Horas Fatais - Cabeças Trocadas
Original:Horas Fatais - Cabeças Trocadas
Ano:1987•País:Brasil Direção:Francisco Cavalcanti Roteiro:Francisco Cavalcanti Produção:Clery Cunha Elenco:Francisco Cavalcanti, Osvaldo Cirillo, Clery Cunha, Lilian Gonçalves, Henrique Guedes, Turíbio Ruiz, Albert Karlinski, José Lopes, José Mojica Marins |
Você sabia que no Brasil dos anos 80, quando ainda havia cinema nacional fora do eixo Globo Filmes, um grupo de malucos refilmou Desejo de Matar no país? Foi mais precisamente em 1987, com um sósia de Charles Bronson no papel principal e uma overdose de tiros, explosões e mulher pelada na trama.
Pois é: Horas Fatais – Cabeças Trocadas é mais um daqueles milagres do antigo cinema nacional, quando pequenos produtores e diretores ainda conseguiam fazer e lançar seus filmes em cinemas de bairro, longe do monopólio cinematográfico dos tempos modernos. Nesta época áurea, era comum os produtores brasileiros fazerem como os italianos no mesmo período: copiar a fórmula de sucesso de filmes americanos com um jeitinho brasileiro – normalmente, isso incluía mais sexo e mulher pelada, para atrair um público mais, digamos, “diversificado“.
Assim surgiu este projeto com o bizarro título Horas Fatais – Cabeças Trocadas, obra do corajoso Francisco Cavalcanti, que não contente em produzir e escrever o roteiro, ainda assumiu a direção e o papel principal, do sósia tupiniquim de Charles Bronson. Claro que o filme é uma bomba, mas uma daquelas bombas divertidas, onde Cavalcanti ainda tenta ousar, incluindo algumas cenas em câmera lenta (influência de Sam Peckinpah, talvez? hahaha) e até toques sensacionalistas de denúncia social de corrupção na polícia e na justiça.
Infelizmente, a produção é tão furreca que o resultado geral fica comprometido como filme sério: o elenco é ridículo, o roteiro é prolixo – com muitas cenas sem razão de existir, que apenas retardam a ação -, e há ainda a teimosia do diretor em filmar longos planos de navios e aviões, como se ele quisesse jogar na cara da plateia: “Olha só que produção caprichada, cheia de veículos, paisagens, externas…“. Mas não funciona, e enche o saco.
Se como filme sério Horas Fatais pisa na bola, o fator trash – diálogos imbecis, interpretações pavorosas, situações toscas – faz com que o espectador bem humorado mantenha o interesse até o fim, mesmo que o caminho até lá seja meio tortuoso.
O filme começa com letreiros dizendo que a história é inspirada em fatos reais (sim, claro… assim como os filmes italianos sobre canibalismo). Francisco (que é interpretado por Francisco Cavalcanti, quem mais?), ou Chico para os amigos, é o dono do Bar da Praia, um cubículo com quatro mesas que está sempre lotado – e não, não fica na praia. Chico é um barman à moda antiga, com gravatinha borboleta preta e toalha no braço, como manda o figurino (ou o clichê?). E o cenário é o retrato da pobreza: parafraseando uma outra resenha bem humorada do filme, parece até que estamos vendo um episódio do seriado “Chaves“, pois lembra o velho restaurante da Dona Florinda em alguns takes!
Certo dia, dois marginais invadem o apartamento de classe média de seu Chico e atacam brutalmente sua esposa e sua cunhada. Ambas são barbaramente estupradas e mortas, em cenas tão gráficas que lembram os estupros de Desejo de Matar 2. A pornografia é total, com longos planos das duas mulheres totalmente peladas e os homens “mandando bala“, closes na cara de agonia das vítimas, etc e tal. Enfim, todo mundo parece estar adorando mostrar aquela violência covarde – sensacionalismo pouco é bobagem.
Na saída do local do crime, os bandidos cruzam com o filho de Chico, que decora a placa do carro dos meliantes antes de entrar e encontrar mãe e tia mortas. Detalhe: o garoto é interpretado por Fabricio Cavalcanti, filho de Francisco na vida real, e o garoto é um pentelho de marca maior, que passa o filme todo chorando forçadamente, tipo “Uáááá, quero minha mãeeeeee!“.
Não demora para o dono do bar ficar sabendo do acontecido. Ele vai até a casa e encontra o garoto abraçado no cadáver da mãe (acredite, o diretor teve a cara-dura de colocar mesmo um menininho abraçado na atriz completamente pelada, algo que hoje em dia as ligas de decência e moral e conselhos tutelares iriam adorar!).
Paralelamente, numa casa luxuosa (pero no mucho) do bairro chique da cidadezinha, encontram-se as duas autoridades máximas do local: o juiz e o delegado – sendo que este último, chamado Dr. Honório, é interpretado por José Mojica Marins, o Zé do Caixão, com suas longas unhas compridas (delegado de unha comprida?) e falando o texto de maneira decorada, numa participação meramente figurativa para ajudar o chapa Cavalcanti.
Sem grandes enrolações, descobrimos que tanto o juiz quanto o delegado são corruptos. Um dos estupradores é filho do juiz, e o Dr. Honório, obviamente, encobre os atos dos meliantes usando qualquer meio ao seu alcance. Quando Chico insiste em querer justiça, por exemplo, o delegado arma um flagrante e destrói seu bar, plantando cocaína atrás de uma das estantes, e fazendo com que o pobre comerciante seja preso e torturado. Ironicamente, o delega da área diz: “Quebra ele, Joca! Mas sem deixar marcas!“, e no momento seguinte estão eletrocutando o infeliz com dois fios desencapados – como é que um negócio desses não iria deixar marcas???
Mesmo todo estropiado, Chico resolve continuar sua busca por justiça. Começa a aparecer num programa de TV local (tipo um Linha Direta da época), acusando delegado e juiz de corrupção. Detalhe: o apresentador do programa é Clery Cunha, figurinha carimbada da Boca do Lixo (dirigiu filmes como Eu Faço… Elas Sentem e o western Chumbo Quente), que é produtor de Horas Fatais. Tanto estardalhaço na mídia enfurece os vilões, que contratam um assassino profissional chamado Robledo – de onde é que tiram estes nomes?
O figuraça é cego de um olho e malvado até a medula. Chico teme pela segurança de seu filho e resolve procurar um amigo pistoleiro (Turíbio Ruiz, do “clássico” da Boca Viciado em C…) para lhe ensinar os segredos da defesa pessoal. O cara de professor não tem nada, a julgar pelo momento em que diz: “A primeira coisa para você ser um pistoleiro é aprender a atirar” (não, sério?????). Mas em menos de cinco minutos, Chico já está atirando como um Rambo brazuca. E o amigo pistoleiro ainda lhe presenteia com uma arma projetada por ele mesmo (!!!), um canhão de cano longo que dispara mísseis altamente explosivos (!!!), também de fabricação caseira (!!!!).
Armado e perigoso, o Paul Kersey tupiniquim pode arregaçar as mangas e sair para castigar os responsáveis pela destruição da sua família, sem poupar ninguém.
Demora um pouco para Horas Fatais – Cabeças Trocadas mostrar a que veio, pois o filme se perde em intermináveis diálogos sobre denúncia de corrupção (as cenas envolvendo o programa de TV do qual Chico participa são especialmente longas e dispensáveis). Mas quando o justiceiro parte para o acerto de contas, aí é que a coisa esquenta.
Vestindo uma afrescurada jaqueta vermelha e locomovendo-se Brasil afora de barco e avião na caça dos estupradores, que se refugiaram no interior, Chico passa a segunda metade do filme mandando bala e explodindo coisas. Para você ter uma ideia do nível de sangreira e sadismo, um dos estupradores, Alemão (Albert Kaminski, que trabalhou com Cavalcanti também no terror A Hora do Medo), toma cinco tiros no saco e é deixado para sangrar até a morte. Antes de encarar tal destino, ocorre um diálogo memorável: “Não faça isso, pelo amor de Deus!“, argumenta o arrependido estuprador. Mas o Charles Bronson nacional simplesmente responde: “Não fale em Deus que você vai é pro inferno“. BANG BANG BANG BANG BANG!!!
Porém, Cavalcanti deve ter gastado a maior parte do seu orçamento nos efeitos especiais de explosão. É a única explicação para o uso indiscriminado de cenas onde Chico usa seu lançador de mísseis caseiro, primeiro contra um carro (um velho Opalão!!!), depois contra uma casa e, num momento completamente gratuito, até no meio de um rio, aparentemente só para testar o equipamento durante uma viagem a Santarém em que pretende eliminar um de seus alvos!!!
A violência, pelo menos, rola solta, com tiros nas costas, no saco e até na cabeça (incluindo jatinho de sangue esguichando do buraco!), e ainda as repulsivas e sádicas seqüências de estupro. Em comparação com o recente Confronto Final (trama de vingança estrelada por Jackson Antunes), vemos como a ousadia dos cineastas nacionais diminuiu um monte: se Horas Fatais às vezes é tão hardcore quanto Desejo de Matar, Confronto Final, com sua violência mais comedida e ausência total de sexo e nudez, parece filme infantil!
É muito engraçado tentar acompanhar uma história de ação rodada no Brasil (e é uma pena que não se façam filmes assim com mais frequência, porque atualmente todos os cineastas e produtores estão preocupados com histórias sobre as favelas ou sobre a miséria do Nordeste). Não tem como não cair na gargalhada, por exemplo, com a cena onde um dos vilões exclama, com a maior cara de pavor: “Oh não! É o Chico do bar! Ele veio para me matar!“. hahahahaha. “Chico do bar“???
Pior é que os bandidos agem tão abertamente que só mesmo em filme para não serem presos. O delegado interpretado por Zé do Caixão, por exemplo, chega a puxar sua arma para uma criança no meio da rua, em frente a um bar lotado, e em outro momento interrompe uma entrevista coletiva, quebrando a câmera de um repórter e gritando: “Que merda de imprensa marrom, eu vou embora daqui que meu tempo é valioso!“.
No fim, Horas Fatais – Cabeças Trocadas é uma diversão trash de primeira linha, daquelas para assistir com os amigos e se mijar de rir. Difícil é encontrar a velha fita da CIC Vídeo em alguma locadora. Mais difícil é entender de que sonho ou viagem lisérgica Francisco Cavalcanti tirou o subtítulo Cabeças Trocadas, já que seu filme não tem uma única cena de cabeças sendo decepadas ou algo do gênero…
O esforçado diretor/roteirista/produtor/ator sempre viveu à margem da indústria cinematográfica, rodando filmes com uma merreca de orçamento, como Os Violentadores de Meninas Virgens e Padre Pedro e a Revolta das Crianças (esse com Pedro de Lara, um jovem Gugu Liberato e Zé do Caixão!!!); seu último filme lançado comercialmente nos cinemas, numa época onde isso ainda era possível, chamava-se Aberrações de uma Prostituta (!!!). Ou seja: criatividade nos títulos sempre foi uma constante no trabalho do artista! Bons tempos que não voltam mais…
Eu digo que esse foi talvez um dos melhores filmes de ação nacionais. Deu pra ver claramente que o orçamento do filme estava apertado, e uma produção bem distante de Hollywood. Percebe-se claramente que os atores fizeram milagres pra que a produção acontecesse
Olhem o molequinho com a mulher nuazona em cena… Brasil não era para fracos nos anos 80, não a toa o “filme da Xuxa”, e Marieta Severo em Pixote também tem coisas que NUNCA passaria num filme hoje em dia.
Vc cita que o veículo detonado é um Opala (Opalão !!!).
Na verdade é um Maverick Ford !!!
Onde encontrar uma versão sem cortes, ou seja, que aparece o cara pondo no cu da mulher?
Assisti ontem no canal brasil. Tudo e muito precario,cinema exploracao da “melhor qualidade”! Tem toques de desejo de matar, mas com um q tupiniquim. O heroi e tao improvavel, e as cenas em geral tao precarias, que eu nao parei de rir, do primeiro ao ultimo dialogo! Realmente, os cenarios e a
Producao, nos remetem a um momento, em que era possivel fazer cinema trash de qualidade no brasil!
O filme e tao ruim que chega a ser hilario!
Onde encontro a versão sem cortes desse filme para download?
E uma pena que não existam mais diretores e produtores como o Francisco Cavalcanti, Realmente bons tempos dos filmes trash brasileiros , boca do lixo total.