa como o segundo, mostrando o dia 1 da infecção, quando um grupo de crianças, assistindo Teletubbies, é atacada por adultos raivosos. Vinte e oito anos depois, letreiros informam que o vírus foi contido no Reino Unido, relembrando a previsão do Sargento Farrell (Stuart McQuarrie) no primeiro: “Como a infecção poderia cruzar os oceanos? Como poderia atravessar as montanhas e os rios? Eles já pararam! No momento, as TVs estão exibindo sua programação, e os aviões estão voando no céu, e o resto do mundo continua normal. Pense! O que você faria com uma pequena ilha doente? Eles nos colocaram em quarentena.”
Uma comunidade vive em isolamento na chamada Holy Island, conectada ao continente por um estreito. Ali conseguem manter uma vida quase normal, sem comércio, com o compartilhamento de itens e a ação de voluntários. Contudo, como um ritual de passagem, quando pré-adolescentes atingem uma certa idade eles partem com algum adulto para o continente para visualizar a zona perigosa, habitada por infectados e àqueles que resistem ao vírus. Com a mãe Isla (Jodie Comer) doente, seu marido Jamie (Aaron Taylor-Johnson) acredita que seja o momento de amadurecimento do filho Spike (Alfie Williams), numa aventura vista como um grande passo na sociedade quando um jovem de 12 anos mata um infectado – mas que não deixa de ser um ritual estúpido, mesmo que sigam tradições de muitas tribos.
Antes de atravessar uma passagem apenas permitida com a maré baixa, o garoto recebe a instrução: “Se você ficar lá, ninguém irá te resgatar.” No continente, Spike descobre que os infectados se dividiram em raças como os que se arrastam e são lentos e fáceis de matar e os corredores, liderados por um alfa, uma criatura inteligente e de muita resistência, colecionadora de cabeças. Ele enxerga fogo a uma certa distância, e mesmo que o pai desdenhe de sua origem, depois o garoto descobre que se trata do Dr. Kelson (Ralph Fiennes), um médico que decidiu residir no continente e que é visto pela comunidade como louco. Quando Spike descobre mais sobre o pai, ele imagina que talvez o doutor possa ajudar na cura da confusão de sua mãe, precisando de uma atitude ousada.
Contando com a fotografia belíssima de Anthony Dod Mantle e composição dos Young Fathers, Extermínio: A Evolução traça a sociedade e a sobrevivência pós-apocalíptica sobre um viés religioso, quando pequenas comunidades desenvolvem suas próprias regras e rituais. Boyle diz ter se realmente se inspirado na forma como o mundo lidou com a pandemia do COVID, as formas de isolamento e tentativas de voltar à normalidade, e fez referência ao Brexit, a saída do Reino Unido da União Europeia em 2020. “Quando o COVID aconteceu pela primeira vez, usávamos luvas, desinfetávamos mantimentos“, ele disse em entrevista. “Mas, gradualmente, com o tempo, você começa a correr mais riscos.“, justificando o ritual que envolveu o crescimento de Spike.
Sem deixar de lado momentos de ação frenética, com personagens correndo por campos abertos e tentando encontrar um refúgio, Extermínio: A Evolução também tem sequências emocionantes. Quando se imagina que o longa terá o protagonismo de Jamie partindo contra as próprias regras da comunidade, o enredo decide apostar na profundidade de outros personagens, bem mais interessantes pela possibilidade de despertar a preocupação do público. Além da sensacional atuação do jovem Alfie Williams, pode-se destacar o veterano Ralph Fiennes, em um papel inteligente e bastante importante. “A infecção corrói a consciência. E sem a consciência, não há alma.”
Um filme quase perfeito, Extermínio 3 só me desagradou em seu último acorde, numa mudança narrativa que extraiu um pouco da beleza do que fora visto para criar uma ponta para a continuação. Tenho dúvidas quanto aos caminhos que o próximo filme terá, mesmo com a volta de Jim, e se eles irão funcionar bem.