A Estranha Hospedaria dos Prazeres
Original:A Estranha Hospedaria dos Prazeres
Ano:1976•País:Brasil Direção:Marcelo Motta, José Mojica Marins Roteiro:Rubens Francisco Luchetti, José Mojica Marins Produção:José Mojica Marins Elenco:José Mojica Marins, Alfredo Almeida, Giulio Aurichio, Elza Barbosa, Maribeth Baumgarten, Vincenzo Colelia, João da Cruz, Bianchina Della Costa, Tome Francisco, Ananias Gonçalves |
Em determinado momento de A Estranha Hospedaria dos Prazeres, o proprietário do estabelecimento citado no título, que é interpretado por José Mojica Marins, diz para uma de suas funcionárias: “As emoções não fazem sentido“. Confesso que não entendi o que o personagem quis dizer no contexto da cena, mas ele bem que poderia estar se referindo ao próprio filme.
Afinal, A Estranha Hospedaria dos Prazeres não faz o menor sentido – e me refiro tanto à história quanto ao fato de um negócio como esse existir em primeiro lugar! Curto e grosso, o filme é desconexo, arrastado e redundante, e passa a impressão de ser um curta-metragem esticado para longa só para poder passar nos cinemas.
Mesmo assim, o resultado é uma daquelas maluquices estranhamente hipnóticas que, por mais que esteja odiando, o espectador não consegue parar de ver. E muito disso advém da criatividade do nosso “Zé do Caixão” para filmar com um mínimo de recursos e ainda assim conseguir tirar algo minimamente original de quase nada.
A história por trás de A Estranha Hospedaria dos Prazeres já é bem conhecida: em 1975, quando enfrentava problemas financeiros e familiares, Mojica entregou o projeto para que um integrante da sua trupe, Marcelo Motta, dirigisse em seu lugar. O “discípulo” já fazia parte do seu grupo de colaboradores habituais desde 1969, e havia inclusive trabalhado como assistente de direção em seu longa anterior, Exorcismo Negro (1974).
A princípio, Mojica iria aparecer apenas como ator. Porém, lá pelas tantas, ele foi obrigado a assumir o controle sobre o filme, mexendo na edição e filmando novas cenas para o que acabou sendo a montagem final. Pesquisadores da obra do diretor são unânimes em afirmar que o resultado parece mais coisa dele do que de Marcelo Motta – e duvido que o próprio Mojica saiba dizer, hoje, quem filmou o quê, embora alguns momentos claramente “mojiquianos” sejam facilmente identificáveis.
Ninguém sabe ao certo, também, porque Mojica precisou assumir a cadeira de diretor que pertencia ao discípulo para terminar o filme. A versão mais comum indica a falta de experiência de Motta como motivo principal, já que o material filmado por ele estaria repleto de erros de continuidade e cenas fora de foco, acarretando em atrasos e custos desnecessários com refilmagens (e se um cara barateiro como o Mojica optou por refilmar cenas, é porque o negócio estava brabo MESMO!).
A outra versão (repetida pelo próprio Mojica numa entrevista que fiz com ele em São Paulo) é um pouquinho mais complicada: na época das filmagens, Marcelo Motta estaria enfrentando problemas amorosos com uma namorada prestes a deixá-lo e isso se refletiu no trabalho, forçando Mojica a assumir o comando para que o filme não ficasse inacabado. A obra foi finalmente finalizada e lançada em 1976.
Seja como for, A Estranha Hospedaria dos Prazeres marca uma espécie de fase de transição na carreira do popular Zé: ele tinha acabado de sair da sua primeira “superprodução” – Exorcismo Negro, de 1974, bancada pelo todo-poderoso Aníbal Massaini Neto e sua Cinedistri -, onde pôde pela primeira vez trabalhar com um orçamento decente e atores mais famosos, tipo Joffre Soares.
Mas, a partir de então, Mojica despencaria de volta para os filmes de baixo ou nenhum orçamento, engatando uma sequência de obras inexpressivas que, assim como A Estranha Hospedaria…, ficariam muito melhores como curtas-metragens. E, caso fossem reeditados e transformados em episódios de meia hora, poderiam até compor uma coletânea estilo O Estranho Mundo de Zé do Caixão Parte 2, e funcionar bem melhor.
A Estranha Hospedaria dos Prazeres também marca o surgimento da própria companhia de Mojica, a Produções Cinematográficas Zé do Caixão. Só que esta primeira produção da empresa era tão barata que apenas ele, a editora Nilcemar Leyart e o diretor de fotografia Giorgio Attili eram técnicos profissionais; todos os demais, incluindo o diretor Motta e diversos dos atores, eram integrantes da trupe de Mojica ou alunos de sua escola de atores, que ajudaram a bancar o filme comprando cotas dele!
O roteiro é de Rubens Francisco Lucchetti e, segundo algumas fontes, teria sido adaptado de um dos episódios do velho seriado de horror apresentado por Mojica – só não se sabe se de Além, Muito Além, exibido pela Bandeirantes entre 1967-68, ou de O Estranho Mundo de Zé do Caixão, exibido pela Tupi entre julho e novembro de 1968. Inclusive o personagem do dono da hospedaria, aqui assumido pelo Zé, teria sido interpretado por Juca de Oliveira no episódio original do seriado.
A trama é bastante simples e poderia muito bem ser resumida num curtinha de 20 minutos ou até menos: Mojica é o misterioso proprietário da “Hospedaria dos Prazeres“, que fica num local ermo, mas mesmo assim recebe dezenas de clientes numa noite de sexta-feira, 13 de agosto – e uma noite de tempestade, claro!
Apesar de o personagem a priori não ter nada a ver com Zé do Caixão, a única diferença entre eles é que aqui o ator usa um chapéu-coco no lugar de cartola; o resto, das divagações sem sentido às unhas compridas e olhos arregalados em close, é exatamente igual. Mas sempre é engraçado ver Mojica tentando interpretar um sujeito mais dócil e “refinado“, bem diferente do sádico e fiasquento Zé do Caixão.
Os hóspedes – doze, no total – são um casal de noivos que passa o filme inteiro trepando (interpretados por Caçador Guerreiro e pela linda Marizeth Baumgartem), um grupo de motoqueiros/hippies, industriais preparando alguma negociata secreta, jogadores de pôquer, um sujeito (José Peres Ortega) que seduz coroas ricas para roubar-lhes o dinheiro, uma mulher desmemoriada, um suicida em potencial (Tomé Francisco) e até uma quadrilha de ladrões de joalherias!
Todos esses dementes chegam à Hospedaria dos Prazeres na mesma noite, com um curto intervalo de tempo entre um e outro.
A partir daí, não acontece muita coisa nem há qualquer tipo de conflito entre os personagens: confinados em seus respectivos quartos, o casal de noivos trepa; os hippies fazem uma suruba e ficam cantando “Tá todo mundo nu, oba!“; os jogadores de pôquer jogam pôquer e fumam muito; os industriais ficam assinando contratos; a mulher desmemoriada fica se perguntando “Quem sou eu? Onde estou?“; a quadrilha de ladrões fica dividindo o produto do roubo, e assim por diante.
Depois de uns bons 50 minutos simplesmente pulando de um quarto para outro até encher o saco, já que nada de muito emocionante acontece, finalmente surge a reviravolta, quando o espectador descobre que o dono do local na verdade é a própria Morte, e todos os seus hóspedes “desencarnaram” momentos antes de aparecer na hospedaria: os bandidos foram mortos num tiroteio com a polícia, o suicida explodiu os próprios miolos, o sedutor de coroas tomou um pipoco de uma amante enciumada, os hippies despencaram com suas motos de um barranco…
Assim, a Hospedaria dos Prazeres seria uma sucursal do Além, uma espécie de sala de espera para as almas dos falecidos antes que elas sejam encaminhadas ao seu destino final. Ou, talvez, o inferno particular de cada finado – e convenhamos que não seria nada mal um inferno particular onde você passasse a eternidade numa suruba de hippies, ou numa cama transando com a Marizeth Baumgartem!
Enfim, o filme não se preocupa em explicar o que exatamente é a hospedaria além de um local de concentração de almas desencarnadas, e cada um fica livre para imaginar o que quiser: se dali eles partirão para um local melhor/pior, ou se estão condenados a ficar presos em seus quartos pela eternidade sem saber que morreram.
Antes que me acusem de soltar spoilers sobre a “surpresa final” de A Estranha Hospedaria dos Prazeres… Bem, digamos que o próprio roteiro não é lá muito eficiente em tentar esconder essa “reviravolta“, jogando pistas o tempo todo para que até o espectador mais burro e desatento consiga enxergar o “final-surpresa” pelo menos uma hora antes de ele aparecer.
Por exemplo: a Hospedaria dos Prazeres tem um relógio-cuco na parede, mas ele não tem ponteiros; ao mesmo tempo, os relógios de cada hóspede pararam numa hora diferente (a hora da morte de cada um deles… dã!).
O fato de o nome dos hóspedes já estar anotado no livro de registro no momento em que eles chegam ao local, e de o proprietário da hospedaria ficar largando frases como “Sempre existirá vaga para quem voluntariamente ou involuntariamente for indicado à minha casa“, ou “Os hóspedes querem descansar“, também não ajudam muito a esconder a “surpresa“.
Logo fica claro que, com um conceito simplório como esse, não há muita história para contar (e o fato de a montagem simplesmente alternar cenas dentro de um quarto ou outro durante a maior parte do filme comprova a falta de assunto).
Aí entram pelo menos duas sequências (aparentemente rodadas pelo próprio Mojica) que só estão no filme para encher linguiça e fechar o tempo de um longa-metragem, ambas no início, de maneira que o espectador impaciente pode pulá-las sem medo de perder algo importante para a trama principal.
A primeira dessas descartáveis cenas introdutórias mostra dançarinas de baby-doll colorido rebolando ao som de batuques num cenário surreal, que é formado por tendinhas feitas com lençóis e uma floresta mambembe habitada por criaturas bizarras.
As tais criaturas são de uma pobreza franciscana (figurantes vestindo máscaras de Carnaval e peitos e bundas de plástico, provavelmente comprados na 25 de Março), mas a visão delas incomoda – eu definitivamente não queria viver no mesmo universo ou dimensão que essas criaturas bizarras!
E depois de uns bons sete ou oito minutos da Dancinha do Baby-Doll entrecortada com as criaturas com máscara da 25 gritando, eis que a tampa de um caixão posicionado no meio do cenário se abre, e de dentro sai ninguém menos que… Zé do Caixão (Mojica reprisando seu famoso personagem, mas só para introduzir a história, já que o dono da hospedaria, como vimos, não tem nada a ver com o Zé).
Olhando diretamente para a câmera e para o espectador, dublada com uma voz grossa (e diferente daquela usada no restante do filme, que pertence a João Paulo Ramalho), a entidade diabólica de capa e cartola faz mais um dos seus tradicionais discursos escalafobéticos, que até vale a pena transcrever aqui:
“Viver para morrer ou morrer para viver? Existe a resposta certa? Não! Somente dúvidas. Somente deduções. Só a certeza do vazio. Da solidão. Da desesperada procura do tudo ou do nada. Da vastidão das trevas. Pois o desvendar desse enigma seria o fim do mistério, o fim do segredo da Eternidade, o apogeu da alegria diante de uma missão cumprida. Pois o homem estaria frente a frente com a sua maior conquista: o despertar da própria origem.”
Quando o discurso se encerra (com direito a sujeira no negativo criando belos efeitos), o espectador percebe que essa “introdução” já comeu uns bons 10 minutos de tempo corrido, e ela não tem absolutamente nenhuma relação com a história do filme, num verdadeiro teste de paciência para os espectadores que ainda não estão acostumados às doideiras (e malandragens) de José Mojica Marins.
Aí entram mais três minutos de créditos iniciais, desenhados sobre fotografias reais de um cemitério, com os nomes dos atores e técnicos pintados sobre lápides e túmulos, criando um belo (ainda que mórbido) efeito. E apesar de Mojica ter assumido a bronca, o único diretor creditado é Marcelo Motta.
Parece que o filme finalmente vai começar de verdade, certo? Errado!
Aparentemente, A Estranha Hospedaria dos Prazeres tinha tão pouca história que Mojica foi obrigado a filmar uma SEGUNDA INTRODUÇÃO, dessa vez mostrando imagens do “Cosmos” (bolinhas de isopor penduradas por fios de nylon visíveis, em frente a imagens do espaço), ilustrando um novo discurso sem pé nem cabeça de Mojica, dessa vez em off, e que também vale a pena transcrever:
“Perguntar qual é o tamanho do Universo é o mesmo que perguntar qual é o término da Eternidade. Qual é a verdadeira forma de Deus? Quantas estrelas? Quantos planetas? Quantas galáxias existem na vastidão do Universo? São perguntas sem respostas, para além existe uma dimensão inferior. Por que o término? Por que você não aceita a extinção? Por que o medo, o vazio da sua presença, se você é superior? O que lhe espera quando o manto mortífero descer sobre você? Só a sua imaginação lhe dirá. É o fim? É o início? O nada? O tudo? Sim. Você teme o materialismo. Você teme a si mesmo. Contempla o Cosmos. Dá vazão a uma fantasia mental. A ilusão das ilusões, em busca de uma verdade real. É um clarão na escuridão. É a magia da luz que desponta. São brisas do sopro divino que lhe acariciam o seio. É a alegria incontida que envolve sua mente. É uma palavra como em moto-contínuo, que se repete e se repete. Mas não despreze o quanto é majestoso o seu significado. A luz da existência. A camuflagem da morte é o despertar da vida.”
Óbvio que este novo monólogo de Mojica também não faz o menor sentido e nem tem o menor valor para a trama do filme; é tão prolixo e desconexo quanto o discurso de Zé do Caixão na “primeira” introdução, e absurdamente redundante!
Mas o bla-bla-bla sobre as “imagens do Cosmos” come mais uns seis minutos do filme, e é então que a trama principal de A Estranha Hospedaria dos Prazeres finalmente começa… depois de exatos 15min46s de asneiras e encheção de linguiça! Fico até imaginando a cara dos espectadores que viram a estreia disso nos cinemas na época, já que parece que o filme não vai começar nunca!
Para fechar a longa lista de problemas da obra, o roteiro de A Estranha Hospedaria dos Prazeres é tão caótico que em vários momentos afronta a sua própria lógica (ou falta de lógica). Talvez isso tenha acontecido no processo de esticar a historinha simples para virar longa, mas o fato é que há furos monstruosos numa trama que, na essência, deveria ser bem simples.
Acompanhe: no momento em que descobrimos que a hospedaria é uma sucursal do Além, e que seus hóspedes estão todos mortos sem saber disso, é impossível não lembrar que, durante a narrativa, várias outras pessoas tentaram se abrigar no local para escapar da mesma tempestade, mas foram enxotadas pelo personagem de Mojica porque não havia “vaga” para elas – ou seja, essas pessoas ainda estavam vivas.
Mas ora bolas, se elas estavam vivas, teoricamente nem deveriam enxergar a “Hospedaria do Além” em primeiro lugar, não concordam? Isso parece ser apenas uma desculpa para a previsível cena de revelação no final, quando, na manhã seguinte aos acontecimentos mostrados, um dos clientes “vivos” enxotados volta à pensão com a polícia e encontra… um cemitério no lugar onde ficava a hospedaria!
A revelação do final também torna absurda a primeira cena do filme (não aquelas introduções fuleiras, me refiro à primeira cena do filme MESMO), que mostra um anúncio de jornal pedindo empregados para trabalhar na pensão. Vários interessados se oferecem, mas Mojica escolhe apenas dois que “já foram recomendados” (ou seja, provavelmente estão mortos, ou em breve estarão).
Bem, se Mojica é a Morte, e a hospedaria uma sala de espera para o Além, por que diabos ele precisou colocar anúncio no jornal, se os seus empregados-vítimas chegariam até ali de qualquer forma?
O caso é que talvez seja inútil procurar alguma lógica em A Estranha Hospedaria dos Prazeres, já que, conforme o próprio hospedeiro anuncia, “as emoções não fazem sentido“. E nem dá para esperar nada muito diferente de uma obra filmada nas condições em que esta foi filmada, pois a pobreza e o improviso são mais do que perceptíveis.
Era tão pouco dinheiro para fazer o filme que Mojica economizou uns trocados na dublagem reaproveitando músicas e efeitos sonoros de obras anteriores, tipo os sons esquisitos de O Despertar da Besta, e até a cantoria dos hippies (o antológico “Tá todo mundo nu, oba!“) de Finis Hominis – O Fim do Homem!
Mesmo assim, há momentos muito criativos como recompensa para quem resistir à repetição excessiva de takes e situações. Como na cena em que o suicida explode os miolos com um tiro, e uma cachoeira de sangue desce sobre a lente da câmera (acima). Ou quando, para simular um “milagre“, uma fina folha de filme plástico é incendiada em frente à câmera, criando algo bem próximo a “estrelinhas” por apenas alguns centavos!
Ou, ainda, quando um coração batendo (cena provavelmente retirada de alguma filmagem real de cirurgia) é exibido em sobreposição à imagem do relógio sem ponteiros. A revelação da “verdadeira face” do dono da hospedaria também é fantástica, e eu não duvido que várias dessas belas imagens – se não todas – saíram da cachola do próprio Mojica, acostumado a se virar com o pouco que tinha.
Já outros improvisos não ficaram tão bons, tipo uma cena em que, para representar a periculosidade do dono da hospedaria, vários animais são mortos instantaneamente apenas com um olhar do vilão.
Para demonstrar esse efeito na prática, ratinhos brancos foram colocados sobre uma chapa metálica e eletrocutados para morrerem de verdade na hora da filmagem, numa trucagem que, além de não convencer, ainda pode ser considerada de péssimo gosto.
E vale destacar que a ideia dos mortos que não sabem que estão mortos ainda era relativamente nova na época, mesmo já tendo aparecido em filmes tão díspares quanto Um Passo Além da Vida (1944) e Contos do Além (1972), e em toda uma variedade de contos e histórias em quadrinhos de horror. Mais recentemente, o tema seria abordado ad nauseam até transformar-se num clichê pra lá de batido, graças aos “finais-surpresa” de filmes tipo Alucinações do Passado (1990), O Sexto Sentido (1999) e Rota da Morte (2003), entre tantos outros.
Mesmo assim, A Estranha Hospedaria… passou batido na época e está entre as obras menos comentadas e/ou conhecidas do diretor. Um dos poucos a enxergar pontos positivos – talvez mais até do que realmente existem – foi o mítico Jairo Ferreira, que escreveu uma engraçada crítica para a Folha de São Paulo de 28 de janeiro de 1977, mais uma vez comparando Mojica a Buñuel!
Mesmo que eu concorde com quase todas as críticas negativas ao filme, principalmente aquelas que reclamam do ritmo arrastado, da repetição de cenas e do fato de praticamente nada acontecer até a revelação final, confesso que tenho certa admiração por A Estranha Hospedaria dos Prazeres. Quem sabe até pela sua extrema ruindade, ou talvez pelo seu título fenomenal somado ao cartaz fora de série (desenhado pelo mestre Benício), uma obra de arte que eu adoraria ter na minha coleção.
Ou, quem sabe, pela presença da belíssima Marizeth Baumgartem, uma promessa de estrelinha da Boca do Lixo que não vingou e sumiu do mapa logo depois (antes ela tinha feito pequenas participações em pornochanchadas, como Cada Um Dá o que Tem e Pesadelo Sexual de um Virgem, mas seu papel de maior destaque foi aqui).
E se Marcelo Motta foi escanteado por Mojica nessa sua estreia como diretor, depois ele pôde demonstrar plenamente o seu “talento” na pornochanchada Chapeuzinho Vermelho – A Gula do Sexo (em que novamente dirigiu seu mestre Mojica numa ponta, como Zé do Caixão!) e no pornô O Império do Sexo Explícito.
Este, por sinal, parece ter sido o seu último trabalho como diretor, e depois Motta também sumiu do mapa. A informação que rolava era que ele trabalhava bem longe do mundo do cinema, como integrante da diretoria do Jockey Club de São Paulo, mas parece que o Marcelo Motta em questão é apenas um homônimo. Assim, o “original” permanece sumido.
A Estranha Hospedaria dos Prazeres circulou durante anos no universo da pirataria em cópias ripadas do velho VHS da América Vídeo, que foi lançado no Brasil nos anos 1990, naquela época em que Mojica tinha virado “cult” nos Estados Unidos e nossas distribuidoras começaram a correr atrás do atraso.
Recentemente, a Focus Filmes relançou o filme numa desastrosa edição em DVD, com qualidade de imagem muito pior que a do velho VHS, incluindo um “falso widescreen” que corta o topo e a parte de baixo da imagem. Essa versão é tão escura que algumas cenas ficaram simplesmente incompreensíveis, e não vale nem os R$ 12,90 que a distribuidora está pedindo – é melhor ficar com o VHS-Rip mesmo, por incrível que pareça!
Depois de A Estranha Hospedaria…, Mojica dirigiu uma série de filmes bem fracos, e tão baratos quanto este, que também passam a ideia de serem curtas desnecessariamente esticados para longas. São eles, na ordem, Inferno Carnal, Perversão e Mundo – Mercado do Sexo.
Também lançou Delírios de um Anormal, que é mais uma montagem dos melhores momentos de seus outros filmes do que uma trama independente. Dessa série toda de produções inexpressivas, acho que A Estranha Hospedaria… ainda é o meu preferido – mesmo, repito, com todos os seus defeitos.
Depois de Delírios de um Anormal, Mojica teve que abandonar à força o cinema de horror por “exigências de mercado“, e mergulhou fundo no universo do cinema pornô, dirigindo produções asquerosas como A Quinta Dimensão do Sexo e 48 Horas de Sexo Alucinante – onde filmou algumas cenas mais horripilantes do que as dos seus filmes de horror OFICIAIS!
Em 1987, após mais um pornô hoje considerado perdido (Dr. Frank na Clínica das Taras), o velho Zé do Caixão retirou-se para um exílio forçado longe da cadeira de diretor, que durou até 2006, quando ele comandou sua segunda (e provavelmente última) superprodução, Encarnação do Demônio.
“As emoções não fazem sentido“, nos lembra o dono da Hospedaria dos Prazeres. Mas tudo bem: para aproveitar a deixa, tampouco faz sentido o que aconteceu com a carreira e a filmografia de José Mojica Marins a partir desse filme…
Pior que eu gostei bem mais desse filme do que Delirios de Um Anormal (horrivel) filme que vocês do site deram, por algum motivo, uma nota boa rsrsrs
É muito ruim, mas por um algum motivo que eu não tenho ideia eu consegui gostar, vai entender.
Zé sempre foi um lixo como (pseudo) cineasta. A prova é que de 1 filmes produzidos e dirigidos por ele 10 são horriveis de tão ruins. Um homem com serios problemas mentais que teve a chance de filmar suas loucuras que somente outros dementes acham que são arte.
eu gostaria de mais matérias com a boneca annabele
Engraçado você chamar quem consegue apreciar a obra do Mojica de demente, acho que ele te atingiu de alguma forma; Mojica foi um “demente” justamente por causa de pessoas como você, ele protestou muito contra a a hipocrisia da sociedade e isso é claro em O Ritual dos Sádicos (que não foi feito pra agradar ninguém) mas depois disso foi só ladeira abaixo, ele jamais dirigiria aqueles pornôs ou lixos como “Perversão” (1979) se não fosse oprimido, Mojica só era alguém que tentava se virar como podia em meio ao caos. Obviamente ninguém é obrigado a gostar dessas bizarrices que ele fazia (nem todo mundo tem estômago ou tolerância ou até bom senso, depende da pessoa), mas aí dizer que quem é capaz de ver o que pessoas como você não viram são dementes, é absurdo; ninguém chama o David Lynch de demente, ah sim, o Lynch não era brasileiro e tinha mais dinheiro pra fazer filmes, não é (não estou comparando)?
O Mojica é um exemplo de perseverança, por mais que no fim ele tenha perdido, mas o exemplo de alguém que lutou pelo que gostava.
Gente, postei esse comentário errado, era pra ser uma resposta prum carinha acima.
No geral eu concordo com a crítica do post