 Makiwara
Original:Makiwara Ano:2022•País:Brasil Autor:Marco T. Alves•Editora: Grupo Editorial Atlântico |
As redes digitais se tornaram um mundo próprio cibernético, livre e descentralizado cujas infraestruturas abrigam não apenas os meios de comunicação entre os indivíduos conectados na internet, mas todo um ambiente com entretenimento, cultura, armazenamento de dados e documentos importantes, transações financeiras e até mesmo a criação ou resolução de conflitos que reverberam em diversas áreas do mundo offline. Por isso, alguns especialistas em antropologia defendem que a sociedade moderna, onde as pessoas estão cada vez mais conectadas e dependentes de suas ligações digitais, está saindo do sistema econômico capitalista para um tecnofeudalismo, onde os conglomerados digitais dominam cada vez mais nossas vidas.
Com essa crescente imersão dos seres humanos nas redes digitais, Marco T. Alves desenvolve o seu mundo no livro Makiwara. Ambientando a história em São Paulo, as pessoas abandonam cada vez mais o conceito de viver em sociedade em prol de viver no mundo virtual, em uma espécie de Matrix digital, onde simula o mundo real, porém com diferentes possibilidades de customização e diversão para seus usuários. É claro que não são todos que podem ter acesso a esse incrível ambiente digital, apenas uma pequena fração de indivíduos abastados financeiramente, então a maioria das pessoas usa sua vida digital anônima como um escape de sua vida real buscando interações, diversão e prazeres que normalmente não procurariam no mundo desconectado.
É nesse contexto que somos apresentados a FR33D0M, uma jovem programadora brasileira descendente de orientais que desenvolveu KIRI04, um poderoso alucinógeno digital que virou sensação entre as pessoas ricas da alta sociedade paulista. Apesar da atividade ilegal, tudo estava tranquilo para FR33D0M, até que alguns de seus clientes tem um fim trágico e brutal logo após comprar a droga com ela. Inevitavelmente, a garota acaba sendo abordada por Soares, um misterioso e imponente homem que sabe de sua atividade secreta e quer recrutá-la para uma empresa de segurança que tem por objetivo resolver o grave problema dos Famintos, que são hordas de viciados desconectados que podem aparecer em qualquer ponto da cidade destruindo tudo e todos que estão em seu caminho, com uma brutalidade quase indescritível. Notou alguma semelhança com o mundo atual?
Com um passado de tragédia familiar envolvendo os Famintos, a resposta de FR33D0M a Soares irá levá-la a uma jornada onde não apenas a sua vida estará em risco, mas também a de seu único parente vivo próximo – seu avô.
Fãs de tecnologia facilmente perceberão em Makiwara diversas referências, já que algumas delas são comuns no dia a dia de muitas pessoas, dependendo do quão imersas elas estão nas inovações mais recentes. Quem mora ou conhece São Paulo também se sentirá familiarizado com a ambientação proposta e com os paralelos que o autor faz entre a realidade atual da cidade e a desse mundo distópico que não está em um futuro tão distante quanto gostaríamos.
FR33D0M e seu avô são personagens bem desenvolvidos em sua relação, com uma bem explorada parceria e cumplicidade, já que o homem tem seus momentos de destaque ao longo da narrativa. Os (poucos) amigos da protagonista, apesar de oriundos da realidade virtual, também se mostram bem simpáticos e atenciosos com a programadora, indicando que é possível sim ter conexões verdadeiras e duradouras com pessoas do mundo digital se tomados os devidos cuidado e atenção. Ainda há pessoas boas por aí.
Por ter um pouco mais de 160 páginas, a abordagem de alguns temas presentes, ou mesmo a resolução do problema principal, acabam sendo rápidas e não tão profundas. Há claramente uma crítica ao poder exercido por empresas que, sem o menor pudor e respeito pela vida humana, criam o problema e depois aparecem como salvadoras da pátria com a solução a preços exorbitantes, além de um questionamento sobre qual seria o limite ético ou digno ao lidar com aqueles que cometem barbáries, entre outras claras críticas sociais. Mas essas críticas são apenas um pano de fundo para o conflito da protagonista com seus antagonistas que, mesmo sendo o que move a narrativa, é resolvido de maneira um tanto simplista dada a gravidade e dificuldades iniciais apresentadas, além de um tanto previsível, sem grandes surpresas ou reviravoltas.
Sociedades distópicas com um ambiente virtual simulando ou expandindo a vida real é algo que já foi muito abordado ao longo das décadas, sendo um tema que soa até um pouco repetitivo nos dias de hoje. Apesar disso, quem já assistiu clássicos da ficção científica como Matrix, ou até mesmo alguma distopia que aborda alguns temas semelhantes como Maze Runner ou Jogador Nº 1, facilmente consegue ver as inspirações utilizadas em Makiwara, sendo uma boa pedida para aqueles interessados nas possíveis consequências dos avanços tecnológicos.
A obra pode ser adquirida na Amazon em formato digital ou físico.
