4.4
(32)

A Abominável Criatura
Original:The Unnamable
Ano:1988•País:EUA
Direção:Jean-Paul Ouellette
Roteiro:Jean-Paul Ouellette, H.P. Lovecraft
Produção:Jean-Paul Ouellette, Dean Ramser
Elenco:Charles Klausmeyer, Mark Kinsey Stephenson, Alexandra Durrell, Laura Albert, Eben Ham, Blane Wheatley, Mark Parra, Delbert Spain

A fita VHS da Poletel era bastante atraente por já exibir na capa a tal “abominável criatura” do título, um spoiler visual que poderia ter sido evitado como o próprio filme o faz. Mas não é culpa da distribuidora brasileira, até porque a original tinha a mesma arte apelativa. Contudo, a informação mais importante vinha expressa logo abaixo ao indicar a inspiração em um conto de H.P. Lovecraft, intitulado “O Inominável” (The Unnamable), escrito em setembro de 1923 e publicado inicialmente em 1925 na Weird Tales. Trata-se de um conto curto, com apenas cinco páginas, que traz a conversa de dois amigos, Carter e Joel Manton, em um pequeno cemitério próximo a uma casa assombrada em Meadow Hill, na cidade de Arkham, Massachusetts. Os rapazes estão envoltos em uma interessante conversa sobre o que seria tangível, reflexos congelados em janelas e o que não pode ser descrito e nomeado, contando a história de uma criatura fêmea, filha de Cotton Mather, que “era mais que animal e menos que homem“.

Há quem acredite que o personagem Carter é o mesmo de outro conto do autor, “The Statement of Randolph Carter“, de 1919, além de um alterego do próprio Lovecraft pelo fato de ser escritor e cético, tendo ainda as semelhanças de Joel com seu amigo Maurice W. Moe. De todo modo, o monstro, com chifres e cascos, ataca ambos no local, antes mesmo de permitir que visitem a casa maldita, resultando no relato final da dupla no St. Mary´s Hospital, inicialmente acusando um touro para, por fim, declarar no sussurro de Joel: “Não… não foi nada disso. Estava por toda parte… uma gelatina… um lodo…, mas tinha formas, um milhar de formas de horror além de minha compreensão. Eram olhos… e uma mancha. Era o inferno… o vórtice… a abominação extrema. Carter, era o inominável.

Com esse assombroso material, é estranho pensar que “O Inominável” só viria a ter uma adaptação em 1988, em uma produção obscura dirigida e roteirizada por Jean-Paul Ouellette, talvez inspirado por outras adaptações do período, como Re-Animator e Do Além. Também pode-se considerar estranho o fato do conto não ter sido desenvolvido em outras versões que não esta e o curta Shadow of the Unnamable, de Sascha Renninger, de 2011. O filme A Abominável Criatura até faz um bom trabalho de reimaginação do texto, envolvendo até o mesmo o famigerado livro demoníaco Necronomicon, e tentando ao máximo apresentar um monstro com um visual próximo do descrito. Merecia uma produção melhor, com um trato mais adequado na trilha sonora e no roteiro repleto de clichês e falho, mas ainda assim é um bom terror B, escuro e atmosférico.

No final do século XVIII, Joshua Winthrop (Delbert Spain) está tendo problemas para conter sua filha Alyda (Katrin Alexandre), uma aberração gritante, presa no sótão de sua velha casa. Ao tentar acalmá-la, ele é morto por ela. O corpo é recolhido por policiais e um tal Sr. Craft (Colin Cox), sem que encontrem vestígios da criatura no local – o que é estranho, já que se trata de uma entidade física. Os acontecimentos iniciais fazem parte do relato de Randolph Carter (Mark Kinsey Stephenson) aos amigos Joel Manton (Mark Parra) e Howard Damon (Charles Klausmeyer), também com declarações sobre o rosto que fica para sempre marcado na janela de alguém que o espiou durante muito tempo e a existência do sobrenatural. O trio está sentado em uma árvore, próximo a um cemitério e a casa mencionada, com Joel sugerindo que eles passem a noite no local.

Sem o interesse dos amigos, ele vai sozinho à casa, somente para encontrar seu destino nas garras do monstro. Percebendo a ausência do amigo no dia seguinte, Howard convence Carter a irem atrás dele, sem saber que, coincidentemente, dois veteranos da faculdade Miskatonic (a mesma de Re-Animator), Bruce Weeks (Eben Ham) e John Babcock (Blane Wheatley), conseguiram convencer duas novatas, Wendy Barnes (Laura Albert) e Tanya Heller (Alexandra Durrell), a um encontro justamente na tal casa. Coincidência (lê-se facilidade do roteiro) porque Howard gosta de Wendy, enquanto Tanya é apaixonada por ele; e não se sabe a razão dos rapazes terem escolhido a mesma ambientação, uma vez que não parece ser um espaço bom para um encontro.

A partir de então, o longa parece A Noite dos Demônios (Night of the Demons), lançado no mesmo ano. Presos no local (talvez pela casa pertencer a um bruxo), enquanto Howard busca o amigo e cruza com Tanya e é atacado por Wendy, Carter se interessa pelo Necronomicon e passa a estudar a obra e sua magia envolvida. Os personagens, então, ficam andando para cima e para baixo, atravessando quartos e corredores, com velas ou lanternas, até terem problemas com a terrível Alyda. Esta aparece na segunda metade do filme, em um bom trabalho de maquiagem, e aproveitando a interessante movimentação de Katrin Alexandre. Com chifres, cascos e asas, a “abominável criatura” irá arrancar corações, quebrar pescoços e sufocar suas vítimas, com seu grito característico, cabendo a Carter saber usar o livro para encontrar um meio de detê-la.

O longa é cheio de clichês, permitindo que boa parte de suas ações sejam antecipadas. Não é difícil imaginar a ordem das mortes, quem terá mais importância, e quais serão os sobreviventes. A criatividade fica por conta do uso do Necronomicon funcionando como um livro de magias que até um leigo na escrita e pronúncia árabe consegue utilizar nos momentos certos. Há boas cenas de morte e confrontos com o inimigo sobrenatural, assim como vale menção à ambientação, curiosamente mantida bem conservada para uma casa existente desde o século XVIII.

Sem destaque no elenco – o único do elenco que vingou realmente foi Laura Albert, trabalhando como dublê em mais de 160 produções -, A Abominável Criatura é uma boa introdução ao conto de Lovecraft. Mesmo com clichês em cada cômodo, sequências escuras e atuações canastronas, o filme se mostra curioso pelas referências ao universo do escritor, além de ser uma divertida história de monstro. Sabe-se lá por que, o longa conseguiu desenvolver uma continuação, O Inominável – O Retorno, lançado em 1992, com direção novamente de Jean-Paul Ouellette, e trazendo relações também com o conto “The Statement of Randolph Carter“. Não seria fácil realmente manter uma criatura de Lovecraft em um descanso eterno.

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8 Comentários

  1. Me lembro de assistir nos anos 90 no Cine Trash, que passava a tarde na tv aberta, bons tempos. Gostei do filme na época, mesmo sendo um terror B, ainda mais que tem origem no conto de H.P Lovecraft, excelente analise !!!

  2. Assisti esse filme em vhs e na época eu gostei muito, o interessante é que não sei onde eu assisti, mas fala da origem do abominável, que na realidade é uma história muito triste..

  3. Gostei do filme porque curto filmes dos anos 80 e 90, me remetem à minha infância, e a trilha sonora final é impagável, inclusive baixei na minha playlist. Up There.

  4. Eu curti bastante esse filme, principalmente por conta da ambientação. Porém, não encarei a continuação e nem pretendo. Foi uma boa análise!

  5. Tá aí um filme que merece um remake mais sombrio e atmosférico, focado no suspense da identidade da criatura. Acho que esse conto do Lovecraft dá pra fazer um baita filmão de horror, só basta cair nas mãos certas.

    1. Era o meu filme b favorito do Cine trash; nos anos 90. Dava para ver até o zíper do monstro.

    1. Avatar photo
      Author

      Obrigado, Emanuel! Vale a pena ler o conto antes ou depois de rever o filme. Traz possibilidades muito boas de reflexão.

      Abs

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