4.6
(9)

The Machine Girl
Original:Kataude mashin gâru
Ano:2008•País:Japão, EUA
Direção:Noboru Iguchi
Roteiro:Noboru Iguchi
Produção:Yoshinori Chiba, Yoko Hayama, Satoshi Nakamura
Elenco:Minase Yashiro, Asami, Kentaro Shimazu, Honoka, Nobuhiro Nishihara, Yûya Ishikawa, Ryôsuke Kawamura, Demo Tanaka, Nahana, Taro Suwa

Eu nunca fui um adepto fanático dos quadrinhos, seja na sua forma clássica ou oriental, o mangá. Não por uma questão de gosto, mas de opção: prefiro dedicar meu tempo com a sétima e não com a nona arte. Contudo como um interessado leitor casual e do pouco que eu sei sobre o gênero, poucas são as produções cinematográficas que possuem aquela “pegada” dos quadrinhos – especialmente dos orientais – como Kataude Mashin Gâru ou The Machine Girl, como lançado em DVD nos Estados Unidos.

Esse filme é uma personificação de todos os absurdos que nos fazem grudar na leitura de um bom gibi e é tão bem transferido para as telas (apesar de não ser uma adaptação de nenhum mangá) que posso arriscar a dizer que é um dos grandes clássicos do humor negro com elementos de horror, não devendo nada em diversão descompromissada e violenta em comparação com Trash Náusea Total, Uma Noite Alucinante 3 ou Rick-oh: A História de Ricky.

A história não é inédita, tampouco modifica elementos clássicos do gênero “violent payback“, porém Noboru Iguchi, roteirista e diretor, conseguiu realizar uma película graficamente impressionante, intensa e excessivamente sangrenta como os mangás deste segmento.

Um prato cheio para amantes dos quadrinhos orientais e das películas acima citadas, um blockbuster em potencial (mesmo que não possua um orçamento generoso), que precisa ser conhecido pelo grande público.

A propósito, sim, The Machine Girl tinha méritos para se tornar um grande sucesso comercial e ser lançado nos cinemas em grande escala. Esqueça Motoqueiro Fantasma e O Justiceiro; eles não seriam páreos para a sede de justiça da protagonista deste filme.

O roteiro gira em torno da garota citada acima. Ami Hyuga (Minase Yashiro, em sua estreia no cinema) é uma típica estudante dos colégios japoneses. Ela é uma excelente jogadora de basquete, e, com o duplo suicídio cometido por seus pais – por causa da vergonha por uma falsa acusação de homicídio -, é a única responsável pelo seu irmão caçula, Yu Hyuga (Ryôsuke Kawamura). Mas se Ami leva uma vida tranquila com suas amigas, Yu tem seus próprios problemas com os valentões liderados pelo filho de um chefão da Yakuza, Sho Kimura (Nobuhiro Nishihara).

A gangue de Sho é absolutamente odiável, pois, por serem filhos de pais ricos, eles não precisam do “pedágio” que lhe é cobrado todo dia, pegando o dinheiro somente para queimar depois na frente do humilhado Yu e de seu amigo Takeshi. Sempre raivoso, contudo impotente para dar o troco, o jovem escreve em seu diário os nomes dos seus antagonistas, crente de que um dia juntará forças para devolver com juros toda a humilhação que sofre.

Enquanto isso, Sho aprende a ser impiedoso como o pai, Ryuji Kimura (Kentaro Shimazu) e a mãe, Violet Kimura (Honoka), sempre seguindo os ensinamentos do clã de Hattori Hanzo e o uso de sua sempre afiada espada katana. Para ter uma noção, os Kimura são tão cruéis que matam os empregados ao menor sinal de incompetência – e se não matam, torturam por motivos torpes, como o cozinheiro que é forçado a comer seus dedos decepados como sushis depois de derrubar macarrão no colo de Sho.

Em um dia antes da aula, Yu e Takeshi tentam fugir da gangue e acabam encurralados por Sho em um prédio abandonado. Ami vê a correria e corre atrás para ajudar o irmão, mas é surpreendida por um grupo de vagabundos que tentam estuprá-la. Enquanto Ami está na briga para se livrar dos estupradores, Yu e Takeshi reagem contra os valentões e são jogados do alto do prédio morrendo na hora.

Muito abalada com a perda, Ami vai ao encontro dos pais de Takeshi, Miki (Asami, mais conhecida por seus filmes eróticos softcore) e Suguru Sugihara (Yûya Ishikawa, de Noriko´s Dinner Table, continuação de Suicide Club), para dar as condolências e pedir ajuda, pois a polícia fechou o caso considerando-o como suicídio. Contudo, a garota piamente acredita que foi um caso de assassinato. Miki considera Yu como má influência para o filho e atribui a isto sua morte, expulsando a garota de sua oficina mecânica.

Ami volta para casa e encontra o diário do irmão com os nomes dos membros da gangue e, no dia seguinte, parte numa cruzada solitária para pedir satisfação com os pais dos garotos, que se demonstram tão (ou até mais) malucos do que seus filhos. A saga por vingança começa bem, todavia ao entrar na residência dos Kimura é subjugada pela técnica de Ryuji e é capturada para uma sessão de torturas que culmina com o desmembramento do braço esquerdo da garota. Impressionado com a força de vontade da colegial, o patriarca da família Kimura deixa a garota viver por mais um dia, o que é suficiente para fazê-la fugir na manhã seguinte.

Sangrando aos borbotões e sem ter para onde ir, Ami recorre novamente os pais de Takeshi. Todavia desta vez eles a recebem para tratá-la. Depois de ouvir a história sobre o que aconteceu de verdade com seu filho, Suguru desenvolve uma metralhadora super-poderosa para ser acoplada ao antebraço da garota para que finalmente consigam sua desforra contra os valentões – não sem antes passar por aquele “árduo treinamento“, claro.

No entanto os membros da Yakuza não ficarão parados esperando pela chegada de Ami e ela ainda terá de enfrentar a “liga dos ninjas mirins“, o “sutiã-furadeira” de Violet e “a gangue dos pais entristecidos” em batalhas memoráveis, inventivas, épicas e violentíssimas que lembram muito o esquema de fases e chefes dos videogames.

Primeiramente, Noboru Iguchi, minhas palmas de pé para você! Pouquíssimos filmes me deixaram empolgados com tanto fervor e foram tecnicamente esplêndidos como acontece com The Machine Girl: o trabalho de câmera é fantástico, o ritmo é vertiginoso e adequado para a proposta do filme, não existem pontos mortos e, principalmente, a ação não é quebrada sem uma boa justificativa.

Qualidades estas que ressaltam a principal característica importante para o fã de horror, a violência desmedida e desenfreada. Recordam-se da luta de Uma Thurman contra os Crazy 88 em Kill Bill? A profusão de sangue aqui é igualmente grandiosa, contudo não fica reservada a uma única cena, está em praticamente cada frame dos 96 minutos de duração! São cortes, tiros, queimaduras, traumas… Tudo on-screen e embalado pela estimulante trilha sonora de Takashi Nakagawa. E são sequências tão exageradas (algumas vezes até caricatas) que causam risos e náuseas na mesma frequência.

Falando em Tarantino, muitos críticos por aí estão comparando esta produção com Planeta Terror, de Robert Rodriguez. A comparação é válida, porém desleal. Tenho uma grande afeição com a metade de Grindhouse dirigida por Rodriguez, mas em minha opinião The Machine Girl ganha por uma cabeça.

O exército de Amy é realmente de uma mulher só (ou duas se somarmos a mãe de Takeshi) e o senso de misericórdia da garota foi literalmente pro vinagre. Só pela cena em que Ami esfaqueia o rosto da mãe de um dos valentões enquanto ela olha para a cabeça do filho decepada dentro de uma panela de sopa, já é suficiente para colocar Rose McGowan no saco. Aliás, desafio o infernauta a assistir apenas a abertura. Se ela não te fizer ter vontade de assistir ao resto do filme, faça um exame psiquiátrico imediatamente.

Obviamente a película não seria tão bem sucedida se o elenco fosse inapto; Minase Yashiro é a protagonista perfeita para este filme. Ela é linda e meiga, só que quando o bicho pega consegue transmitir um sentimento de fúria e ser altamente perigosa. Os demais são igualmente talentosos e um pouco exacerbados, com personagens bem definidos e tão diferentes entre si – tanto no físico quanto na personalidade – que reforçam ainda mais a vontade de se criar algo o mais próximo dos mangás quanto possível.

Se há um defeito no filme são alguns efeitos em CGI que não convencem e transpira até um pouco de amadorismo – às vezes dá até pra ver o braço esquerdo da garota escondido debaixo das roupas – nada contudo que prejudique o tamanho da diversão no conjunto e no bom trabalho do técnico de efeitos Yoshihiro Nishimura (Tokyo Gore Police). Alguns podem até alegar um pouco da falta de originalidade no roteiro, só que precisaria ser muito mal humorado para castigar Noboru Iguchi por criar algo tão impressionante com um roteiro aparentemente tão banal, convencional e submerso em clichês. Ou você acha que os mangás também precisam ser sempre diferentes um dos outros para serem plenamente apreciados? Até porque The Machine Girl é rodado todo sobre a ação e em função dela somente, regado a sangue e aplicando um afiado senso de humor.

No entanto nada mais posso dizer a não ser recomendar fortemente uma audição, de preferência com uma agradável roda de amigos. Porque, como muitos em sua categoria, descrever The Machine Girl é como descrever pornografia – se trata de uma experiência visual jogada na cara do espectador e que as palavras não conseguem traduzir com justiça. Noboru Iguchi sujou minha casa de vermelho e me ganhou com este filme.

Para finalizar, fico feliz que The Machine Girl pontua a excelente safra do cinema japonês – através de produções insanas e desbocadas como Tokyo Gore Police, High School Girl, Rika: Zombie Hunter e Karaoke Terror – que vinha perdendo espaço para os tailandeses e coreanos na época. Agora estes filmes só faltam ser lançados oficialmente no Brasil… Mas esta é uma outra história…de ódio e terror.

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