Em comemoração dos 24 anos do Boca do Inferno, o editor Marcelo Milici desafiou seus colaboradores a elaborar uma lista dos 24 filmes que consideram mais marcantes em sua vida. Abaixo segue a de Iam Godoy, crítico do site, em um cardápio de produções clássicas, divertidas e essenciais!
01 – O Massacre da Serra Elétrica (The Texas Chainsaw Massacre, Tobe Hooper – 1974)
Cru e sujo, o filme foi produzido como se fosse baseado numa história real e os minutos iniciais mostram isso com maestria onde policiais registram os assassinatos com o som assustador de uma máquina fotográfica de fundo que me atormenta até hoje. E por falar em tormento, a produção do filme foi um verdadeiro pesadelo para todos os membros da equipe. Marilyn Burns acidentou-se ao pular uma janela, Gunnar Hansen teve que utilizar a mesma camiseta durante quatro semanas para evitar erros de continuidade e Ed Neal, que interpreta o caroneiro, disse que nem sua experiência no Vietnã foi tão traumatizadora quanto a cena do almoço canibal…
02 – A Volta dos Mortos-Vivos (The Return of the Living Dead, Dan O’Bannon – 1985)
Um dos primeiros filmes onde zumbis podrões, além de falarem e terem certo raciocínio lógico, tomam o lugar dos reais protagonistas da trama. Humor, gore absoluto, música punk e Linnea Quigley tornaram este filme um mantra absoluto na minha formação cinéfila. Algumas curiosidades bizarras também marcaram a produção deste filme: os figurantes que interpretaram os zumbis receberam bônus para comer cérebros de bezerros reais no filme, Linnea Quigley viciou-se em Valium durante as filmagens, Ernie Kaltenbrunner (o agente funerário interpretado por Don Calfa), carregava uma foto de Eva Braun na carteira e a música que escuta no walkman durante um embalsamento é da unidade alemã Deutsches Afrikakorps, “Panzer rollen in Afrika vor“. Anos depois Brian Richard Peck (que interpretou Scuz) foi preso por pedofilia após denúncias feitas por membros da equipe da Nickelodeon e Disney Channel.

03 – Um Lobisomem Americano em Londres (An American Werewolf in London, John Landis – 1981)
A majestade dos filmes de lobisomem. Além de extremamente violento, sua veia cômica é a cereja do bolo e ainda traz a melhor cena de transformação licantrópica de todos os tempos e reza a lenda que o mestre da maquiagem Rick Baker usou seu cachorro Bosko para definir o visual do lobisomem. Outra curiosidade interessante é que os executivos da Universal Pictures queriam que Dan Aykroyd interpretasse David e John Belushi o personagem Jack. Foi o diretor John Landis quem vetou a presença de ambos e o próprio faz uma pontinha no final do filme, quando é atingido por um carro e atirado contra um vidro em Piccadilly Circus.
04 – A Morte do Demônio (The Evil Dead, Sam Raimi – 1981)
Um grupo de jovens vai passar as férias numa cabana abandonada e liberam por acidente um mal ancestral. O filme inteiro é um espetáculo de horror, mas uma das cenas que mais me marcou é onde Cheryl Williams (Ellen Sandweiss) está de costas adivinhando as cartas do baralho. Os “deadites” não foram os reais vilões do filme e sim a falta de verba; sem dinheiro a equipe foi reduzida drasticamente levando Sam Raimi, Robert Tapert e Bruce Campbell a dormir na cabana alugada para o filme. O local era muito frio e não possuía água encanada, e Sam Raimi teve que lavar as mãos (sujas com o sangue cenográfico) com café, pois era a única coisa líquida e quente naquele lugar.
05 – Mensageiro de Satanás (Evilspeak, Eric Weston – 1981)
Evilspeak acompanha um cadete da academia militar que está tendo dificuldades para se entrosar com os outros cadetes e vive sofrendo bullying. Como resultado acaba por invocar o capiroto utilizando o computador de Noé. Apesar de ser uma produção muito vagabunda, Evilspeak consegue promover o horror satânico de um jeito que ninguém teve coragem de realizar até o momento. Um fato engraçado na produção foi sobre uma das cabeças protéticas. Extremamente resistente para a cena a qual foi projetada, ela simplesmente ricocheteou quando o possuído Stanley (interpretado por Clint Howard) a golpeou. Frustrado, ele encontrou uma grande marreta e passou algum tempo praticando o movimento até que o peso adicional fez com que empunhar a espada parecesse fácil em comparação, e quando a cena foi filmada novamente, finalmente removeu a maldita.
06 – O Anticristo (L’anticristo, Alberto De Martino – 1974)
Voltando à capetagem, L’anticristo (também conhecido como The Tempter) é um filme italiano que pegou carona no clássico O Exorcista. O que o difere do filme de William Friedkin é a apresentação gráfica das blasfêmias, que vem de santas católicas com pênis de animais acoplados e a melhor representação de Missa Negra da história dos filmes de exorcismo. Carla Gravina entrega uma interpretação que, mesmo beirando o camp, consegue deixar o espectador com aquele gosto amargo e repulsivo na boca. Entrevistada pela revista “Blanco y Negro” em 1974, Carla Gravina revelou que interpretar Ippolita Oderisi afetou negativamente sua saúde. A atriz temia as origens da doença (que acreditava ter causas demoníacas), mas os médicos diagnosticaram isso ao excesso de trabalho ou a curiosas influências psíquicas.
07 – A Noite dos Arrepios (Night of the Creeps, Fred Dekker – 1986)
Uma bagunça maravilhosa dos anos 80. Começa como uma ficção científica, vira um filme adolescente e termina com uma invasão zumbi. Fred Dekker soube usar muito bem a atmosfera divertida dos filmes estudantis com a violência gráfica dos filmes de monstro, além de encher os fãs do gênero com diversas homenagens. Todos os sobrenomes dos personagens principais são baseados em famosos diretores de terror e ficção científica: Chris Romero (George A. Romero), James Carpenter Hooper (John Carpenter e Tobe Hooper), Cynthia Cronenberg (David Cronenberg), os detetives Cameron e Landis (James Cameron e John Landis), o Sargento Raimi (Sam Raimi) e o zelador Sr. Miner (Steve Miner).
08 – Exorcismo Negro (homônimo, José Mojica Marins – 1974)
Um clássico do cinema de horror nacional. Apesar de conhecido por sua persona, Mojica Marins nos apresenta aqui uma batalha metalinguística do Bem contra o Mal onde o diretor José Mojica Marins luta com seu pior “inimigo“: o Zé do Caixão. O ritmo de Exorcismo Negro é perfeito, o que era um problema recorrente em alguns filmes anteriores de Mojica, e a continuidade é um trunfo deste longa. A narrativa consegue manter a adesão e a tensão, assustando com eficácia o espectador.
No lançamento do longa, Mojica fica putaço com a “comparação” de seu filme com o clássico O Exorcista. “Renego as críticas ao meu filme como sendo uma tentativa de aproveitar a onda da história americana”, disse. “Minha história foi escrita bem antes, só não fora filmada.”
09 – Hell’s Ground (Zibahkhana, Omar Khan – 2007)
Zibahkhana é uma produção independente anunciada como “o primeiro filme de terror extremo do Paquistão”. Combinando clássicos conhecidos com o Massacre da Serra Elétrica e A Noite dos Mortos-Vivos com abundantes referências ao cinema de terror e de ação paquistanês, Hell’s Ground enfatiza em sua trama questões de classe social, ideologias conflitantes do Islã, globalização e saneamento público. Zibahkhana é uma peça única do universo slasher – não possui uma cena de nudez sequer. O site Quarter to Three escreveu o seguinte: “Não sei se isso é um fator da cultura jovem paquistanesa ou sobre o que é aceitável em filmes paquistaneses, mas o sexo é uma omissão notável na fórmula do filme. E não me refiro apenas à nudez. Quando os dois protagonistas, que supostamente têm inclinações românticas um pelo outro, estão sozinhos, é tudo tão casto quanto Macaulay Culkin e Anna Chlumsky em Meu Primeiro Amor“.
10 – O Enigma de Outro Mundo (The Thing, John Carpenter – 1982)
The Thing é uma excelência do “body horror“. Baseado em Who Goes There? (uma novela de John W. Campbell Jr. escrita 1938 e que teve como predecessor cinematográfico, O Monstro do Ártico, de 1951) o filme nos apresenta uma avalanche de horror alienígena onde trabalhadores do ártico lutam para manter uma ameaça monstruosa longe das grandes cidades. Mesmo duramente criticado na época de seu lançamento, John Carpenter e Rob Bottin foram responsáveis por criar os maiores pesadelos do cinema de gênero.
11 – A Hora do Pesadelo (The Nightmare On Elm Street, Wes Craven – 1984)
O que falar do meu serial killer favorito dos slashers? The Nightmare On Elm Street nos apresenta um dos únicos (se não o único!) assassino sobrenatural que ataca suas vítimas no único lugar onde não se pode correr…o mundo dos sonhos. Wes Craven nos proporciona momentos aterradores sob a forma de Freddy Krueger. As cores clássicas do suéter eternizado de Freddy, de acordo com a revista americana Scientific American, tem explicação científica. O olho humano tem dificuldade em reconhecer esses tons de verde e vermelho quando colocados lado a lado e Wes utilizou esta informação para a criação do personagem.

12 – Sexta-Feira 13 (Friday the 13th, Sean S. Cunningham – 1980)
Friday the 13th tinha tudo pra ser o maior fiasco do cinema, mas entregou um dos maiores plot twist do gênero. O que (talvez!) alguns não saibam é que Jason nunca deveria ter existido no roteiro original, só foi utilizar a tão conhecida máscara de hóquei no terceiro filme (1983) e que lançou uma fake news em Sexta-Feira 13: Um Novo Começo (1985) onde poucos repararam nos detalhes azuis da máscara do nosso “menino do rio“.
13 – Hellraiser: Renascido do Inferno (Hellraiser, Clive Barker – 1987)
Hellraiser foi um divisor de águas no quesito fetiches/horror. Clive Barker baseou seus cenobitas na cultura punk, no catolicismo e em visitas a clubes de sadomasoquismo em Nova York e Amsterdã enquanto a figurinista Jane Wildgoose criava as roupas das criaturas no estilo que o próprio criador define como “glamour repulsivo“.
14 – Alien, O Oitavo Passageiro (Alien, Ridley Scott – 1979)
Ainda me assusta a capacidade criativa da equipe do filme Alien. Apavorar o mundo do cinema com criaturas tão bem construídas para a época é um grande feito que persiste até os dias atuais. O enredo também nos entrega uma claustrofobia extrema onde não se pode procurar ajuda no exterior e o inimigo pode estar mais próximo do que imagina…ah, e temos Jonesy!
Curiosidade mórbida: para dar um aspecto mais orgânico para o xenomorfo e seus ovos foram utilizados métodos bem inusitados: os ovos da criatura eram feitos com tecidos do coração e do estômago de bovinos e o “tubo” pelo qual os ovos saíam era um intestino de ovelha.
15 – O Vampiro da Noite (Horror of Dracula, Terence Fisher – 1958)
Agradeço por todo o glamour e goticismo apresentado por Bela Lugosi, mas pra mim Christopher Lee é o Drácula por excelência. Terence Fisher nos apresenta um vampiro mais visceral, com toda aquela pompa camp da Hammer e seu sangue de guache. Mas nem tudo foi glamouroso nesta “vampiragem“. Enquanto gravava a cena em que Dracula sepulta Mina, Christopher Lee escorregou (provavelmente por causa das lentes de contato que tiravam boa parte da visão) e caiu em cima da dublê.
16 – Fantasma (Phantasm, Don Coscarelli – 1979)
Phantasm é um dos mais originais e bizarros filmes de terror no fim dos anos 70, uma produção independente que fez sucesso por mesclar terror, fantasia e sci-fi. Coscarelli apresenta uma história única onde a humanidade está prestes a ser invadida por um exército extra-dimensional criado a partir de restos mortais pelo enigmático agente funerário Tall Man (eternizado por Angus Scrimm). Não é uma joia rara do gênero, mas trouxe personagens carismáticos como Reggie (Bannister) e os primos pobres da Configuração dos Lamentos de Hellraiser; as incríveis esferas mecânicas voadoras, criadas pelo “Homem Alto” e abastecidas com almas humanas.
17 – O Ataque dos Vermes Malditos (Tremors, Ron Underwood – 1990)
O gênero horror já abrigou dezenas de monstros ao longo da sua história, mas poucos são tão únicos quanto as criaturas protagonistas de Tremors. Os graboids (como são conhecidos na franquia) são gigantescos vermes subterrâneos que tocaram o terror na pequena cidade de Perfection, Nevada. Como curiosidade biológica (que não vai levar a nada), os Graboids passam por 3 estágios: os vermes convencionais que conhecemos, depois temos os Dirt Dragons, os Shriekers e o estágio final dos Graboids divertidamente chamado de Ass Blasters.
18 – Pague para Entrar, Reze para Sair (The Funhouse, Tobe Hooper – 1981)
Um filme que me traumatizou na pré-adolescência por semanas. Conhecido por sua atmosfera sombria e suspense claustrofóbico, Tobe Hooper soube catalisar toda a agonia e tensão de um slasher adolescente sem cair na mesmice do mesmo. Apesar de alongado em demasia a partir do segundo arco, o filme explode em adrenalina nos 25 minutos finais. Destaques para a prótese do “monstro“ Gunther Straker, criada por Rick Baker e interpretado por Wayne Doba e pela escolha da melhor tradução de título nacional já feita.

19 – Sem Aviso (Without Warning, Greydon Clark – 1980)
Without Warning (também conhecido como “It Came Without Warning“) é uma daquelas pérolas que só os anos 80 podiam oferecer e narra a história de uma entidade alienígena que vem à Terra para caçar humanos (onde foi que eu já vi isso antes?).O enredo é um pouco arrastado e mesmo lançado em 1980, tem aquele climão setentista. Jack Palance e Martin Landau brilham nesta produção, mas a verdadeira estrela do filme é o extravagante alienígena que usa “shurikens vivas” que parasitavam a caça. Os efeitos das criaturinhas foram projetados por Greg Cannom e a cabeça do alienígena foi projetada por Rick Baker por US$ 19.000.
20 – Trog, o Monstro das Cavernas (Trog, Freddie Francis – 1970)
Apesar de ser uma genuína bomba cinematográfica britânica, eu guardo ótimas lembranças familiares onde todos os irmãos deixavam de ser pentelhos uns com os outros, faziam baldes de pipoca e compravam litros de refrigerante para assistir filmes de terror. Como eu era um dos “pequenos” da família isso para mim era quase um ritual de passagem. Trog era uma bagunça sci-fi setentista onde uma antropóloga (interpretada por Joan Crawford, movida a vodka durante toda a produção) encontra um “elo perdido” da Idade do Gelo, meio homem das cavernas, meio macaco, interpretado pelo lutador profissional Joe Cornelius.
21 – Alligator: O Jacaré Gigante (Alligator, Lewis Teague – 1980)
Alligator se tornou o primeiro filme de terror a apresentar jacarés assassinos como antagonistas. A fera titular em si é uma mistura impressionante de um animatrônico surpreendentemente estruturado e um jacaré real chamado Morris. Ah, esqueci de acrescentar que o nome do jacaré animatrônico era Ramon. Após o lançamento do filme, Ramon foi doado aos Florida Gators (da Universidade da Flórida, em Gainesville), como mascote do time. Ramon fez várias aparições antes dos jogos e durante o intervalo.
22 – A Invasão das Rãs (Frogs, George McCowan – 1972)
George McCowan nos presenteou com um alopradíssimo eco-terror onde uma escrota família sulista é atacada por “rãs vingativas“. O mais curioso desta produção é que, mesmo sob o título de “Frogs“, as vítimas são atacadas por diversos animais diferentes como cobras, aranhas, musgo espanhol(?), lagartos, crocodilos, sanguessugas, tartarugas e (pasmem!) uma mariposa gigante…
Destaque para os créditos finais, onde um sapo (mal)animado aparece engolindo uma mão. Este mesmo sapo foi criticado por Clyde Gilmour, do The Toronto Star, que reclamou da ausência do “sapo gigante devorador de homens” anunciado no lançamento do filme.
23 – A Coisa (The Stuff, Larry Cohen – 1985)
The Stuff marca a imbecilidade do mundo consumista de uma forma medonha, porém bem humorada. Cohen citou como sua influência “a enorme quantidade de junk food que consumimos todos os dias. Continuamos a comer esses alimentos, apesar de alguns deles nos matarem“. Apesar de ser o primo pobre da Bolha Assassina, A Coisa não fica para trás quando se trata de chocar o público com mortes bizarras e melequentas.
24 – Baskin (homônimo, Can Evrenol – 2015)
Baskin é um pesadelo turco dirigido por Can Evrenol e baseado em seu curta-metragem homônimo de 2013. O filme gira em torno de cinco policiais que, inadvertidamente, acabam por encontrar um culto que pretende trazer o Inferno à Terra. Baskin foi comparado com os trabalhos de Lucio Fulci, não como um plágio ou uma homenagem de forma alguma, mas um herdeiro das mesmas filosofias (Shock Till You Drop).
Em uma entrevista à Fangoria, Evrenol disse:
“Nossas autorizações às vezes eram duvidosas, então ficávamos sempre estressados com a possibilidade de as autoridades descobrirem o que estávamos fazendo em alguns dos nossos locais malucos. Tínhamos pessoas nuas no set, nas áreas mais conservadoras da cidade. Era um estresse constante. Além disso, as limitações de tempo para certas cenas as tornavam realmente difíceis, e aquela única tomada subaquática nos custou quase metade de uma noite de filmagem”.