Piranha 2 - Assassinas Voadoras
Original:Piranha Part Two: The Spawning
Ano:1981•País:EUA, Itália, Holanda Direção:James Cameron, Ovidio G. Assonitis, Miller Drake Roteiro:James Cameron, Ovidio G. Assonitis, Charles H. Eglee Produção:Jeff Schechtman, Hisako Tsukuba Elenco:Tricia O'Neil, Steve Marachuk, Lance Henriksen, Ricky Paull Goldin, Carole Davis, Connie Lynn Hadden, Tracey Berg |
Poderia ser mais um filme da filmografia subaquática de James Cameron, se a participação do cineasta tivesse sido maior. Não que, por ser um filme com aspecto trash, Cameron não teria razões para estar atrás das câmeras, tendo em vista outros diretores que tiveram começos toscos e bizarros – não exatamente ruins: Peter Jackson (Trash – Náusea Total e Conheça os Feebles), Sam Raimi (Within the Woods), John Carpenter (Dark Star) e Wes Craven (Aniversário Macabro), só para citar alguns. O problema é que o futuro diretor de O Exterminador do Futuro (1984), Aliens, O Resgate (1986), O Segredo do Abismo (1989) e O Exterminador do Futuro 2: O Julgamento Final (1991) teve pouca voz ativa na produção, nenhum envolvimento na pós-produção, emprestando o nome aos créditos até ser demitido da função poucas semanas depois de ter sido contratado. A história dos bastidores já é um filme à parte.
Os produtores Jeff Schechtman e Chako van Leuwen tinham interesse em fazer uma continuação para o sucesso comercial de Joe Dante, Piranha (1978). Como não conseguiram envolver mais uma vez Roger Corman, que estava trabalhando no terror Criaturas das Profundezas (1980), deram início à produção a partir do material escrito por Charles H. Eglee e Channing Gibson, com o argumento a cargo de Martin B. Cohen, da New World Pictures. Dante também já estava envolvido com Grito de Horror (1981), mas “emprestou” Miller Drake, com quem havia trabalhado em trailers para a produtora, para assumir uma condução provisória, partindo, então, para o processo de financiamento do filme. Assim, selaram um acordo com o cineasta greco-italiano Ovidio G. Assonitis, diretor de várias bagaceiras vendidas ao mercado americano.
A ideia inicial permitia o retorno do cientista Dr. Robert Hoak (Kevin McCarthy), embora o personagem tenha morrido no primeiro filme. Mesmo deformado, Hoak estaria escondido numa plataforma de petróleo produzindo piranhas voadoras como vingança pelos acontecimentos do original. Até mesmo a excepcional Barbara Steele voltaria para um assassinato no começo da produção, com a cabeça enfiada em um tanque de peixes. Sem a disposição dos dois atores, relacionados a outros filmes, o roteiro precisou ser reescrito, quando, então, um certo James Cameron foi contratado para trabalhar nos efeitos especiais. Pouco antes do início das filmagens principais, Drake foi demitido, e Cameron assumiu assim a cadeira de diretor. Na verdade, os bastidores apontam uma outra razão para o debut de Cameron.
Assonitis conseguiu um acordo com a Warner Bros., que lhe rendeu o orçamento de US$500 mil dólares para produzir o filme, desde que um nome americano estivesse nos créditos como diretor – uma forma de atrair um mercado mais rentável. Com a dispensa de Drake por diferenças criativas, Cameron foi “empurrado” para a função. Em “Dreaming Aloud“, biografia de Cameron escrita por Christopher Heard, há o informe que o cineasta teria trabalhado apenas quatro dias no filme. Ajudou no roteiro, fez os efeitos especiais, acordos comerciais na locação e desenhou os storyboards. Assonitis não curtiu o envolvimento completo de Cameron, impedindo-o de acessar a sala de edição para assistir suas cenas e criticando algumas de suas decisões. Há até boatos que dizem que o diretor invadiu a tal sala para produzir sua própria versão, o que teria ocasionado a sua demissão no quinto dia. Não é à toa que James Cameron não indique esse filme como seu início como diretor; posteriormente sua versão do longa foi disponibilizada em DVD.
Essa dança das cadeiras e guerra ideológica atrapalharam o desenvolvimento de Piranhas 2: Assassinas Voadoras. Tem uma assinatura discreta de Cameron nas cenas subaquáticas, assim como se nota toques exploitation de nudez e problemas no ritmo e na edição. É um filme sangrento até, com bons efeitos especiais, mas com um enredo cheio de buracos, em que as tais piranhas invadem lugares isolados e distantes da água para fazer um lanchinho e depois retornam para seu abrigo em uma embarcação naufragada. Diferente de outras produções com animais aquáticos do período, esta parece até um slasher, que ainda estraga o que poderia ser um dos melhores momentos do filme, no ataque ao clube.
Começa com a morte de um casal de mergulhadores, Robert Haywood (Jim Pair) e Lisa (Jan Eisner Mannon), quando resolvem transar no interior da carcaça de um navio naufragado. Peitos e mãos escorregadias são interrompidos pelo ataque do cardume de piranhas, com o sangue jorrando sobre os créditos iniciais. Quando um dos corpos é descoberto pela instrutora de mergulho Anne Kimbrough (Tricia O’Neil), ela percebe que se trata de um aluno seu, precisando das investigações de seu ex-marido, o chefe de polícia Steve (Lance Henriksen). Curiosamente, a primeira aparição da moça causa uma situação incômoda: dormindo nua, ela é acordada pelo filho adolescente Chris (Ricky Paull Goldin), que traz à cama um peixe. Depois, durante o café da manhã, ele é visto em uma intimidade com ela que parece ir além de uma relação mãe e filho.
Aparecem outros personagens que estão na ilha, hospedados no resort costeiro Hotel Elysium, e que não servem para nada: uma moça que dá em cima de um dentista, uma senhora que fica tentando seduzir um outro hóspede, além de duas garotas, Loretta (Connie Lynn Hadden) e Jai (Carole Davis), o cozinheiro Mal (Arnie Ross) e um rico empresário (Ward White) e sua filha Allison (Leslie Graves, que faleceu em decorrência da AIDS) em um iate, com os serviços de Chris. Destacam-se entre os personagens secundários Tyler Sherman (Steve Marachuk), que fica dando em cima da instrutora até posteriormente revelar suas intenções, o pescador Gabby (Ancile Gloudon) e seu filho, e Raoul (Ted Richert), o dono do hotel, e que, no tradicional clichê, não quer perder dinheiro interrompendo os passeios de jetski, as brincadeiras na praia e nem as aulas de mergulho.
Quando o corpo de Richard é resgatado da água, uma piranha, escondida em seu corpo (!!!), ataca April (Dorothy Cunningham), responsável pelo necrotério, antes de fugir quebrando a janela. Outras pessoas serão vítimas dos animais, que depois será revelado que foram modificados geneticamente, misturando peixe-boi e mais espécies. Chris irá sumir em um barco com Allison na mesma noite em que Raoul irá promover um jogo com todos os hóspedes na captura dos grunions, promovendo a tal sequência que tinha tudo para ainda mais intensa com o grandioso ataque das piranhas voadoras. Preocupada com o filho, Anne irá se unir a Tyler, enquanto Steve fará uma procura de helicóptero, antes que uma bomba criada por Gabby destrua o abrigo das criaturas.
A comparação com um slasher se faz pelas sequências pausadas de ataque dos monstrinhos. Eles atacam e retornam para o barco naufragado – com a desculpa de que temem a luz -, embora não façam nada em situações cruciais, como no momento que Anne mergulha para investigar a moradia dos peixes. E os tais ataques são convenientes para a proposta slasher: fizeram sexo embaixo d’água? Potenciais vítimas. Tiraram sarro do cozinheiro? Serão alimentos das piranhas. Está atrapalhando um relacionamento conturbado? Dificilmente irá sobreviver.
Com seus clichês e humor bobo, Piranhas 2 só deve ser enaltecido pelos efeitos técnicos. Diverte pouco, ocupando grande parte da projeção no desenvolvimento das relações e investigação sobre as mortes, faltando sequências que deixem o espectador sem ar ou realmente preocupado com o destino dos personagens. Beira o trash pela proposta tosca, justificando toda a bagunça dos bastidores entre demissões e impedimentos. Anos depois, mesmo sem repetir o sucesso do primeiro filme, houve boatos sobre a realização de uma parte 3. Não aconteceu. As piranhas voltariam a ter seu filme solo em 2010, com o divertido Piranha, de Alexandre Aja, e com o improvável Piranha 2, de 2012, de John Gulager, ambos desenvolvidos com tecnologia 3D.
Existe ainda um remake do primeiro filme, feito em 1995 apenas para TV, que foi também o filme de estreia da atriz Mila Kunis.