4.7
(22)

Filhos do Medo
Original:The Brood
Ano:1979•País:Canadá
Direção:David Cronenberg
Roteiro:David Cronenberg
Produção:Claude Héroux
Elenco:Art Hindle, Cindy Hinds, Henry Beckman, Nicholas Campbell, Oliver Reed, Reiner Schwartz, Robert A. Silverman, Samantha Eggar e Susan Hogan

Embora seja considerada uma obra menos importante do cineasta David Cronenberg – rodada ainda em início de carreira – The Brood (1979) apresenta em menor intensidade um dos elementos que se firmaria dominante em sua extensa e cultuada filmografia: a bizarra e quase sempre metafórica degradação de seus personagens, seja física ou psicológica. Somente esta característica bastaria para tornar o longa-metragem obrigatório àqueles que procuram compreender a formação de um dos cineastas mais interessantes da década de 80, responsável por filmes como Scanners – Sua Mente Pode Destruir (1981), A Hora da Zona Morta (1983), Videodrome (1983) e A Mosca (1984). Contudo, Filhos do Medo (título adotado no Brasil desde o seu lançamento nos tempos do VHS) supera este estigma de “indispensável” e se constrói um thriller eficiente em que suspense e horror são dosados de maneira inteligente – apesar de trabalhar um tema muito in voga na época: a parapsicologia – o próprio diretor voltaria a abordar de maneira genial o assunto em Scanners e A Hora da Zona Morta. No entanto, vale lembrar que um ano antes, Brian de Palma havia rodado A Fúria (com Kirk Douglas) e contribuído substancialmente para o subgênero com uma espécie de “rascunho” para o que viria a ser Scanners.

O próprio Cronenberg é responsável pelo roteiro de Filhos do Medo e teria sido fortemente influenciado pelo momento delicado pelo qual passava a sua vida pessoal – o cineasta acabava de sair de um divórcio difícil e travava uma disputa judicial pela guarda da filha. Irônico, ele chegou a afirmar em entrevista que o filme era a sua versão particular para Kramer vs Kramer – produção que faturou 5 estatuetas do Oscar, incluindo a de Melhor Filme, em 1979, desbancando nada menos do que Apocalipse Now, de Francis Ford Coppola. A comparação de Cronenberg é honesta, pois ambas as produções, cada uma a sua maneira, abordam as frustrações e os ressentimentos de um casal após a separação e os conflitos em relação a custódia de um filho.

O enredo

No instituto Somafree, em frente a uma silenciosa e atenta plateia, o Dr. Hall Raglan (Oliver Reed, de Gladiador, 2000) humilha um de seus pacientes, Mike. O objetivo é fazer com que a raiva e os sentimentos se manifestem no estado mais puro. Em determinado momento, surgem na pele do paciente manchas vermelhas que rapidamente transformam-se em feridas. É a chamada psicoplasmação, ou seja, a materialização da raiva mental – fenômeno explicado pelo Dr. Raglan em seu livro The Shape of Rage. A maioria aplaude, menos Frank Carveth (Art Hindle, de Os Invasores de Corpos, 1978), que não concorda com os métodos ainda experimentais utilizados pelo médico. Frank está no local aguardando a sua filha, a pequena Candice, que visita a Mãe, Nola (interpretada por Samantha Eggar, de O Colecionador, 1965), internada voluntariamente no instituto.

Já em casa, Frank descobre vários hematomas pelo corpo da filha Candice. Ele suspeita que Nola possa tê-la violentado durante a visita. Indignado, resolve voltar ao Instituto para tirar satisfações com a ex-esposa, mas é impedido de vê-la. Frank decide então investigar não apenas o instituto, mas também o carismático e misterioso Dr. Raglan – ao mesmo tempo, pessoas ao seu redor começam a ser violentamente assassinadas por criaturas que se assemelham a… crianças.

O desfecho

O principal mérito do roteiro é o clima de estranhamento causado pelas rápidas aparições das criaturas. Elas se assemelham a crianças, mas com o rosto envelhecido e sem expressão. Curiosamente ainda possuem a mesma estatura e usam roupas iguais as de Candice. A autópsia de uma destas criaturas (capturada já sem vida) constata que ela não possui umbigo nem órgãos sexuais. Então, como teria sido concebida? Esta questão é respondida quando Frank consegue finalmente encontrar Nola. A terapia psicoplasmática do Dr. Raglan obteve resultados inacreditáveis com Nola: ao externar sua raiva relacionada a um possível abuso que sofreu quando criança, ela acaba gerando as criaturas, como se fossem seus filhos, mas não provenientes de seu útero. Assim como as feridas e as deformações dos outros pacientes, os fetos brotam do corpo de Nola, numa sequência indigesta e muito bem realizada para a época, com efeitos e maquiagens impressionantes.

Filhos do Medo recebeu a Menção Especial do Juri, no Sitges – Catalonian International Film Festival em 1981 – Cronenberg já havia ganho nos anos anteriores os prêmios de Melhor Roteiro e Melhores Efeitos Especiais por Enraivecida na Fúria do Sexo (1977) e Melhor Diretor por Calafrios (1975).

É importante destacar que a boa e marcante trilha sonora de Howard Shore (vencedor do Oscar pelas composições de O Senhor dos Anéis, 2001) para The Brood define o início de uma parceria que se viria a se repetir em praticamente em todos os trabalhos posteriores de Cronenberg.

Quanto ao título adotado pelas distribuidoras brasileiras, se ele não é lá muito criativo, pelo menos é de certa maneira superior ao original, pois The Brood (algo como “A Ninhada”), traz implícito um grande spoiler sobre a origem das criaturas. Para os interessados, Filhos do Medo foi lançado no Brasil pela primeira vez ainda em VHS pela saudosa Top Tape e mais recentemente teve uma edição simples em DVD pela Magnus Opus, infelizmente, sem nenhum material extra “considerável”.

Ainda segundo sites especializados americanos, estaria em fase de pré-produção um remake para The Brood, cujas filmagens deverão acontecer entre 2012 e 2013 com a direção de Breck Eisner, cineasta que traz no currículo outra refilmagem (do clássico Exército do Extermínio, de George Romero) lançada no Brasil em 2010 como A Epidemia.

Enfim, mesmo não sendo um Cronenberg totalmente maduro (como o de A Mosca, por exemplo), Filhos do Medo revela um cineasta em início de carreira muito esforçado e promissor, que com um orçamento reduzido (algo em torno de US$ 1,4 mi) e um elenco limitado (infelizmente o canadense Art Hindle nem sempre convence como o protagonista), consegue trabalhar muito bem as ambiguidades e a falta de respostas de um roteiro que mais insinua do que propriamente diz (não, isto não é exatamente uma crítica), reservando ainda de maneira inteligente os efeitos repulsivos para o grotesco e perturbador clímax. Certamente, Filhos do Medo merece ser conhecido e apreciado por todos os fãs do gênero.

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8 Comentários

  1. Assisti quando tinha 13 anos e não tinha maturidade para compreender as metáforas apresentadas, filmes de terror são uma espécie de fábula moderna, onde por meio de uma fantasia que por vezes assusta podemos tirar uma lição. Pelo menos os filmes antigos, pois atualmente o que encontro é o puro prazer de filmar pessoas sendo torturadas, o que me leva a outra divagação: seria a audiência mais torpe do que seus idealizadores?

  2. Este filme é bom, merece ser conhecido por todos os fãs do gênero.

  3. Chocante, sangrento, sexualmente perverso e brilhante!

  4. Cronenberg já mostra quais as intenções dele no campo cinematográfico.. Filme muito bom e o final aberto parece nos revelar a continuidade dos sintomas da mãe

    1. Assisti a este filme ontem… cada vez mais a filmografia de Cronenberg me fascina, e este filme me encantou ao mesmo tempo que me perturbou, como todos os filmes que vi deste gênio! Mas este me perturbou de maneira especial… sem dúvida é um filme empolgante para quem curte um terror com bons toques grotescos.

    2. Ótima fotografia excelente imagem vi no YouTube a cópia tá perfeita gostei do filme nunca tinha visto merece o remake dou nota 7 de zero a10 só tem um furo por que se ela não gostava do médico a paciente por que as criaturas não se voltaram contra ele antes do final sem nexo mas o filme e bom bons efeitos.

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