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Boneco de Neve
Original:The Snowman
Ano:2017•País:UK, EUA, Suécia
Direção:Tomas Alfredson
Roteiro:Peter Straughan, Hossein Amini, Søren Sveistrup, Jo Nesbø
Produção:Tim Bevan, Eric Fellner, Peter Gustafsson, Robyn Slovo
Elenco:Michael Fassbender, Rebecca Ferguson, Charlotte Gainsbourg, Jonas Karlsson, Michael Yates, Ronan Vibert, J.K. Simmons, Val Kilmer, David Dencik, Toby Jones, Chloë Sevigny

O contraste entre a neve e o sangue já trouxe ao gênero fantástico filmes bem interessantes, tendo como principal representante o clássico Enigma de Outro Mundo, de John Carpenter. De lá para cá, também pode-se considerar como destaque do estilo produções como a trilogia Presos no Gelo, 30 Dias de Noite e o excepcional Deixa Ela Entrar. Geralmente a fórmula se estabelece pelo atmosfera claustrofóbica, por personagens envoltos em incertezas e vícios, além da exibição de cadáveres desmembrados e frios. Em meio a bons exemplares, Boneco de Neve não soube explorar o ambiente favorável à tensão e o pessimismo, nem muito menos a belíssima obra do experiente Jo Nesbø que serviu de inspiração para o roteiro de Peter Straughan, Hossein Amini e Søren Sveistrup, resultando em um longa – o uso do termo nunca fez tanto sentido pelas duas horas propostas – com muitos personagens e conteúdo, mas bagunçado, desconexo e extremamente incômodo e desnecessário.

Ao concluir a leitura do texto original, era possível imaginar as possibilidades da adaptação. O livro explora com calma e consciência seus inúmeros personagens e dá o tom adequado ao protagonista Harry Hole, detetive de uma série noir desenvolvida pelo autor a fim de despertar o lado mórbido da Noruega. Um herói cheio de falhas, mas carismático, que ainda consegue ser o mais experiente investigador de Oslo devido à boa solução encontrada em outros mistérios, Hole se vê envolvido numa série de desaparecimentos que pode comprometer o departamento de polícia e sua própria sanidade. Trata-se do serial killer apelidado de Boneco de Neve, que usa o símbolo do inverno para criar um paralelo entre a dificuldade de aceitação e o olhar para dentro de si.

A metáfora funciona nas páginas, mas não é bem trabalhada em sua versão cinematográfica. Com um elenco de rostos conhecidos e a direção do experiente Tomas Alfredson (Deixa Ela Entrar, 2008), a produção começa com o suicídio de uma mãe devido à negativa de um pai em aceitar o filho. Anos mais tarde, o constantemente embriagado Harry Hole (Michael Fassbender, de Alien: Covenant, 2017) parece sem rumo após ser abandonado por Rakel (Charlotte Gainsbourg, de Anticristo, 2009) e consequentemente por Oleg (Michael Yates). Sem nenhuma investigação à vista, Hole inventa desculpas para não ir trabalhar a fim de encher a cara nos bares até ser encontrado na manhã seguinte destruído em alguma sarjeta.

Ele não vê com bons olhos sua nova parceira, Katrine Bratt (Rebecca Ferguson, de Vida, 2017), transferida de Bergen para o departamento de Oslo. Sua chegada coincide com o desaparecimento de Birte Becker (Genevieve O’Reilly, de Rogue One, 2016), que, após uma briga com o marido, Filip (James D’Arcy, de O Destino de Júpiter, 2015), some durante a madrugada, com a primeira neve, deixando a pequena Josephine (Jeté Laurence) em desespero. Hole não parece muito animado em investigar o sumiço, mas fica intrigado pelo interesse de Katrine no caso e pelo popular Arve Stop (J.K. Simmons), além da estranha conexão desse com outros sequestros nos últimos nove anos, todos com o mesmo perfil: mãe possivelmente adúltera, filho bastardo.

Parece que todas tiveram um contato com o médico Idar Vetlesen (David Dencik), que, na obra, fica mais especificado seu “interesse” por prostituição. Nessa bagunça de nomes e situações ainda vale menção um velho detetive que, mesmo suspenso, investigou um desaparecimento no passado: Rafto (um Val Kilmer deformado, distante do outrora galã), que no livro é considerado também desaparecido. E também o novo namorado de Rakel, Mathias (Jonas Karlsson), cuja presença incomoda Hole por sua competência profissional e seu ainda interesse pela ex-esposa.

Fica claro que a adaptação deveria ter enxugado alguns subplots desnecessários, como a questão do mofo do apartamento do protagonista. Além disso, perde-se muito de sua força narrativa a ausência das suspeitas de Hole aos possíveis criminosos. Se no livro ele é manipulado pelo autor, no filme é ajudado pelo enredo. Já o vilão mostra-se falho na tentativa de enganar a polícia sobre a autoria dos crimes, esquecendo de eliminar exatamente a pessoa que poderia incriminá-lo. Assim como o plano de vingança de determinada personagem que não flui como na literatura, e ainda esbarra numa coincidência trágica. Até mesmo a personagem Sylvia Ottersen (Chloë Sevigny) tem um papel mais interessante na versão original, permitindo que Hole descubra uma falha considerável do assassino em seu celeiro pintado a sangue.

Alfredson não se beneficia da ambientação gélida, nem da imagem grotesca construída pelo vilão no livro e ainda erra em alguns cortes e acrescenta cenas que conduzem o enredo a lugar algum. Se a fotografia de Dion Beebe é levemente funcional, a trilha incidental de Marco Beltrami é de um mau gosto absurdo, com uma repetição eletrônica que fere o tom depressivo proposto pelo enredo.

Com tantos equívocos e distrações, Boneco de Neve é uma adaptação fria e quase sem pé nem cabeça, como as vítimas desse serial killer, que devia ter ficado apenas no livro.

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