Anaconda (1997)

4.9
(7)

Anaconda
Original:Anaconda
Ano:1997•País:EUA, Brasil, Peru
Direção:Luis Llosa
Roteiro:Jack Epps Jr., Jim Cash, Hans Bauer
Produção:Verna Harrah, Carole Little, Leonard Rabinowitz
Elenco:Jennifer Lopez, Ice Cube, Jon Voight, Eric Stoltz, Jonathan Hyde, Owen Wilson, Kari Wuhrer, Vincent Castellanos, Danny Trejo, Frank Welker

Está demorando para Anaconda finalmente se tornar uma produção cult. Desde seu lançamento, em 1997, apesar do sucesso de bilheteria e de ter arrecadado mais de US$130 milhões de dólares, o filme ainda é considerado ruim, um percalço na carreira dos envolvidos. Tem um elenco de rostos conhecidos – alguns viriam a se tornar estrelas logo depois -, atuações canastronas, bons efeitos especiais e uma ótima ambientação, mas gostar de Anaconda é ter que assumi-lo como um “guilty pleasure“, aquelas produções que você se sente até culpado por ver mais de uma vez. Independente de sua avaliação pessoal, o filme da cobra gigante teve uma importância significativa para a construção do subgênero “trash moderno“, gerando uma série de produções similares e genéricas, além de continuações e até crossover.

Analisando pelo quesito “guilty pleasure“, Anaconda é um filme que veste uma roupagem do cinema B, mas quer ser mais do que isso. Uma cobra gigante no Rio Amazonas, com todos os personagens falando inglês ou arriscando um castelhano, e um vilão de filmes de ação com caras e bocas no elenco… se isso não promove pelo menos diversão, então merece premiações pela ruindade. Assim, em 1998, o filme foi indicado a seis Razzie Awards, incluindo Pior Filme, Pior Diretor, Pior Roteiro e Pior Ator (Kevin Costner conquistou os quatro por O Mensageiro), além das categorias Worst New Star (a anaconda animatrônica que grita perdeu para Dennis Rodman, de A Colônia) e Pior Casal de Tela (Jon Voight e a cobra perderam para Rodman e Jean-Claude Van Damme). No entanto, ganhou dois Stinkers Awards: Pior Ator Coadjuvante e Pior Sotaque Falso ambos para Jon Voight. Curiosamente, o filme também concorreu a dois Saturn Awards, incluindo Melhor Atriz (Jennifer Lopez perdeu para Jodie Foster por Contato) e Melhor Filme de Terror (que foi merecidamente para O Advogado do Diabo).

Já em relação à importância, Anaconda teve muitas crias cinematográficas, sendo que o filme já vinha com inspirações anteriores. Só para exemplificar, depois do longa de Luis Llosa, vieram tranqueiras como King Cobra (1999), Python – A Cobra Assassina (2000), Terror em Alcatraz / Boa (2001), Python 2 (2002), Cobras (2002), Boa vs. Python: As Predadoras (2004), Anaconda 2: A Caçada pela Orquídea Selvagem (2004), Anaconda 3 (2008), Anaconda 4 (2009), Mega Python vs. Gatoroid (2011), Pânico no Lago: Projeto Anaconda (2015), The Python (2021), Snakes 2 (2022), Python Island (2022), sem contar Serpentes a Bordo (2006) e Pânico a Bordo (2006). E se não achou essas produções ofídicas absurdas, saiba que está em desenvolvimento um Amityville Anaconda – uma brincadeira que começou depois que foram anunciados concomitantemente remakes de Terror em Amityville e Anaconda, possivelmente dirigidos por Lee Cronin e Tom Gormican respectivamente.

Ah, mas sendo importante ou não, o filme é ruim!” Depende do que se espera numa revisão depois de 27 anos! Vejamos… o filme começa com a morte de um caçador solitário, interpretado por Danny Trejo (de Um Drink no Inferno e Machete). Perseguido em sua embarcação, com sua atuação ruim de sempre, ele encontra seu destino no mastro, dando cabo de si mesmo com um revólver. Tempos depois, um grupo de documentaristas está prestes a embarcar numa expedição pelo Rio Amazonas em busca da tribo perdida dos Shirishamas: o filme em desenvolvimento terá a direção de Terri Flores (Jennifer Lopez), a narração de Warren Westridge (Jonathan Hyde), com o apoio do cinegrafista Danny Rich (Ice Cube), da gerente de produção Denise Kalberg (Kari Wuhrer), que namora o engenheiro de som Gary Dixon (Owen Wilson), e do antropólogo Dr. Steven Cale (Eric Stoltz). Poderia ser um found footage, se esse filme fosse feito após A Bruxa de Blair (The Blair Witch Project, 1999).

Conduzidos pelo capitão Mateo (Vincent Castellanos), logo eles encontram pelo caminho um homem desesperado, pedindo ajuda em seu barco encalhado. Trata-se do paraguaio Paul Serone (Jon Voight), um caçador de cobras que irá tornar a viagem bastante complicada quando apresentar suas verdadeiras intenções. Quando o barco fica encalhado depois que uma corda se prende à hélice, Steven Cale mergulha para abrir caminho e engole uma vespa, tendo uma reação alérgica que o faz inchar a ponto de necessitar de uma cricotireotomia para poder respirar. Serone sugere uma rota para levá-lo ao hospital, mas na verdade conduz todos para um percurso no habitat de cobras gigantes como a do título.

Até lá, as cobras serão vistas devorando macacos e até uma pantera, enquanto sinais deixarão evidentes de que podem estar indo para o lado errado: um totem em forma de serpente é encontrado, assim como uma barreira colocada para proteger navegantes. Eles enfrentam um javali, e alcançam o barco do caçador do começo, onde é possível ver uma reportagem com Mateo, Serone e a primeira vítima, mostrando que eles são caçadores de sucuri-verdes, as tais anacondas. A desconfiança sobre as atitudes de Serone começa a ficar mais intensa depois que Mateo desaparece e ele demonstra pouco se importar. Logo a anaconda irá finalmente assumir o antagonismo, e eles não terão como evitar o confronto, tendo a bordo um caçador experiente e ameaçador.

Entre uma cachoeira que é vista com a água subindo – um dos erros clássicos da produção como uma janela que se quebra e aparece intacta -, há alguns bons momentos envolvendo os ataques da cobra gigante, com destaque para a cena em que Westridge é envolvido pelo animal quando tenta escapar saltando de um pequeno abismo. E há também cenas de confronto com Serone, ora preso, ora prendendo alguém, com direito a discurso de vilão dos quadrinhos antes da chegada da predadora. A atuação de Jon Voight é realmente horrível, com seu olhar malicioso e sotaque ruim; já Jennifer Lopez, em carreira avançada como atriz, saiu-se muito bem como a mocinha preocupada com sua equipe e também com a natureza.

Porém, o grande chamariz da produção são os efeitos especiais. Além de usarem animatronics, algo em decadência no cinema, os efeitos digitais são até bem realizados. Os gritos da cobra são desnecessários, mas toda a sua movimentação e seus ataques garantem o entretenimento. É claro que o roteiro, de Jack Epps Jr., Jim Cash e Hans Bauer, é repleto de falhas, seja por permitir a antecipação dos acontecimentos, seja por eliminar alguém do elenco e ninguém sentir falta (Denise Kalberg), ou pela forma como se organiza em uma estrutura convencional: ataque inicial + apresentação dos personagens + apresentação do vilão + ataques da cobra + diminuição do elenco, com o vilão ficando para o final no confronto com a mocinha. E pode até incluir o tradicional susto final, quando a cobra ainda promove um último ataque, após ter aparentemente morrido. É claro que você, em poucos minutos, saberá quem irá restar no final, e até algumas situações, como a de um personagem que trai o grupo por ganância.

Revendo como cinema-entretenimento, Anaconda se sai bem no subgênero “homem vs. natureza“: há tensão, uma criatura voraz e personagens que, ainda que sem profundidade, possuem um certo carisma. Contudo, aqueles que esperam algo além disso como um enredo redondinho – como alguém pode esperar isso de um filme chamado Anaconda? -, atuações consideráveis e sequências de suspense de roer as unhas, vão continuar colocando-o na gaveta das produções ruins do gênero, evitando que possa ser cultuado como Filme B, importante e divertido.

O que aconteceu com quem lutou com a primeira anaconda?

Já com uma carreira sólida como atriz e cantora, Jennifer Lopez depois faria A Cela (2000), Nunca Mais (2002), O Garoto da Casa ao Lado (2015), além de clipes musicais e comédias românticas, no conturbado relacionamento com Ben Affleck. Jon Voight tinha muitos filmes no currículo antes de se tornar o canastrão de Anaconda, destacando-se Perdidos na Noite (1969), Amargo Pesadelo (1974) e Expresso para o Inferno (1985). O pai de Angelina Jolie depois alternaria produções boas e ruins, séries e filmes de ação como Missão Impossível (1996) e Lara Croft: Tomb Raider (2001). Em 2013, atuou como Van Helsing no péssimo Drácula – O Príncipe Das Trevas.

O paleontólogo Steven Cale foi interpretado por Eric Stoltz, que fez Pulp Fiction: Tempo de Violência (1994), Efeito Borboleta (2004), além de participação em filmes e séries de outros gêneros. Ele não pode reclamar muito de Anaconda, uma vez que esteve em A Mosca 2 (1989), de Chris Walas. E o câmera gente boa Ice Cube, além de músico, atuou em Fantasmas de Marte (2001) e em várias produções de ação e comédia como Sexta-Feira em Apuros (1995) e Policial em Apuros (2014). O reclamão de Anaconda, Jonathan Hyde, esteve em outros sucessos como Titanic (1997), A Múmia (1999) e A Colina Escarlate (2015).

Owen Wilson vinha de O Pentelho (1996), quando resolveu partir para o Rio Amazonas. Depois apareceria em Armageddon (1998) e A Casa Amaldiçoada (1999), conseguindo se tornar um rosto conhecido de muitas franquias como Uma Noite no Museu, Entrando numa Fria e Zoolander. Em 2008, fez um de seus filmes mais populares, Marley & Eu, tornando-se o ator simpatia de Hollywood. Por fim, Kari Wuhrer, que já havia aparecido em A Maldição (1996), teria papéis em Malditas Aranhas! (2002), A Morte pede Carona 2 (2003), Hellraiser: O Retorno dos Mortos (2005), Profecia: A Guardiã do Destino (2005), Profecia: Renegados (2005) e as bagaceiras Alien Tornado (2012) e Sharknado 2: A Segunda Onda (2014). Parou de atuar em 2018.

Por fim, vale um registro sobre o found footage Anaconda! Sim, existe! Durante o filme, o personagem de Ice Cube é visto o tempo todo com uma câmera registrando o documentário e suas experiências na expedição. Dez anos após o lançamento do filme, o músico e ator lançou seu próprio corte intitulado Iced Anaconda, um curta de dez minutos com suas gravações. A revista Empire chegou a elogiar a produção, chamando-a de “o melhor filme de cobra desde Anaconda.“, e deu à produção 4 estrelas! Isso, sim, é produção cult!

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Marcelo Milici

Professor e crítico de cinema há vinte anos, fundou o site Boca do Inferno, uma das principais referências do gênero fantástico no Brasil. Foi colunista do site Omelete, articulista da revista Amazing e jurado dos festivais Cinefantasy, Espantomania, SP Terror e do sarau da Casa das Rosas. Possui publicações em diversas antologias como “Terra Morta”, Arquivos do Mal”, “Galáxias Ocultas”, “A Hora Morta” e “Insanidade”, além de composições poéticas no livro “A Sociedade dos Poetas Vivos”. É um dos autores da enciclopédia “Medo de Palhaço”, lançado pela editora Évora.

3 thoughts on “Anaconda (1997)

  • 16/04/2024 em 00:43
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    Acredito que o simples fato de Anaconda ser até hoje lembrada, inclusive aqui, neste site que adoro, e estar no imaginário do brasileiro comum que viveu na época do vhs já faz de Anaconda um clássico. Ruim, tosco, vergonheira, mas um clássico.

    Fiquei feliz de achar essa crítica tão recente. Vim aqui pra ler sobre A Reliquia, figurinha carimbada na TV Record. Me diverti revendo.

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  • 11/04/2024 em 14:10
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    No mal sentido, a atuação de Jon Voight é a melhor coisa do filme rsrsrs

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  • 11/04/2024 em 09:35
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    E de fato é o melhor filme de cobra sim!!!

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