O Terceiro Olho
Original:Mata Batin
Ano:2017•País:Indonésia Direção:Rocky Soraya Roteiro:Rocky Soraya, Riheam Junianti, Fajar Umbara Produção:Raam Soraya, Rocky Soraya, Elenco:Jessica Mila, Denny Sumargo, Citra Prima, Epy Kusnandar, Bianca Hello, Anita Hara, Derry Drajat, Voke Victoria, Shofia Shireen |
Rocky Soraya parece ter cadeira cativa na Netflix. Todos os seus filmes de horror se encontram disponíveis na plataforma, o que é bom porque permite ao espectador conhecer o cinema de gênero da Indonésia e ter acesso a uma cultura diferenciada. O bom termina por aí. Por outro lado, quem já esbarrou em longas como The Doll (2016), The Doll 2 (2017), Boneca Maldita (2018), Suzzanna: Enterrada Viva (2018) e os dois da franquia O Terceiro Olho já sabe o que se pode esperar: sangreira, fantasmas vingativos, possessão exagerada e muita, mas muita inspiração no cinema hollywoodiano. Principalmente o que faz sucesso na América, e também por culpa do espectador que já está acostumado com o que chega por aqui, muito do que se vê pela câmera do diretor já não empolga, embora a boa intenção precise ser enaltecida.
Com produção da Netflix, O Terceiro Olho (Mata Batin) bebe descaradamente de O Sexto Sentido (1999), The Eye – A Herança (2002) e da franquia Sobrenatural, de James Wan, iniciada em 2010. Traz, no roteiro de Fajar Umbara e Riheam Junianti, baseado no argumento de Soraya, duas irmãs envoltas em um pesadelo assustador tentando entender a capacidade que possuem de ver “o que ninguém mais vê” como assombrações e o Outro Lado. Desde pequena, Abel (Bianca Hello) precisa lidar com aparições, vultos e sons estranhos, o que a obriga a sempre usar um fone de ouvido até mesmo para conseguir dormir. Após um episódio na infância, que culmina com seus gritos de desespero e as pernas arranhadas, ela e a família se mudaram para Bangkok.
Anos mais tarde, a irmã dela, Alia (Jessica Mila), reencontra-a devido à perda dos pais em um acidente de carro – desnecessariamente mostrado em um efeito risível. Sem dinheiro para manter a casa em Bangkok, elas são obrigadas a retornar para a morada em Jacarta, mesmo contra a vontade da mais nova, que ainda vive com as lembranças terríveis dos fenômenos que presenciou. Alia a considera levemente desequilibrada, imaginando que se trata de um problema psicológico, tanto que pede ajuda da especialista Bu Windu (Citra Prima) para abrir seu “terceiro olho“, aquele que permite o acesso ao mundo sobrenatural, com o intuito de mostrar à irmã que é tudo parte da imaginação dela.
A partir de um ritual que desperta sombras e vultos – em um efeito até interessante -, Alia começa a ter encontros com fantasmas, inicialmente no hospital ao descobrir que conversava com uma menina morta. A regra do Sexto Sentido é resgatada aqui, na fala de Windu: “Nem todos sabem que estão mortos.“, com o acréscimo de que alguns, os mais perturbados, voltam deformados com as feridas expostas. Algumas cenas no próprio hospital até trazem alguns arrepios como a que mostra um paciente virando o pescoço ao estilo O Exorcista, o que está no banheiro e principalmente a do elevador, rivalizando com um momento angustiante em The Eye.
O problema maior se concentra em sua própria casa, com uma família de três pessoas, vítimas de um assalto, que estão dispostos a realmente incomodar. Windu, então, acredita que precise ouvir os mortos (Ecos do Além) para solucionar a pendência em vida, antes que eles consigam possuir alguém para a vingança almejada. Sim, aqui ignora-se o que o cinema fantástico e seus pesquisadores do sobrenatural nos ensinaram de que fantasmas não possuem pessoas, somente demônios. Outro ponto que irá incomodar o espectador é o fato de que aqueles fantasmas que não sabem que estão mortos serem completamente físicos, podendo tocar e fazer o que querem no mundos dos vivos.
Tentar ouvi-los não é fácil pelo fato deles não falarem – nem todos. Assim, as irmãs e a especialista se veem obrigadas a entrar no mundo sobrenatural para tentar entender o que eles buscam. No último ato, a alma de uma delas será levada ao Além e precisará ser resgatada pela outra, num passeio por um inferno de túneis estreitos e espíritos errantes, visualmente bons. Como é de praxe nos filmes de Soraya, o público terá algumas surpresas – nada incrivelmente chocante -, até seu final quase otimista, antecipando a realização de O Terceiro Olho 2, lançado este ano.
Não se pode condenar Rocky Soraya pelos aspectos técnicos. Boas partes dos efeitos são bons, com destaque para a família morta e seus olhos brilhantes, e o cenário do mundo sombrio, que remete à paleta do inferno de José Mojica Marins. Há uma boa trilha sonora, uma bela fotografia que acentua a atmosfera de horror por meio de trovoadas intensas, além do elenco carismático e bastante esforçado, destacando o tormento de Bianca Hello. Até mesmo a direção está bem evoluída, com seus travellings atraentes, que sempre atravessam os buracos de fechadura, e câmeras bem posicionadas. O que incomoda é exatamente o roteiro pouco inspirado, a necessidade de expor referências, e algumas ideias ruins como a dos fantasmas físicos e o melodrama no final, na perda de algum personagem.
O Terceiro Olho pode até divertir quem não conhece muito do gênero e busca uma história de fantasmas vingativos, com altas doses de sangue em profusão e pirotecnia. Não se trata de um olhar diferenciado a uma imensa filmografia de produções parecidas, sendo apenas raso e curioso. De qualquer forma, deve-se parabenizar esse cineasta que está sempre alimentando o horror e mantendo-o em destaque no cinema atual.
O inferno no final parece uma mistura de Hermes e Renato com Ivo Holanda