4.3
(3)
Faça ela Voltar
Original:Bring Her Back
Ano:2025•País:EUA
Direção:Danny Philippou, Michael Philippou
Roteiro:Danny Philippou, Michael Philippou
Produção:Kristina Ceyton, Samantha Jennings, Jess Parker
Elenco:Sally Hawkins, Billy Barratt, Sora Wong, Jonah Wren Phillips, Stephen Phillips, Sally-Anne Upton, Mischa Heywood
por Renato Droguett

O terror sobrenatural australiano tem se reinventado nos últimos anos, mesclando folklore local a toques de horror psicológico digno dos grandes sucessos independentes. Após o estrondoso sucesso de The Babadook (2014) — que consolidou Jennifer Kent como uma força no gênero — e o êxito tenso de Relic (2020), o país continuou a surpreender com produções como Run Rabbit Run (2023), que explora memórias perturbadoras em um contexto familiar e Late Night with the Devil (2023), que brinca com o found footage em clima de talk show macabro. No escopo internacional, obras como Hereditário (2018) e o cult A Dark Song (2016) elevaram o terror psicológico sobrenatural, mostrando que o verdadeiro horror se faz na sutileza da espera e no desconforto crescente.

Seguindo essa linhagem, Faça Ela Voltar (2025) — segundo longa de Danny e Michael Philippou, após Talk to Me (2022) — se passa em um subúrbio aparentemente pacato, que aos poucos desdobra seu lado tenebroso. A trama gira em torno dos irmãos Piper e Andy, cuja rotina é virada de cabeça para baixo após conhecerem Laura, uma mãe adotiva obcecada pela ideia de reencontrar sua falecida filha.

Logo de cara, Faça Ela Voltar apresenta pontos fortes notáveis. A fotografia oscila com elegância entre paletas quentes e frias, pontuando emoções de Piper: os tons avermelhados quando o medo se aproxima, e o azulado soturno nas sequências de descoberta. A trilha sonora merece destaque — sabe exatamente quando encher os silêncios e quando recuar, deixando o espectador pendurado apenas pela força da cena. Apesar de ser o segundo longa da dupla, o filme mantém uma identidade visual e narrativa própria, sem parecer apenas uma reciclagem de Talk to Me. E, por fim, o carisma sincero de Sora Wong e Billy Barratt, que vivem Piper e Andy, torna crível o laço fraternal que carregam, amparando o filme mesmo nos momentos mais tensos.

Mas os elogios param por aí. É importante lembrar que um argumento não precisa ser necessariamente inovador para fazer um bom filme — basta olhar para Ari Aster, cujo Hereditário (2018) e Midsommar (2019) não impressionam pela originalidade do enredo, mas pela forma magistral com que articulam cada elemento para criar uma experiência inesquecível. Faça Ela Voltar, por outro lado, escorrega em símbolos batidos: círculo branco ritualístico, troca de almas entre corpos, cultos demoníacos genéricos e a clichê criança possuída — tudo já visto em centenas de produções. Diferente de A Dark Song (2016), que trabalha o ritual como motor do enredo desde o primeiro ato, a preparação aqui é jogada de última hora, sem o peso dramático de quem estudou cada passo do cerimonial. Aliás, muitas informações — como o bullying de Piper no colégio ou as filmagens iniciais dos rituais, até legendadas como tutorial de YouTube místico — surgem, mas não são exploradas.

O maior pecado reside nas lacunas. Laura, que atuou como conselheira por vinte anos, some do mercado sem motivo aparente (a morte da filha, talvez?), mas mantém uma casa relativamente grande sem salário aparente. A criança Ollie é citada pela colega de trabalho, mas jamais foi vista por ninguém? E o ritual? Ficamos sem entender como seu culto se cria ou se espalha. As fitas, que em um momento chegam a servir de instrução para “acalmar” Ollie, parecem ter sido assistidas inúmeras vezes, mas nada disso dialoga com a narrativa principal. E quando o filme apela para o horror gráfico, o sangue em tom rosa‑forte e textura gosmenta afasta qualquer nojo genuíno, lembrando efeitos de série B em vez de um terror visceral.

Em Faça Ela Voltar, a premissa promissora se desfaz em clichês e lacunas, e o estilo dos Philippou, embora perceptível, não salva o roteiro inorgânico. Vamos seguir uma linha de raciocínio aqui: de um lado, temos A Dark Song (2016), que mantém os pés no chão e busca apresentar um ritual sobrenatural com o maior realismo possível, conduzindo o espectador por cada passo da preparação como se fosse um manual sagrado, e do outro, Men (2022), de Alex Garland, que ousa deslocar a criatura para o campo metafórico e de subtextos, onde a ameaça assume formas simbólicas e psicológicas, mais do que físicas. Faça Ela Voltar, porém, não decide entre o realismo ritualístico ou o sobrenatural metafórico e acaba se saindo mal em ambos os aspectos: o ritual soa apressado e mal fundamentado, sem a densidade dramática de A Dark Song, e o componente simbólico é genérico demais para flertar com a inquietação plausível de Men. Os símbolos inflamados de tanto uso não assustam mais; a falta de arcos dramáticos impede qualquer empatia ou revolta genuína pelos destinos de Piper e Andy.

Faça Ela Voltar acerta no visual e na trilha sonora — comprovando que Danny e Michael Philippou consolidaram um estilo próprio no cenário do terror sobrenatural — mas acaba frustrando em diversos aspectos fundamentais. Em um momento em que o gênero vive um renascimento pautado tanto pelo realismo ritualístico de A Dark Song quanto pelo terror metafórico e psicológico de Men e pela engenhosidade narrativa de obras como Hereditário e Midsommar, o filme hesita entre sustentar a verossimilhança do ritual e explorar o campo simbólico, tropeçando em ambos. Apesar de imagens bem compostas e do carisma de Piper e Andy, o roteiro recorre a clichês de círculos brancos, cultos demoníacos genéricos e criança possuída, sem desenvolver arcos de personagens ou justificar as lacunas logísticas que rompem a imersão. No atual panorama do terror que abraça fantasmas, demônios e rituais — com produções como Run Rabbit Run, Late Night with the Devil, além dos clássicos recentes —, Faça Ela Voltar é visualmente atraente, mas peca na consistência narrativa, originalidade e na construção de horror que cause impacto real: um filme de bela forma, mas de substância vazia.

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