Não Olhe (2018)

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Não Olhe
Original:Look Away
Ano:2018•País:Canadá
Direção:Assaf Bernstein
Roteiro:Assaf Bernstein
Produção:Assaf Bernstein, Brad Kaplan, Giora Kaplan, Dana Lustig
Elenco:India Eisley, Jason Isaacs, Mira Sorvino, Penelope Mitchell, John C. MacDonald, Harrison Gilbertson, Kristen Harris, Ernie Pitts, Adam Hurtig

Aquele ódio vingativo que consumiu Carrie White e promoveu uma formatura de sangue é uma resposta ao bullying, à maldade humana e à discriminação, muitas vezes evidentes no ensino regular. Trata-se de um reflexo de uma sociedade que exclui o diferente e ainda zomba de suas características físicas e atitudes, como uma maneira de se impor, mostrar um poderio momentâneo, tendo em vista a incapacidade de reagir da vítima. Sem poderes psíquicos, quando há reação o resultado pode envolver massacres como o de Suzano, ocorrido nesta semana, ou o do Realengo, no Rio de Janeiro, e até mesmo o suicídio, numa atitude erroneamente considerada covarde. No caso de Maria Brennan (India Eisley), do thriller dramático Não Olhe (Look Away, 2018), que chegou aos cinemas brasileiros no dia 28 de fevereiro, a reação pode vir de um reflexo, de liberar o lado ousado e vingativo que cada um esconde dentro de si.

Tímida e rejeitada, Maria tem como amiga apenas a desinibida Lily (Penelope Mitchell), que namora com seu interesse afetivo Sean (Harrison Gilbertson). Além de sofrer as investidas do terrível Mark (John C. MacDonald), a jovem não encontra apoio em sua própria morada, seja com o pai, o cirurgião plástico Dan (Jason Isaacs), que acredita que a garota não valoriza suas qualidades físicas, seja com a mãe, Amy (Mira Sorvino), que tem seus próprios problemas psicológicos como a depressão. Depois que encontra o resultado de um ultrassom, escondido no espelho (!!!), que mostra que ela teve uma irmã gêmea, Maria percebe que seus reflexos no espelho possuem uma identidade própria, uma versão de si mesma com mais ousadia, confiança e autoafirmação.

Airam” é literalmente o seu oposto, agindo como seu subconsciente ao despertar ações vingativas na garota incluindo uma troca temporária para que ela comande uma reação. O ápice de uma decisão equivocada acontece durante uma festa, realizada numa quadra de patinação, quando Maria experimenta o auge, na dança com seu affair (Carrie na premiação do baile), e a humilhação plena com a queda diante de todos (o balde de sangue de porco), sendo arrastada por Mark pelo gelo, sob a risada dos demais. Sua personalidade sombria desponta para uma vingança a partir de então, sem medir as consequências de seus atos para desespero de seu lado sensível e humano.

Com uma dupla interpretação bem coordenada de India Eisley, de Anjos da Noite: O Despertar, Não Olhe parece tratar do sobrenatural de maneira simbólica, ainda que apresente flashbacks que possam justificar os estranhos acontecimentos. A narrativa lenta e dramática não transforma Airam numa serial killer violenta e sangrenta, embora permita que ela possa reagir mortalmente contra aqueles que a incomodaram durante a vida escolar. Ainda assim, não explica porque Maria, de repente, parou de se alimentar, ou se tudo o que ela sofria começara há pouco tempo ou se a acompanhara desde pequena – se sim, como ela enfrentava essas agressões até então?

A direção de Assaf Bernstein é discreta, quase sem personalidade. Faz uso de poucas locações e envolve um grupo pequeno de personagens. Utiliza cores frias na fotografia de Pedro Luque, para combinar com a estação vigente, e nem se preocupa em destacar o sangue que escorre das vítimas. Trata a vingança também de maneira lenta e fria, trabalhando mais as características dos personagens que moldaram Airam como o pai adúltero, a mãe destruída psicologicamente e a amiga que desconfia dos interesses da garota pelo seu namorado. A combinação desses elementos pode não agradar aos que valorizam o ritmo frenético e a exposição do sangue rubro de produções similares, mas há de se concordar que a imagem final é bastante perturbadora e sinistra.

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Marcelo Milici

Professor e crítico de cinema há vinte anos, fundou o site Boca do Inferno, uma das principais referências do gênero fantástico no Brasil. Foi colunista do site Omelete, articulista da revista Amazing e jurado dos festivais Cinefantasy, Espantomania, SP Terror e do sarau da Casa das Rosas. Possui publicações em diversas antologias como “Terra Morta”, Arquivos do Mal”, “Galáxias Ocultas”, “A Hora Morta” e “Insanidade”, além de composições poéticas no livro “A Sociedade dos Poetas Vivos”. É um dos autores da enciclopédia “Medo de Palhaço”, lançado pela editora Évora.

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