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O som da motosserra perturba tanto quanto imaginar suas lâminas quentes rasgando nosso tecidos, músculos e ossos. Mas, sem dúvida, ela soou melhor e causou mais aflição no Texas de 1974, quando Tobe Hooper concebeu o absoluto O Massacre da Serra Elétrica, na apresentação do horror experimentado por Sally (Marilyn Burns), Franklin (Paul A. Partain), Jerry (Allen Danziger), Pam (Teri McMinn) e Kirk (William Vail). Depois vieram continuações e spin-offs, cópias e homenagens, sem que haja qualquer razão para uma releitura. Contudo, Michael Bay, através de sua Platinum Dunes, imaginou que poderiam retornar ao deserto, aos ganchos que prendem carne e uma família que comercializa partes de corpos humanos.

Diretor até então de videoclipes, Marcus Nispel não via razão para a realização de uma refilmagem, mas aceitou quando soube que a produção teria uma familiaridade muito próxima do original – fotografia de Daniel Pearl, produção de Tobe Hooper e Kim Henkel e narração de John Larroquette -, e apresentaria um filme completamente novo, resgatando apenas algumas cenas de 74. O roteiro ficou sob a responsabilidade de Scott Kosar, iniciante na função, e poderia fazer referências, desde que tenha vida própria. O Massacre da Serra Elétrica estreou nos cinemas lá fora em outubro de 2003 – chegando ao Brasil apenas em 2005, sendo uma das produções que fizeram a festa dos piratas digitais – e, apesar da ótima bilheteria, foi estraçalhado pela motosserra dos críticos. “Um filme sem alma“, “desnecessário” e “desprezível” foram alguns dos adjetivos que rondaram resenhas diversas, sem que realmente represente o que foi levado às telas.

Antes de qualquer avanço nesta revisão, é preciso que eu faça uma confissão: durante anos, eu fui um dos principais detratores do longa original. Dizia em fóruns do Yahoo e no Orkut o quanto não via nada de tão absoluto no filme original. Achava mal realizado, feito de maneira amadora, apontando algumas atuações exageradas e a sua essência “exploitation“. Revisto diversas vezes anos depois, notei o quanto estava errado: os defeitos técnicos eram propositais com fins de evidenciar seu estilo documental, cru e real. O posicionamento inteligente das câmeras de Hooper, a fotografia granulada e escura, o som seco e cortante estavam ali para criar um visual sujo como o de um pesadelo, um passeio pelo deserto que transpira a dor de seus personagens. E boa parte dessa minha rendição se deve ao filme de Marcus Nispel.

Não o acho ruim, apenas desnecessário. Poderiam ter explorado um terror explícito no deserto do Texas, entre um velho moinho e a moradia da morte, como se fosse um outro grupo de jovens passando pelo local. Respeitaria o que foi anteriormente feito, e apresentaria um dia seguinte ao inferno de Sally, mostrando até mesmo sua fuga na cena final do clássico. Assim, na comparação com o trabalho de Hooper, notam-se personagens bonitos, jovens que só se preocupam com sexo e drogas, no estereótipo que o longa original fez questão de deixar de lado. A imagem colorida, a pouca ousadia de seus assassinatos, as trivialidades que saltam aos olhos realmente diminuem a força narrativa. Mas, diverte como um bom survival horror, sem a necessidade de recriar momentos antológicos como a cena do jantar canibal.

Diferente do original que trazia jovens em uma van indo visitar o túmulo do avô de Sally e Franklin, no remake, ambientado também em 18 de agosto de 1973, cinco amigos – Erin (Jessica Biel), seu namorado Kemper (Eric Balfour), além de Morgan (Jonathan Tucker), Andy (Mike Vogel) e Pepper (Erica Leerhsen) – estão viajando para um show depois de visitar o México para comprar maconha. Erin é o estilo final girl dos slasher movies, não usando drogas e sempre agindo com responsabilidade; é o oposto dos demais, principalmente Kemper. Ela e Pepper decidem ajudar uma mocinha perdida na estrada, atônita, dizendo frases desconexas, querendo apenas voltar para casa. Quando a jovem percebe que está retornando ao local de seus horrores, ela tira de debaixo da saia um revólver e estoura a própria cabeça, com a câmera de Nispel fazendo um travelling pelo buraco da bala até estacionar do lado de fora do veículo.

Sem saber como agir com o cadáver no carro, em desespero, resolvem buscar ajuda em uma loja de conveniência, cuidada por Luda Mae (Mamie Meek), que faz uma ligação para o xerife Hoyt (R. Lee Ermey, lembrando seu personagem em Nascido para Matar, 1987), que pede que os jovens esperem no Moinho Crawford. No local, conhecem o estranho garoto Jedidiah (David Dorfman, de O Chamado, 2002), enquanto Erin e Kemper resolvem se aventurar pela região até alcançar uma residência grande, onde encontram Monty (Terrence Evans), um homem sem as pernas, que permite que Erin faça uma ligação para a polícia. Enquanto ela telefona, Kemper adentra a moradia, observa os sinistros móveis e evidências de partes de corpos, além de animais soltos no interior, até receber uma marretada na cabeça pelo gigantesco Leatherface (Andrew Bryniarski), lembrando com mais agressividade a morte de Kirk no original.

O xerife chega ao moinho, já apresentando traços de insanidade ao pedir que Morgan, Andy e Pepper o ajudem a enrolar o corpo da caronista em um saco plástico e colocá-lo no veículo. Erin retorna sem saber do destino de Kemper, e o grupo vistoria veículos abandonados no local, encontrando objetos até mesmo da garota morta. Andy e Erin retornam à casa e tentam enganar Monty para procurar o amigo, momento em que ambos conhecem o “homem mau“, apontado pela jovem carona, com a apresentação de sua motosserra. A perseguição traça o destino do rapaz, enquanto Erin retorna aos amigos, no momento em que o xerife também reaparece para promover sequências de um horror psicológico, principalmente com Morgan, obrigado a recriar a ação da suicida.

Como se percebe, o longa é bem dinâmico e vai destilando sua violência de maneira bem gradual. O xerife parece permitir a saída dos jovens a todo momento, sem nunca deixar claro em que momento os pneus foram soltos e por quem. Leatherface alcançará o moinho, e Erin terá que buscar ajuda em um trailer habitado pela “moça do chá” (Kathy Lamkin) e a doida Henrietta (Heather Kafka), e será atirada nos porões da casa grande onde verá os amigos quase mortos e terá a ajuda de Jedidiah. O último ato é um confronto de gato e rato por vários ambientes, incluindo um matadouro, até culminar numa jogada interessante do enredo, na tentativa de fuga de Erin.

O Massacre da Serra Elétrica apresenta boas cenas de suspense, quando os personagens precisam se esconder de Leatherface em armários curtos, com a ameaça do grandalhão. A imposição física do ator promove uma sensação desconfortável de fragilidade, ampliando com o manuseio de sua motosserra. Ainda que Jessica Biel não transmita a mesma agonia de Marilyn Burns, até pela própria proposta de enfrentamento, sua personagem permite que o espectador se preocupe com o seu destino pelo carisma de garota boazinha e que sonha em se casar com o namorado. Partem dela algumas ações de impedir que os jovens abandonem o cadáver da garota ou que Morgan não tente atirar no xerife, assim como o resgate do bebê que não pertence a Henrietta.

Visto como uma produção à parte, distante da atmosfera do original, posso reafirmar que O Massacre da Serra Elétrica é um bom derivado do clássico. Se comparar com outros remakes lançados nos anos seguintes, como Horror em Amityville, Halloween (2007), Sexta-Feira 13 e A Hora do Pesadelo, é o que apresentou um melhor trato e respeito ao original – sem mencionar a refilmagem de Hellraiser, lançada anos depois. Vale a pena mais uma volta ao Texas com esse grupo de jovens, mesmo que o inferno deles seja mais atenuante que o de 74.

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