Herança Maldita (2020)

4.2
(5)

Herança Maldita
Original:Castle Freak
Ano:2020•País:EUA
Direção:Tate Steinsiek
Roteiro:Kathy Charles, H.P. Lovecraft
Produção:Barbara Crampton, Matt Manjourides, Justin A. Martell, Amanda Presmyk, Dallas Sonnier
Elenco:Clair Catherine, Kika Magalhães, Jake Horowitz, Emily Sweet, Genti Kame, Omar Shariff Brunson Jr., Chris Galust, Klodjana Keco, Elisha Pratt

Terceira parceria de Stuart Gordon com Jeffrey Combs e Barbara Crampton, inspirado em obra de H.P. Lovecraft, Herança Maldita (Castle Freak, 1995) é um horror gótico, claustrofóbico e atmosférico, sobre uma família, os Reilly, que herdam um castelo do século XII, pertencente a uma duquesa, sem saber que entre os corredores frios habita uma criatura horripilante, exatamente o filho dela, Giorgio Orsino (Jonathan Fuller), meio-irmão de John (Combs). Ele, a esposa Susan (Crampton) e a adolescente cega Rebecca (Jessica Dollarhide) logo percebem que não estão sozinhos, havendo entre eles um “intruso” (como o conto original é denominado no Brasil), um monstro voraz e que busca vingança. Produção divertida, mas bem distante do texto original, “The Outsider“, escrito em 1921 e publicado na revista Weird Tales em 1926.

O conto, de poucas páginas, traz as ações sob o viés da criatura, buscando o lado externo para observar a “lua, cheia e radiante, que eu jamais vira“, sem que tenha pronunciado um som sequer ou tenha visto sua aparência. Depois que sai de sua cova e caminha por um longo percurso, ele encontra um castelo onde está sendo realizada uma festa de máscaras. “Assim que cruzei o peitoril, o grupo todo caiu num estado de terror súbito e inesperado de tremenda intensidade“, mas ele não imagina a razão disso até visualizar a tal aberração em uma “superfície fria e sólida de vidro polido“, isto é, em um espelho. Com ricas descrições dos ambientes de pedra e até da própria aparência, “The Outsider“, um dos melhores textos do escritor, é o encontro de Lovecraft com Edgar Allan Poe, inspirado nos contos “Berenice” e “A Máscara da Morte Rubra“.

O longa de 2020, Herança Maldita, de Tate Steinsiek, desenvolvido a partir de um roteiro de Kathy Charles, não é uma nova adaptação, mas uma refilmagem do filme de Stuart Gordon, prestando um fan service na inclusão de outros elementos das obras de Lovecraft, como o famigerado Necronomicon, o mito de Cthulhu, menção aos Antigos, Dunwich, a Universidade Miskatonic e até Herbert West e seu reagente. Todas essas referências estão camufladas em um terror teen, com péssimas atuações e muitos clichês, produzido pela Fangoria, por Charles Band e pela scream queen Barbara Crampton.

Após uma curtição com os amigos e tendo o namorado John (Jake Horowitz) consumindo drogas e bebidas, um acidente faz com que Rebecca (Clair Catherine) perca a visão. Tempos depois, ela foi informada pelo agente imobiliário Marku (Genti Kame) que herdou um castelo na Albânia, após o falecimento de sua mãe Lavínia Whateley (Kika Magalhães). Com o incentivo do namorado, a garota pretende vender os móveis e o próprio castelo, decidindo passar uns dias no local sem saber que sua mãe mantinha uma criatura acorrentada ali, enquanto se auto flagelava diante de um altar. Logo Rebecca percebe que não está sozinha e que há algum “intruso” no ambiente, para descrédito de John.

Three Finger preso em um castelo

Depois que um vendedor de drogas é morto pelo monstro, chegam ao castelo os amigos de John: Shelly (Emily Sweet), que ainda mantém um interesse pelo rapaz, o inteligente Professor (Chris Galust) e dois outros que atuam muito mal, interpretados por Omar Shariff Brunson Jr. e Elisha Pratt. Assim que encontram o Necronomicon, o Professor percebe que ele traz instruções para abertura de um portal entre dimensões e passa a se interessar pelo processo que envolve a união dos irmãos, Rebecca e a aberração, enquanto John se importa com drogas e a venda do castelo, além de trair a namorada com Shelly. Marku aparenta ter algo a ver com a maldição que habita o lugar, assim como os moradores do vilarejo próximo.

Apesar da boa maquiagem e de bons efeito gore, com vítimas sendo mutiladas e devoradas, Herança Maldita tem um enredo que não empolga, além de atuações constrangedoras. Se Clair Catherine e Jake Horowitz até trabalham razoavelmente bem, o mesmo não se pode dizer dos demais. Omar e Elisha são péssimos, e evidenciam a ruindade em vários momentos, como na cena em que encontram o cadáver da amiga e não esboçam nem sequer um reação de espanto, como se estivessem olhando sem fome para um prato de comida. E o Professor também não traz muita confiança em sua nerdice e interesse repentino em despertar entidades antigas.

Assim, como os personagens não são interessantes e nem inspiram respeito ou o castelo é pouco explorado, resta aos apreciadores de horror B curtirem o final quase apocalíptico e se esbaldarem com o sangue em profusão, a exposição de corpos em cenas de sexo e as tais referências à literatura lovecraftiana, como a presença de uma estátua de Cthulhu, vista rapidamente em cena. É muito pouco para honrar a obra do escritor, e completamente desnecessário como refilmagem do longa de 1995. Herança Maldita é apenas mais um filme de monstro pouco inspirado, em que o fan service se imaginou suficiente para atrair bons olhos.

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Marcelo Milici

Professor e crítico de cinema há vinte anos, fundou o site Boca do Inferno, uma das principais referências do gênero fantástico no Brasil. Foi colunista do site Omelete, articulista da revista Amazing e jurado dos festivais Cinefantasy, Espantomania, SP Terror e do sarau da Casa das Rosas. Possui publicações em diversas antologias como “Terra Morta”, Arquivos do Mal”, “Galáxias Ocultas”, “A Hora Morta” e “Insanidade”, além de composições poéticas no livro “A Sociedade dos Poetas Vivos”. É um dos autores da enciclopédia “Medo de Palhaço”, lançado pela editora Évora.

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