Kuntilanak - Espelho do Mal
Original:Kuntilanak
Ano:2018•País:Indonésia Direção:Rizal Mantovani Roteiro:Alim Sudio Produção:Raam Punjabi Elenco:Sandrinna Michelle, Aurélie Moeremans, Fero Walandouw, Nena Rosier, Andryan Bima, Ciara Nadine Brosnan, Adlu Fahrezi, Ali Fikry, Naufal Ho |
Em seu início de carreira, Takashi Shimizu parecia preso na casa amaldiçoada de seu principal argumento. Depois de idealizar Ju-On e Ju-On 2, ambos de 2000, ele ainda comandaria O Grito (Ju-On, 2002), O Grito 2 (Ju-On 2, 2003), iria para América do Norte fazer O Grito (The Grudge, 2004) e a sequência O Grito 2 (The Grudge 2, 2006). Parece que a insistência também faz parte da rotina de sua versão da Indonésia, Rizal Mantovani, que, em 2006, dirigiu o sobrenatural Kuntilanak, seguido por Kuntilanak 2 (2007) e Kuntilanak 3 (2008)…até realizar mais um, este ano. O interesse advém, em ambos os casos, da força narrativa de suas criações: tanto a casa que herda o ódio de um crime violento quanto a entidade feminina são produtoras de bons arrepios, desde que haja um enredo que saiba explorar o conteúdo. Não é o caso de Kuntilanak – Espelho do Mal, disponibilizado há alguns meses pela Netflix.
Trata-se da assombração também conhecida como Pontianak ou matianak, presente na mitologia malaia, e que é bastante popular na Índia, Bangladesh e Paquistão. A entidade é identificada como uma mulher que morreu durante a gravidez, e que busca, assim, crianças que possam substituir sua perda. Há versões mais relacionadas ao vampirismo, outras que se assemelham a pássaros; é vista como uma mulher bonita, de cabelos pretos longos e olhos vermelhos. Pela grande variedade da lenda, é fácil perceber o quanto ela pode ter parentesco com fantasmas orientais e americanos, habitar casas malditas e matas escuras, justificando a realização de tantas produções similares.
Esse novo trabalho de Mantovani faz uso do argumento principal para se embebedar pelo gênero em inúmeras referências. Há pitadas de O Espelho, Invocação do Mal e até Os Goonies, se você permitir o passeio das lembranças. Logo na introdução, o jovem Anjas (Naufal Ho), sofrendo de saudades da falecida mãe, é visitado pela Kuntilanak, que o engana para arrastá-lo para um imenso espelho no desespero de seu pai. Algum tempo depois, cinco órfãos, bem cuidados no casarão de Donna (Nena Rosier), ficam sozinhos com a viagem dela para os Estados Unidos, tendo apenas a jovem Lydia (Aurélie Moeremans) como responsável. Como o namorado da garota, Glenn (Fero Walandouw), possui um programa de investigação sobrenatural, ele e sua equipe visitam a casa onde o garoto sumiu no começo e retira de lá o tal espelho para presentear a cuidadora.
Com o objeto no orfanato, principalmente sabendo que se trata de uma assombração que se alimenta de crianças, não demora muito para os pequenos serem atormentados pela Kuntilanak. Visões assustadoras, o som de uma risada estridente, pesadelos…passam a ser rotina entre os pequenos. Não satisfeitos com os problemas em casa, as crianças resolvem ir atrás de mais um: depois que ficam sabendo que um concurso irá premiar aquele que conseguir fotografar uma Kuntilanak, eles atravessam uma floresta densa para visitar a casa de Anjas, somente para serem perturbados com a visão do próprio desaparecido e da entidade.
O que é de praxe no cinema indonésio é o enredo que mistura um pouco de tudo do gênero: um espelho amaldiçoado (vide Amityville: A Nova Geração, 1993), casa assombrada, concurso arriscado, fantasma vingativo, prego como arma e crianças arteiras. Até mesmo o momento em que a assombração sai do espelho remete à menina fantasma de O Chamado, em sua escapada pela TV. Apesar de algumas limitações, os efeitos até agradam na concepção da Kuntilanak, assim como o elenco jovem, composto de crianças talentosas com uma ou outra atuação risível: a pequena Ambar (Ciara Nadine Brosnan), que vez ou outra olha para a câmera; o gordinho Panji (Adlu Fahrezi); o risonho Kresna (Andryan Bima); o sabe-tudo Miko (Ali Fikry); e a protagonista-mirim Dinda (Sandrinna Michelle), que possui uma boa expressividade.
Mesmo com o argumento fantasmagórico, Mantovani dá um tom humorístico à produção em diversos momentos, lembrando também Stranger Things. As brigas entre as crianças, e as brincadeiras, são acompanhadas de um acorde da trilha para lembrar que deveria ser o momento da risada. Às vezes, até funciona. O que atrapalha realmente é o roteiro esburacado de Alim Sudio, que deveria justificar a demora nas ações da assombração, tendo em vista a fragilidade psicológica das crianças. Ora, são órfãs, carentes. Por que ela precisa criar situações sobrenaturais como movimento de móveis ou de um carrinho para depois decidir o óbvio: fingir que é a mãe de um deles para conduzi-los para seu mundo?
Além disso, a longa duração não se justifica. Cenas arrastadas, como o duplo “susto do gato“, ou caminhadas em direção aos sons estranhos – e exigiriam muita coragem – que só servem para assustar o espectador poderiam ser excluídas e trariam uma dinâmica melhor à produção. E se você tiver curiosidade sobre a lenda, não espere nada além do que foi dito no segundo parágrafo deste texto; ou nas pesquisas do livro que Miko possui. Provavelmente, boa parte da mitologia tenha sido explorada nos outros filmes de Mantovani, ou estarão no próximo. Ou alguém acha que o diretor irá abandonar o projeto que mais tem trabalhado em sua carreira cinematográfica. Shimizu deixou O Grito de lado e foi amaldiçoado por filmes ruins…
Uma onda de filmes oriundos da Indonésia chegando por aqui. Gosto deste tema de assombrações e como os povos da Ásia tratam o mesmo seja na literatura ou via película. O problema é que parte desta fórmula está desgastada demais. Não digo nem pelo fato das histórias se repetirem mas sim, a direção errática de muitos diretores, edições equivocadas e por aí vai.