A Vila dos Uivos (2019)

4.3
(14)

A Vila dos Uivos
Original:Inunaki mura
Ano:2019•País:Japão
Direção:Takashi Shimizu
Roteiro:Takashi Shimizu, Daisuke Hosaka
Produção:
Elenco:Daisuke Hosaka, Ryôta Bandô, Tsuyoshi Furukawa, Renji Ishibashi, Takamasa Suga, Megumi Okina, Masanobu Takashima

Takashi Shimizu tem intimidade com fantasmas perturbados. Entre o final dos anos 90 e o início do século, o cineasta colocou seu nome na galeria de diretores de horror ao idealizar a bem sucedida franquia Ju-On, envolvendo uma casa maldita e as entidades errantes Toshio e Kayako. Entre 2000 e 2003, já havia realizado quatro filmes na mesma ambientação, sendo depois “emprestado” para Hollywood, onde desenvolveu O Grito (2004) e a continuação O Grito 2 (2006), com uma passagem pela terra natal com o sobrenatural Almas Reencarnadas (2005). Por mais que tentasse se desvencilhar de seus trabalhos iniciais, com bombas como Shock Labyrinth (2009) e Voo 7500 (2014), ele demonstra estar à vontade para sempre visitar seus seres pálidos, depressivos com olhos esbugalhados numa lenta caminhada contorcionista, na composição de lendas urbanas da cultura japonesa.

Em 2019, ele deu o pontapé inicial da trilogia “Village of Terrors“, com o terror A Vila dos Uivos (Inunaki mura / Howling Village), que depois foi seguido por A Vila dos Suicídios (Jukai Mura / Suicide Forest Village, 2021) e, por fim, Vila do Medo (Ushikubi Village, 2022). Este primeiro tem como inspiração a Aldeia Inunaki, localizada na província de Fukuoka, nas proximidades do Monte Inunaki. Esse local de difícil acesso tem alimentado a imaginação assombrosa dos moradores com lendas urbanas sobre assassinato e desaparecimento desde a década de 90, embora existam relatos anteriores oriundos dos anos 70, como o do casal que teria visitado a vila e encontrado seu destino com um homem insano e sua foice. Com o informe, escrito à mão, “A constituição japonesa não está em vigor aqui“, os mistérios se expandiram com o acréscimo de uma cabine telefônica – quem atende a ligação é amaldiçoada a viver no vilarejo -, a “ponte vermelha” e o sombrio Old Inunaki Tunnel, construído em 1949. Material mais do que suficiente para atiçar a criatividade de Shimizu e do roteirista Daisuke Hosaka, aproveitando também o apelido da aldeia de “Vila Uivante“.

A jovem youtuber Akina (Rinka Otani) convenceu seu namorado Yuma (Ryôta Bandô) a desvendar os mistérios da tal vila, atendendo a ligação das 2h da manhã na cabine telefônica, atravessando a ponte e o túnel até encontrar casas simples de madeira, olhares pelos cantos e o rosnar de uma fera. Tempos depois, a garota se jogaria de uma antena, e o rapaz, enlouquecido, desapareceria no túnel em suas investigações pessoais. A irmã dele, a psicóloga Kanata Morita (Ayaka Miyoshi), envolve-se nesse pesadelo ao perceber uma relação direta com suas origens, depois de ser incomodada por mortos e aparições que a chamam de “matadora de cães“.

Um argumento básico para a composição de um longa de horror tradicional nas mãos de um cineasta comum. Não é o caso do experiente Takashi Shimizu, alguém que conhece bem o terreno no qual está pisando. Ele acrescenta diversos elementos que tornam o filme mais intrigante e interessante, como o garotinho Ryotaro (Akira Sasamoto), sempre acompanhado da mãe morta, o fato da vila ter sido submersa e as vítimas terem aparência de afogadas, entidades perdidas com o seu lamúrio incômodo, cadáveres destroçados e, claro, licantropia. O diretor enche seu filme de assombrações, colocando-as no caminho da psicóloga o tempo todo, seja na perseguição de seu veículo, atirando-se sobre o vidro dianteiro, no hospital, em casa… Qualquer personagem que morre durante a produção é visto posteriormente, como é o caso dos três amigos de Yuma, de Akina e até um idoso no hospital.

Se os subplots tornam o longa mais dinâmico e curioso, por outro são envoltos em muitos clichês. A passagem de Shimizu pela América do Norte também o fez tornar seu enredo extremamente didático, com exagerados flashbacks e explicações, quase servindo como uma ofensa ao espectador. A mais absurda de todas é a sequência em que um fantasma – UM FANTASMA – leva a protagonista até um local e projeta (!!!) um filme que conta a origem da vila e traz instruções sobre os próximos passos, quase como uma aula de História. Faltou apenas alguém mostrar à jovem uma maquete do vilarejo e – pasmem! – pior é que tem! O tal local desconhecido e de difícil acesso é ilustrado por uma criança em seu trabalho escolar!!

Contando com bons efeitos de maquiagem e especiais, A Vila dos Uivos é até interessante com seu carrossel de assombrações e curiosidades sobre uma lenda assustadora do folclore japonês. Shimizu volta a aterrorizar seus fãs, despertando maldições e mortos-vivos. Alguns acertos aqui e ali e o longa poderia figurar com mais destaque em sua filmografia de fantasmas perturbados.

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Marcelo Milici

Professor e crítico de cinema há vinte anos, fundou o site Boca do Inferno, uma das principais referências do gênero fantástico no Brasil. Foi colunista do site Omelete, articulista da revista Amazing e jurado dos festivais Cinefantasy, Espantomania, SP Terror e do sarau da Casa das Rosas. Possui publicações em diversas antologias como “Terra Morta”, Arquivos do Mal”, “Galáxias Ocultas”, “A Hora Morta” e “Insanidade”, além de composições poéticas no livro “A Sociedade dos Poetas Vivos”. É um dos autores da enciclopédia “Medo de Palhaço”, lançado pela editora Évora.

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