4.5
(4)

A beleza é verdade, a verdade é beleza, isto é tudo quanto conheceis na Terra e tudo quanto necessitais conhecer. – John Keats

Quanta beleza e poesia pode estar por detrás de uma obra cinematográfica, ainda que de terror? Sim, um bom filme de terror nem sempre é aquele onde o diabo aparece pessoalmente. E irei mais longe ainda afirmando que os bons filmes de vampiros nem sempre são aqueles onde os caninos afiados são exibidos explicitamente, se bem que cada gênero e estilo possuem sua grandeza própria independente de crítica.

Fome de Viver (1983) (8)

Um exemplo da minha afirmação é o filme Drácula, estrelando como ator principal Frank Langella. Lançado no ano de 1979, é uma adaptação do romance de Bram Stoker, muito bem feita, e em nenhum momento Drácula mostra seus afiados caninos, mas em compensação é um excelente filme de terror com todas as situações que culminam num monstruoso desfecho de amor, crime, sedução e morte, envolto em uma atmosfera de horror. Drácula aqui se apresenta sem nenhum traço de crueldade, porém sua postura e suas palavras é que vão enchendo o filme de mistério, mas no fundo da alma ele é o vampiro demônio sedutor e cruel…

Fome de Viver (The Hunger, 1983) seria então outro filme de terror onde existe um vampirismo explícito, mas em nenhum momento aparecem presas aguçadas para dilacerar o pescoço de uma bela mulher, e, nitidamente, vê-se nas cenas, fortes impressões de marcas de sangue e tudo impregnado de um inconfundível universo gótico. Diria que é o cult de todos os góticos apreciadores do gênero terror-vampírico, um clássico de grande relevância!

Fome de Viver (1983) (9)

Logo na primeira cena, na abertura do filme, a banda Bauhaus está tocando num salão gótico – a faixa por eles gravada em homenagem e memória ao ator Bela Lugosi. É exatamente a música Bela Lugosi is Dead. Em destaque está a exuberante beleza de Miriam (Catherine Deneuve), que é uma vampira vênus, que contracena com John (David Bowie), o grande astro do rock and roll.

O casal habita um luxuoso apartamento ricamente decorado com peças de arte entre quadros, esculturas e cortinas, junto à um grande piano onde tocam-se obras de Sebastian Bach, Delibes e Schubert, e o filme todo se dá ao som das obras excepcionais destes célebres músicos, dando à cada cena um toque mais profundo de mistério, erotismo, terror e poesia.

Fome de Viver (1983) (7)

John envelhece aceleradamente, pois ele foi contaminado pela bela Miriam, que sugou sua vida, em especial sua juventude. Ela, a cada nova vítima em que suga-lhe o sangue, rejuvenesce e fica mais bela, ao passo que a vítima tem morte instantânea ou envelhece gradualmente como é o caso de John.

A Dra. Sarah (Susan Sarandon), outra vênus em beleza, pesquisa em seu laboratório as causas da degeneração física do ser humano, e escreve um livro sobre a velhice prematura, as causas e os efeitos, e como combater esta degeneração. Ela faz estudos com macacos enjaulados.

Fome de Viver (1983) (6)

John degenerou-se completamente, buscou auxílio com a dra. Sarah, mas ela mal o entendeu. Então John foi enclausurado num caixão no sótão do apartamento de Miriam, em estado extremo e avançado de velhice… e agora a bela Miriam, a vampira, procura por uma nova vítima… e ela já tem em vista sua nova companheira…

A Dra. Sarah faz uma visita ao apartamento de Miriam com o objetivo de avaliar a degeneração física de John. A vampira diz que John viajou para longe, despistando-a. Aqui seus olhares novamente se entrecruzam como se uma percebesse vivamente a extrema beleza e jovialidade da outra, e neste impulso proibido de desejo e luxúria, Miriam e Sarah, após uma conversa amena, deixam-se entregar-se sem resistência.

Fome de Viver (1983) (5)

A cena mais forte e mais envolvente do filme acontece entre beijos e carícias envoltas numa atmosfera de prazeres indescritíveis entre duas lindas mulheres ardentes por novas emoções, que esvoaçam-se cortinados por entre a brisa perfumada de um almíscar selvagem, e embaladas ao som da ópera Lakme de Delibes, com o trecho Flower Duet dando o toque final na mais clássica cena de lesbianismo vampírico do cinema.

Miriam drenou parte de seu sangue para o corpo de Sarah e agora a doutora está contaminada, condenada à vida eterna e como uma vampira ela só irá sobreviver se beber sangue humano. Começa então o martírio de Sarah, que não entende a transformação que ocorre em seu organismo, o qual fica debilitado, mergulhado na depressão, com dores, angústias, febres, suores frios, medo… e por fim, uma estranha sede…

Fome de Viver (1983) (4)

Percebemos nitidamente que o vampirismo foi usado como uma metáfora para dar enlace a uma atitude sexual de forte impacto às próprias paixões e aspirações humanas. A fome de viver aperta o indivíduo, que se vê impelido a buscar e dar continuidade de vida através do sangue, o símbolo perpétuo da vida eterna.

Na sequência do filme, Sarah desentende-se com Miriam mas acaba ficando enclausurada num quarto do elegante apartamento decorado com peças de arte grega e romana, alimentando-se de sangue…

Fome de Viver (1983) (3)

No final da fita, o horror e o sobrenatural são invocados numa sinistra cena onde espectros, caveiras, corpos em decomposição, vampiros, todas aquelas vítimas que haviam sido enclausuradas em caixões no sótão do apartamento por Miriam, levantam-se! Rebelam-se! Contra a vampira mestra que ali os condenou a ficar para sempre.

John surge novamente, mas completamente decrépito, para sua fatídica vingança. Ouvem-se gritos desesperados, ventanias esvoaçam as longas cortinas e tudo envolve-se num profundo clima de terror. Como num pesadelo infernal as criaturas querem vingar-se de Miriam… Ela reluta com todos os seres…

Fome de Viver (1983) (2)

De repente, Miriam precipita-se do alto do sótão e cai a pique estourando todos os ossos de seu corpo. Os espectros também começam a decompor-se como que formados por cinza e poeira da morte!

Miriam, a bela “vampira vênus” como eu a havia chamado no começo desse texto, vai virando uma velha decrépita e seus louros cabelos vão esbranquecendo lentamente, desfigurando-se seu belo rosto, e transformando-se numa horrenda caveira que tem o aspecto roxo da própria morte…

Fome de Viver (1983) (1)

Depois desta impressionante cena de terror, sobre o efeito especial da câmera, o filme vai acabando embalado na sonata para violino e piano de Franz Schubert, voltando novamente à beleza e poesia que foram o pano de fundo de todo o filme.

Agora, Sarah começará tudo outra vez… para sempre, como herdeira da maldição de Miriam, a mais bela mulher vampiro que o cinema já produziu…

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3 Comentários

  1. O melhor filme de vampiros que já vi! Catherine Deneuve no auge de sua beleza

  2. Um dos melhores filmes de vampiro de todos os tempos.

  3. Um dos melhores filmes de vampiro de todos os tempos.
    Miriam Blaylock é, sem dúvida, a mais bela mulher vampiro do cinema.

    9,5 / 10,0

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