Antologia Dark
Original: Ano:2020•País:Brasil Autor:César Bravo, Cláudia Lemes, Vitor Abdala, Carol Chiovatto, Everaldo Rodrigues, Marco de Castro, Ferréz, Ilana Casoy, Fernando Toste, Alexandre Callari, Antônio Tibau, André Pereira, Soraya Abuchaim, Andrea Killmore•Editora: Darkside Books |
Com grandes obras, vem grandes legados. Com grandes legados, uma fiel legião de fãs.
É praticamente impossível não conhecer alguma obra que seja de Stephen King, não importa a geração. Um nome presente na literatura, no cinema, séries e até quadrinhos.
Suspense, terror, thriller psicológico, espíritos, ficção científica, drama, muito sangue, fantasia. Escolha seu favorito. Tem King para todos os gostos e muito mais.
Quem não conhece a clássica cena do corredor cheio de sangue de O Iluminado ou nunca ouviu falar de Pennywise? Ficou tenso pela situação do escritor Paul Sheldon em Misery? Se emocionou com À Espera de um Milagre? Identificou-se por um momento com Carrie? Talvez seu primeiro contato tenha sido no cinema ou TV, talvez tenha ouvido uma certa música do Ramones e foi atrás do filme; talvez tenha encontrado um livro na cabeceira do quarto dos seus pais. Uma coisa é certa: você não passou ileso ao efeito King.
Com mais de 50 obras publicadas, muitas delas adaptadas para TV ou cinema, diversos prêmios acumulados e conhecido como um dos autores mais traduzidos no mundo, Stephen King é referência para os amantes de horror e inspiração para escritores do meio. E foi pensando nisso que nasceu Antologia Dark.
Diversos nomes nacionais bem conhecidos no meio macabro se reuniram para prestar sua singela homenagem ao Rei em uma belíssima edição da DarkSide Books.
Como não poderia ser diferente, a organização do livro ficou por conta de César Bravo, fã incondicional do Mestre, como já deixou bem claro em seu livro VHS – Verdadeiras Histórias de Sangue – também publicado pela DarkSide – , em que podemos perceber diversas influências de King.
Bravo escreve a introdução da Antologia, mostrando mais uma vez toda sua devoção pelo Homem do Maine, e também um conto, e explica o motivo: Enquanto a Caveira ama e utiliza como símbolo de boa sorte, o Rei não é o maior fã do número resultante da soma de dez com três. Sendo assim, um modo de solucionar esse impasse foi transformar dez mais três em dez mais quatro, mas sem perder a essência de dez mais três. Confuso? Um pouco. Mas muito sagaz.
Cada conto vem antes com um breve texto, explicando qual história serviu de inspiração. Às vezes, com nuances de mais de uma história em um mesmo conto, cada qual com suas peculiaridades, porém com uma semelhança: todos os contos honram e fazem jus ao brilhantismo dos autores no terror nacional.
Creed – O primeiro conto foi escrito por Cláudia Lemes. Como o nome sugere, a história que serviu de inspiração foi O Cemitério.
Nele, conhecemos o outro lado da história. A história do motorista que atropelou o pequeno Gage Creed.
Asher mora com sua avó catatônica e sofre de depressão e remorso arrebatadores após o acidente que matou o pequeno bebê. Foi inocentado perante os olhos da justiça, porém, nunca se perdoou.
Em uma de suas sessões de terapia, comenta com a nova terapeuta, que parece ter nojo dele, que sua avó falou. Entretanto, o que ela diz, e voltará a dizer, deixa Asher tão arrepiado a ponto de não ousar proferir a mesma palavra.
Em poucas páginas, temos não só uma reviravolta eletrizante, como também um final extremamente satisfatório e assustador.
O Zagueiro – Neste conto não temos apenas referências a King, mas também a acontecimentos nacionais reais, mesclados de modo brilhante pelo autor Vitor Abdala. A história utilizada como inspiração foi Blockade Billy.
O jornalista Michel é chamado em cima da hora para uma coletiva de imprensa com o zagueiro Breno. Uma coletiva às quatro da manhã.
A curiosidade jornalística venceu a estranheza, e lá foi Michel para a casa do zagueiro que, aparentemente, queria dar explicações para a imprensa e fãs antes de deixar o país.
Breno era acusado de matar a esposa e a filha, desaparecidas há duas semanas. Mas claro que ninguém acreditava nessa história. O jogador sempre fora gentil e bem sucedido.
Ao chegar lá, Michel se vê sozinho e trancado em uma sala, e começa a questionar se a história era mesmo tão absurda….até que Rose, esposa de Breno, aparece à porta.
Quando parece que temos uma solução, outra surpresa aparece. A escrita de Vitor Abdala prende até a última linha, com um desfecho digno do Mestre.
Granizo Fino – César Bravo se questiona de onde surgiu o corpo de Outono da Inocência – O corpo e, aparentemente, nos dá a resposta neste conto.
Cansado das constantes agressões do pai e da tediosa cidade de Chamberlain, Lagosta decide fugir de casa em busca de um lugar melhor.
Após andar o dia todo, encontra um galpão abandonado, sem teto, para descansar. De repente, ouve um pedido de ajuda. Uma garota fugindo dos homens maus que andam perto dos trilhos, como sua mãe alertara.
Ele enfim se move para ajudar a garota – Claire – e, juntos, parecem despistar seu perseguidor.
Conforme eles trocam histórias, claro que tudo não ficaria tranquilo.
A pura crueldade humana é mostrada mais uma vez.
Parece que, afinal, ser um bom menino não compensa.
A Hora da Bruxa – Conto inspirado em Salem’s Lot, por Carol Chiovatto.
Parece que estamos lidando com uma história de bruxas, mas é um pouco mais do que isso. A intolerância típica da idade média com tudo que é diferente do que estão acostumados.
Celina, uma parteira local, tem sua casa incendiada enquanto enfrenta acusações terríveis de assassinato e bruxaria. Porém, há algo diferente no ar. Algo assustador, e não são os aldeões ameaçando queimá-la.
Eis que ela é salva por um distinto homem, o qual ela imediatamente acha que é o Diabo. O homem, porém, se identifica como Boerescu. Não é o Diabo, mas também não passa muito longe.
Os anos passam, e Celina foge incansavelmente de Boerescu. De repente, encontra-se no Brasil, época da ditadura.
Ironicamente, descobre que há monstros muito piores do que Boerescu ou o Diabo no mundo atual.
Porta não Encontrada – A Torre Negra é a maior, mais complexa e mais ambiciosa obra de King, onde tudo é interligado. E também serviu de inspiração para o conto de Everaldo Rodrigues.
Um belo dia, Edwin nota algo diferente no escritório do edifício Mills. Uma porta. Uma porta que levava, literalmente, ao lado de fora de um prédio de quinze andares.
Conversando com si mesmo, debate se aquela porta sempre esteve ali, se deve atravessá-la e, mais importante: O que tem do outro lado?
Uma porta comum? Alucinação causada por noites a fio sem dormir? Uma ruptura da realidade?
Edwin está prestes a sanar suas dúvidas. E além.
Cárem Sinistra – Leia o nome do conto em voz alta. Mais uma vez. E outra, se necessário. A referência do conto escrito por Marco de Castro é nossa queridíssima Carrie.
Cárem, tal qual Carrie, é uma garota, no começo da adolescência, que sofre bullying na escola de um jeito extremamente pesado.
Sua aparência, suas roupas, o fato de sua mãe não deixar ela ter contato algum com tecnologia, por não ser coisa de Deus, e chamar todos os outros alunos da escola de crianças satânicas. Tudo isso contribui para sua impopularidade, até mesmo entre os professores.
Tão sangrenta quanto a história original, Cárem desenvolve seus poderes e sua raiva a partir de determinado episódio um tanto quanto sanguinolento, fazendo um massacre sem dó.
Santa Negra – Inspirado pela história Verão da corrupção – Aluno inteligente, Ferréz narra a história de um garoto obcecado pela polícia e que acha que bandido bom, é bandido morto.
O garoto, Rafael, encontra então Rodnei. Policial aposentado da ROTA.
Rodnei sacia a curiosidade do garoto, além de dar algumas lições.
Quando cresce, Rafael acaba virando escritor. E é sua vez de aplicar uma ou outra lição.
O Amanhã de Ontem – Ilana Casoy surpreende nesse conto, inspirado por Novembro de 63.
Um presidiário atordoado, alucinando enquanto lembrava do suicídio da mãe, o qual foi considerado assassinato e ele, culpado.
Ardendo em febre, um senhor chamado Chico vem cuidar dele. O presidiário acaba apagando e acordando diversas vezes ao longo dos dias, sem saber o que é real e o que é pesadelo. Tivera um vislumbre do futuro? Será que poderia mudar aquelas escolhas?
Uma única decisão pode mudar toda a sua vida.
O Visitante – Inspirado em A Metade Negra, o conto de Fernando Toste nos apresenta Tadeu, um escritor que possui alguns problemas com bebidas.
Certa madrugada, Tadeu escuta uma voz e, misteriosamente, tem um ímpeto de inspiração e começa a escrever sem parar. Isso se repete madrugada após madrugada, sempre depois do escritor atingir um certo torpor alcoólico.
Quando se dá conta, escreveu algo tão grotesco que faz Tadeu se sentir outra pessoa.
Retorno ao Ciclo do Lobisomem – Alexandre Callari escreve um conto homenageando a obra A hora do Lobisomem, ao mesmo tempo que também é sua inspiração.
Manu é um grande fã de Stephen King, enquanto seu amigo, Ricardo, acha isso uma literatura barata feita para as massas. Em uma de suas discussões, Manu defende apaixonadamente as obras de King, e acaba por convencer o amigo a assistir ao filme Bala de Prata, baseado em um de seus livros favoritos do Mestre.
Como diz ao amigo, e é reforçado por Alexandre Callari, todos estão sujeitos a se tornarem monstros.
O Terceiro Testamento – Conto escrito por Antônio Tibau, utilizando A Zona Morta como inspiração.
João é diagnosticado com esquizofrenia paranoide. Desde criança ouve vozes que lhe diziam o que ia acontecer. E uma dessas vozes diz que ele é o escolhido para uma importante missão: decifrar o terceiro testamento, coisa que estava determinado a cumprir.
Acaba se tornando enfermeiro e, ao tocar nas pessoas, consegue distinguir se são boas ou más. João acredita que precisa transcrever tudo o que ouve e vê em cadernos para enfim cumprir sua missão dada pelo anjo.
Missão essa que não era exatamente o que ele pensava, apesar de já estar cumprindo há muito, muito tempo.
Exotermia – No conto, André Pereira imagina o que teria acontecido à Incendiária Charlene McGee.
A resposta é bem simples. Botando fogo em tudo, é claro.
Grand Finale – Soraya Abuchaim se baseia em Saco de Ossos para contar a história de Scott, um mágico que tirara a sorte grande ao comprar uma bela casinha à beira do lago por uma pechincha. Havia alguns rumores um tanto assustadores sobre a casa rondando a cidade, mas tudo bem.
O local era perfeito para realizar seu mais novo projeto. O Dia do Horror.
Alguns fenômenos não são simples truques assustadores de mágica.
Apesar do nome do conto, ainda não é o final da antologia. Apenas o final do show de Scott.
Miséria – A inspiração desse conto parece fácil de reconhecer, certo? Errado. Apesar da clara referência à Misery, temos muito mais do que isso. Ilana Casoy e Raphael Montes se juntam mais uma vez, sob o pseudônimo de Andrea Killmore, para escrever uma história alucinante digna do Rei.
Joyce acaba de ter seu polêmico artigo sobre Stephen King publicado e, vaidosamente, acredita que será promovida. O alcance foi excelente, as redes sociais estão em polvorosa com o que foi dito. Enfim colheria os frutos de seu trabalho.
Ledo engano.
A escritora se vê obrigada a devorar diversas obras de King e escrever uma história à altura. Ao tentar se livrar desse “horror”, passa por diversas causos absurdos distintamente similares. Talvez devesse ter prestado mais atenção aos livros.
Um conto recheado de referências e situações, Ilana Casoy e Raphael Montes encerram de forma magistral essa assombrosa Antologia.
Enaltecendo escritores brasileiros, Antologia Dark é um livro indispensável para os amantes de horror e, especialmente, fãs de Stephen King.
Primeira resenha desse livro que eu vejo que fala de cada conto. Sensacional! A dedicação de vocês é show!