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Apocalipse Segundo Fausto
Original:
Ano:2020•País:Brasil
Autor:Marcos DeBrito•Editora: Coerência

Fausto foi oficialmente publicado em 1808, escrito pelo alemão Goethe.

Macário, escrito por Álvares de Azevedo, foi publicado  três anos após sua morte, em 1855.

Em ambas as obras, temos a presença do Diabo tentando ludibriar os protagonistas.

E o que isso tem a ver com Apocalipse Segundo Fausto, décimo livro do escritor e cineasta Marcos DeBrito? Além do nome do protagonista ser a junção dos nomes dessas duas obras, Fausto Macário também precisará lidar com as ardilosidades de Satã.

Fausto, um ator muito conhecido por interpretar Jesus, está encenando o segundo ato do Calvário – Morte e Crucificação, quando um relâmpago deu fim prematuramente ao espetáculo.

De volta à cidade de São Paulo, Fausto começa a sentir uma certa angústia e incômodo aparentemente inexplicáveis. Era seu aniversário de 33 anos, e ele não conseguiu reencenar a Ressurreição de Cristo. Apesar da insistência de sua terapeuta, Dra. Laila, sobre o assunto, ele nega veementemente. Ele não acha que é Jesus, não tem motivo para se incomodar com a sua idade. Aliado a tudo isso, duas pintas apareceram em sua testa.

Apesar de sua recusa em acreditar em uma hipótese tão absurda quanto essa, seu subconsciente está abalado pelo acontecimento. Atribuindo seu desconforto às recentes manchas, decide ir ao consultório médico removê-las. Ele é ator, precisa estar sempre impecável, especialmente para representar Jesus.

Sua devoção ao interpretar o nazareno é tamanha, que seus fãs acabaram virando seus fiéis. Por sua semelhança, acreditam que ele tem poder de operar milagres e abençoá-los. Coisa que Fausto faz, afinal, não há mal em confortar as pessoas que fazem dele um sucesso.

Ao chegar em casa e enfim descansar, seu sonho é peculiar. Sonha com Mefistófeles, a mesma representação utilizada em uma das adaptações de Fausto, de Goethe: cabeça pintada de branco, boca vermelha e sobrancelhas finas sarcásticas e malévolas. Mais tarde, sua representação se alterna com a clássica e famosa Besta com chifres.

Mefisto afirma que Fausto é O Falso Profeta, fingindo ser Jesus, enganando devotos e operando milagres em Seu nome. Fausto nega, achando aquilo um ultraje, não dando ouvidos a tal blasfêmia. Ao acordar, percebe que esse pesadelo – e todos que ainda estão por vir – não está tão longe da realidade.

Não ter completado a peça, perseguições de fiéis achando que Fausto é a própria encarnação de Cristo e implorando pela salvação, ter feito 33 anos, pintas no meio da testa que crescem a cada dia, importunações do Tinhoso e para completar, estranhos barulhos vindos do espaço anunciando o apocalipse, deixam Fausto a ponto de um colapso. E as coisas só tendem a piorar, fazendo-o acreditar que está vivendo seu próprio inferno.

Referências não faltam nesse livro. Fora as óbvias alusões a Fausto e Macário, também temos menções a outras obras da literatura, como A Divina Comédia, e a obras de arte, como as pinturas renascentistas de Bosch. Vale citar também o humor e genialidade do autor ao mencionar figuras famosas sem necessariamente dizer seus nomes.  Por exemplo, ao escrever “um rosto conhecido entre os entusiastas da cosmologia” ao se referir a um programa sobre astrofísica e os mistérios do universo, ou então “outra emissora mais abonada”. Não há necessidade de mais explicações para entendê-la.

A edição, além da belíssima capa, se assemelha a uma bíblia, com capítulos escritos em versículos e algumas passagens bíblicas condizentes com o momento pelo qual o protagonista está passando.  Também podemos observar a presença de alguns quadros famosos, como Narciso, de Caravaggio e O Juízo Final, de Hans Memling, além de ilustrações nos traços de Gustavo Doré, feitas por um teólogo.

Marcos DeBrito mescla em sua narrativa elementos religiosos e ciência. Algumas pessoas ouviram barulhos vindos do céu em 2010, e apelidaram esse fenômeno de Trombetas do Apocalipse. Em 2020, tais barulhos foram novamente ouvidos em algumas localidades.

Tanto a explicação cientifica do fenômeno quanto a histeria em acharem que isso é sinal do fim do mundo estão descritas no livro de modo brilhante.  O desespero das pessoas em precisarem de um Messias, a hipocrisia de pregarem algo que não seguem, o prazer em cometer atrocidades pelo seu Salvador, a cegueira para o absurdo de suas próprias ações e a ignorância.

Apocalipse Segundo Fausto expõe a podridão humana em suas mais diversas nuances, criticando o fanatismo e a falta de bússola moral ao não se responsabilizarem pelos seus atos. Deixando claro o que as pessoas são capazes de fazer em nome do que seguem e acreditam ser o certo, desprezando e querendo acabar com tudo que é diferente, sendo egoístas e até mesmo cruéis. É um retrato bem adequado ao momento atual.

O livro Apocalipse Segundo Fausto é semi-finalista do prêmio ABERST 2020 na categoria Livro de Terror.

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