5
(5)

Ring - O Chamado
Original:Ringu
Ano:1998•País:Japão
Direção:Hideo Nakata
Roteiro:Hiroshi Takahashi, Kôji Suzuki
Produção:Takashige Ichise, Shin'ya Kawai, Takenori Sentô
Elenco:Nanako Matsushima, Miki Nakatani, Yûko Takeuchi, Hitomi Satô, Yôichi Numata, Yutaka Matsushige, Katsumi Muramatsu, Rikiya Ôtaka, Daisuke Ban

Sadako fez sua escalada mais primorosa por um poço em 1998, na obra de Hideo Nakata, Ring: O Chamado (Ringu). O filme foi inspirado no romance “Ring“, de Koji Suzuki, lançado em 1991, e que deu origem inicialmente a uma produção para a TV quatro anos depois com Ring: Kanzenban, de Chisui Takigawa. Nakata e o roteirista Hiroshi Takahashi leram o livro e viram o primeiro filme para conceber seu principal sucesso, fazendo uso de algumas liberdades criativas, que foram muito bem aceitas pelo público oriental. Distribuído pela Toho, Ringu fez bastante sucesso comercial e inspirou uma longa franquia, além de spinoffs e refilmagens, tornando-se cult e popularizando as assombrações conhecidas como “yurei“.

Por aqui, o filme ganhou notoriedade a partir do anúncio de seu remake, O Chamado, de 2002, dirigido por Gore Verbinski. Assim como Ring: O Chamado, a versão americana também seguiu caminhos próprios, fez alterações significativas para a construção de um horror envolvendo uma fita amaldiçoada. Quem curtiu a nova versão queria conhecer o produto que a originou, quem sabe distinguir Sadako de sua versão ocidental Samara, e definir mais uma refilmagem como inferior à inspiração. É um sentimento conflitante porque ambos os filmes são ótimos e possuem personalidade: dizer que O Chamado é bem inferior ao longa de 1998 pode ser considerada uma heresia também. E tem mais um detalhe a ser considerado para provocar uma longa discussão: seria O Chamado uma refilmagem ou nova adaptação? Ring: O Chamado não é também um remake? Saber que ambos os filmes são diferentes do livro e apenas o filme Ring: Kanzenban é uma adaptação mais fiel mudaria seus conceitos?

Como muitos dos fãs da mitologia, também vi os dois filmes nessa ordem: O Chamado e depois Ring: O Chamado (era conhecido apenas como Ringu na época). Achei ambas as produções muito boas, essenciais para dois ciclos do cinema do novo milênio: a concepção do J-Horror; e o dos remakes americano de filmes japoneses. O primeiro ciclo trouxe vários filmes de assombrações com cabelos compridos e fantasmas perturbados – Phone, Ju-On e Dark Water vieram dessa safra; O Chamado, O Grito e Água Negra compõem a segunda fase. À exceção de Água Negra, os demais montaram um terceiro ciclo: o das continuações, tanto do original quanto dos remakes. Várias amostras de que o cinema oriental estava realmente em alta duas décadas atrás.

Lançado no Japão em 31 de janeiro de 1998, Ring: O Chamado foi um dos maiores sucessos de bilheteria do ano. No ano seguinte, passaria pelo Fantasia Film Festival, o que daria ainda visibilidade à produção, dentre as opções de aluguel. Ironicamente, um filme sobre uma fita amaldiçoada se destacou entre as fitas mais alugadas, com valores acima dos U$13 milhões de dólares. De acordo com a Variety, apesar da boa arrecadação japonesa, o longa fez mais sucesso em Hong Kong, abafando o lançamento de Matrix por lá. Teve passagem limitada nos cinemas franceses, coreanos, chilenos e russos, e foi amplamente ignorado pelos EUA e pelo Brasil.

Os americanos só puderam alugar o filme em 2003, quando a Dreamworks lançou o VHS como Ringu, aguardando, claro, o sucesso de O Chamado. Com a visão americana, Ringu recebeu boas críticas, mas também houve análises negativas, apontando o ritmo lento da produção – um ponto de vista óbvio para um estilo de cinema de videoclipe. O respeito maior viria em 2010, quando a Empire o colocaria entre os “100 Melhores Filmes do Cinema Mundial“, ocupando a posição 69. A versão de Gore Verbinski nem aparece na lista.

É claro que entra como importante critério da lista a significância da produção para o cinema. Não basta ser um bom filme – às vezes nem é -, mas ter influenciado tantos outros, criado uma tendência. Há excelentes produções ali – O Labirinto do Fauno aparece em quinto; Cidade de Deus está em sétimo; e O Sétimo Selo, em oitavo -, mas, partindo desse critério, você não encontra A Noite dos Mortos-Vivos nem O Exorcista entre os apontados. O que Ringu teria de melhor em relação a esses filmes? A Empire se justifica: “ele continua extremamente influente, e gerou um verdadeiro exército de sequências e imitações. Nem mesmo a morte do VHS impediu que fosse assustador.” E os zumbis comedores de carne humana e os vômitos de abacate não fizeram o mesmo pelo cinema?

Ring: O Chamado começa com a cena das jovens conversando sobre a fita amaldiçoada no quarto. Masami (Hitomi Satô) conta à amiga sobre a lenda urbana envolvendo a tal fita, que faz a pessoa receber um telefonema e morrer sete dias depois. Tomoko (Yûko Takeuchi) parece preocupada, confessando ter assistido à fita e recebido a ligação estranha na semana passada enquanto estava com os amigos em um resort. Ela ri, dizendo ser uma brincadeira, mas o telefone toca, mudando completamente sua expressão. Masami vai ao banheiro, deixando Tomoko sozinha com a televisão ligada, sendo encontrada posteriormente com a face congelada na testemunha de um horror indescritível. Em O Chamado, acontece a mesma coisa, sendo que Becca (Rachael Bella) desaparece, e Katie (Amber Tamblyn) enxerga um vulto, vê a televisão fora de sintonia e um estranho líquido que parece emergir do quarto. A expressão de medo da refilmagem também é mais característica.

Na cena seguinte, a jornalista Reiko Asakawa (Nanako Matsushima) está entrevistando jovens sobre a tal lenda urbana da fita amaldiçoada, sem saber que sua sobrinha morreu nessas circunstâncias. No funeral de Tomoko, ela descobre a morte da jovem que está coincidentemente relacionada à mesma lenda, e todos os amigos que foram ao resort morreram no mesmo horário, com a mesma expressão: há alguns que foram encontrados em um carro, sem televisão. Reiko encontra um comprovante de fotos encomendadas por Tomoko e as revela, vendo os rostos de todos deformados. E então resolve ir ao tal resort. A versão de 2002 corrigiu essa coincidência, fazendo Rachel (Naomi Watts) somente saber da fita no funeral, e apresentou várias fotos com rostos deformados, e não apenas uma.

No resort, Reiko não encontra pistas na cabana alugada, mas vê uma fita sem capa na recepção. Não mostra como ela convenceu o proprietário a deixá-la assistir, nem os tais jovens, uma vez que poderia se tratar de um filme pornô ou snuff. O vídeo é menor do que a versão americana, mas igualmente assustador: imagens desconexas mostram uma visão de dentro do poço, o pentear do cabelo em um espelho oval, pessoas se arrastando por uma montanha, um homem com um pano sobre a cabeça, a palavrão “vulcão” e o olhar de um cavalo, com uma palavra escrita em sua pupila: Sadako. Termina com uma visão do poço. Já no remake, aparecem várias outras coisas bizarras: suicídio, uma escada, uma cadeira se movimentando, mosquitos, uma lacraia, cavalos mortos na praia, uma árvore.

Assim que recebe o telefone, Reiko percebe que foi amaldiçoada e pede ajuda ao ex-marido, Ryūji Takayama (Hiroyuki Sanada), que, em mais uma conveniência do roteiro, tem poderes mediúnicos. Ele assiste a fita, mas não recebe uma ligação. Noah (Martin Henderson), no remake, era analista de vídeo, o que não deixa de ser também uma facilidade. Ambas, Reiko e Rachel fazem uma cópia da fita e entregam aos seus respectivos. Em ambos, o filho independente assiste também ao vídeo justificando o desespero das mães em tentar achar uma forma de encerrar a maldição.

A pesquisa sobre o dialeto Ōshima, falado na fita, indica o local para onde Reiko deve ir: a ilha Izu. Rachel precisou encontrar uma imagem escondida em um frame do vídeo, em que aparece um farol. Pesquisou sobre faróis nos Estados Unidos e encontrou um parecido na Ilha Moesko. Reiko fica sabendo sobre a mulher que se penteava na fita, Shizuko Yamamura (Masako), uma mulher também psíquica e que demonstrava seus poderes em público, com a ajuda do pesquisador ESP (percepção extrassensorial), Dr. Heihachiro Ikuma (Daisuke Ban). Assim como Anna Morgan (Shannon Cochran), Shizuko também se matou.

O irmão dela, Takashi (Yôichi Numata), diz não saber sobre o destino de Sadako e demonstra pouco interesse em ajudá-la, mas permite que o toque de Ryūji desperte uma visão sobre o dia da apresentação em público de Shizuko, quando um jornalista que questionou os poderes dela dizendo serem apenas truques de mágica, morreu de medo sob o olhar de Sadako. Percebendo que a chave de tudo é a garota, Reiko entende porque o telefone não tocou para Ryūji: ele não estava na cabana do resort. E lá deve estar a resposta que procuram, no caso, o corpo da jovem.

O caminho da investigação de Rachel é mais complicado, sem ajuda de poderes e visões. Além de sofrer sintomas por ter visto a fita – nariz sangra, encontra pelo caminho a escada, a lacraia, vomita o cabelo de Samara, retira o mosquito da TV e ainda testemunha o suicídio do pai da garota, Richard Morgan (Brian Cox), assiste a um vídeo de análise psiquiatra e testemunha a morte de um cavalo durante uma viagem de balsa. Descobre que Samara, a garota que não dorme, ficava em um celeiro, e sentia ciúmes do amor que a mãe tinha por cavalos. No local, veem uma árvore grafada na madeira, idêntica a que estava no vídeo e também próximo à hospedagem onde Katie viu a fita. É lá que encontrarão o poço.

Como se percebe, há várias diferenças entre os filmes. O lado mediúnico foi deixado de lado na refilmagem, assim como a visão de Ryūji na praça. A versão japonesa não parece se importar com detalhes mastigados, em tentar explicar tudo, enquanto o filme americano tentou ser mais pé no chão, montando um quebra-cabeça que leva à descoberta do corpo e a libertação de Samara. Gosto de toda a atmosfera perturbadora do remake, a ideia de um pesadelo ameaçador, o estilo investigativo da produção. O roteiro de Ehren Kruger acerta pela ideia dos sete dias estar relacionado ao tempo de vida de Samara no poço, mas erra ao deixar sinais em Rachel, mesmo depois que ela já fez a cópia da fita. As marcas dos dedos de Sadako se justificam por envolver uma visão posterior, mas Reiko fica na angústia de não saber se está ou não amaldiçoada.

A caracterização de Sadako é bem mais assustadora e acentuada do que a de Samara. Um olhar de deformidade facial, algo não humano, e sua constante presença no filme em outros momentos. A ideia de utilização dos reflexos do fantasma e de Ryūji, com o pano sobre a cabeça apontando uma pista importante, são bem aterrorizantes, e não estão na versão americana.

Ambos os finais são bons. O de Reiko na estrada, sem precisar explicar sua próxima ação, e o de Rachel fazendo uma nova cópia da fita e recebendo o questionamento de seu filho sobre o que acontecerá com as pessoas que assistirem ao filme a partir de então. Deixam uma reflexão sobre os próximos caminhos, ainda que as continuações tenham partido para percursos próprios, sem simplesmente copiar acontecimentos do original. Mas, nos dois universos, foram desnecessárias e oportunistas.

O que você achou disso?

Clique nas estrelas

Média da classificação 5 / 5. Número de votos: 5

Nenhum voto até agora! Seja o primeiro a avaliar este post.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *