3.9
(14)

Fúria Primitiva
Original:Monkey Man
Ano:2024•País:EUA, Canadá, Singapura, Índia
Direção:Dev Patel
Roteiro:Dev Patel, Paul Angunawela, John Collee
Produção:Ian Cooper, Christine Haebler, Basil Iwanyk, Anjay Nagpal, Dev Patel, Win Rosenfeld, Samarth Sahni, Jomon Thomas
Elenco:Dev Patel, Pitobash, Jatin Malik, Sikandar Kher, Sobhita Dhulipala, Makrand Deshpande, Ashwini Kalsekar, Vipin Sharma, Adithi Kalkunte, Jomon Thomas, Brahim Chab

A primeira condução de Dev Patel veio com o impacto de uma porrada vingativa. Muitos diretores iniciantes ficam receosos em relação a sua primeira entrega, muitas vezes comandando produções sem ousadia, em roteiros seguros e sem polêmicas. Não é o caso do violento Fúria Primitiva (Monkey Man, 2024), que chegou aos cinemas brasileiros dia 23 de maio, e toca em assuntos delicados como religiosidade e política sem poupar o infernauta de suas camadas agressivas. Mulheres vítimas de escravidão sexual, aldeões expulsos de suas moradas incendiadas, um templo habitado por lutadores transgêneros e até o mundo obscuro das arenas e apostas ilegais fazem parte do cardápio narrativo, sem se esquivar das diferenças sociais e principalmente da idolatria política. Patel atira para todos os lados e acerta todos os alvos.

Os bastidores da produção demonstram um certo receio dos realizadores pela censura e toda polêmica envolvida. Quando a produtora vendeu os direitos de exibição à Netflix, esta pagou US$30 milhões de dólares sem mesmo avaliar o que tinha em mãos. Percebendo os riscos, ela não via espaço para o longa em sua programação pelas temáticas “perigosas“. A respeito, Patel comentou: “Não sabiam o que eles haviam negociado. O filme em si é muito mais denso e tem muito mais a dizer… não é sua cena de ação habitual na página um, até porque você não para de lutar. É tentar ir um pouco além.“. Contudo, o cineasta Jordan Peele gostou tanto que assumiu a função de produtor através da sua Monkeypaw Productions, conseguindo que a Netflix então vendesse o filme à Universal Pictures por US$10 milhões.

Fúria Primitiva estreou nos EUA e Canadá, disputando atenção com A Primeira Profecia e Godzilla x Kong: O Novo Império. Mesmo assim, com um orçamento estimado em US$10 milhões, o longa alcançou US$34 milhões, ocupando um bom número de salas e conquistando boas críticas. Houve o reconhecimento do esforço, da compreensão de suas mensagens e críticas sociais, e também como entretenimento. É bem mais do que uma produção de vingança e ainda traz mudanças significativas na construção de seu personagem, evoluindo ao longo da narrativa, ao ponto de fazer jus às comparações com John Wick. E tem sangue, muito sangue.

O protagonista (Patel) guarda lembranças de momentos agradáveis e traumáticos envolvendo sua mãe Neela (Adithi Kalkunte): os bons pensamentos resgatam passeios na floresta, ou quando ela contava pra ele a mitologia de Hanuman. Já o seu pesadelo está relacionado às ações do guru Baba Shakti (Makrand Deshpande), na cidade de Yatana, que, com o apoio do chefe de polícia corrupto Rana Singh (Sikandar Kher), expulsa os aldeões e coloca fogo nas casas. O que ele faz com a mãe do jovem ainda se mantém assustadoramente vivo em sua retina e nas queimaduras que possui nas mãos.

Agora, mais velho, ele vive de ganhos como um lutador com máscara de macaco no Tiger’s Temple, uma arena de boxe do submundo. Sendo incentivado pelo proprietário abusivo Tiger (Sharlto Copley), ele é obrigado a propositalmente perder nos confrontos alimentando as apostas nos oponentes. Disposto a se vingar de Baba, ele consegue com algumas ajudas – da proprietária Queenie (Ashwini Kalsekar), do capanga Alphonso (Pitobash) e até de um cãozinho vira-lata – um emprego na cozinha e depois como garçom do bordel Queenie Kapoor, estudando maneiras de chegar ao local VIP, onde se concentram os políticos e seu principal alvo.

No local, ele demonstra afeição pela jovem Sita (Sobhita Dhulipala), com quem troca olhares, mas consciente que sua ação vingativa dificultará uma aproximação. E precisará de muita coragem para ficar frente a frente com o combustível de seu ódio interno, o que não será fácil. Na segunda parte, ele conviverá um tempo com uma comunidade hijra, a partir do guardião de Ardhanarishvara, Alpha (Vipin Sharma), adquirindo crescimento espiritual e a chance de reviver seu trauma como maneira de superá-lo através de uma droga alucinógena. E, nos treinamentos e superação física, finalmente o “homem macaco” estará pronto para uma grandiosa batalha pelos andares do prédio luxuoso.

Com boa condução das sequências de ação, Patel apresenta um thriller explosivo e violento. Ele realmente não é um John Wick e não terá tanta habilidade nos confrontos numerosos, mas poderá contar com algumas ajudas. Os combates são bem intensos e coreografados, com o uso de objetos de cena, explorando luminosidade e o ritmo frenético. E tem tudo aqui, até mesmo perseguição de carros nas ruas, com o herói correndo com um riquixá, aqueles veículos da Índia que possuem três rodas e servem como táxi.

Patel, que já se mostrou um bom ator – ele está ótimo em A Lenda do Cavaleiro Verde -, agora demonstra ter uma boa visão como cineasta. O roteiro foi escrito por ele, Paul Angunawela e John Collee, contando uma história que vai além de uma produção de vingança ou filme de ação estúpido. Como ele mesmo disse em outro momento: “Eu acho que o gênero de ação às vezes tem sido abusado pelo sistema. Eu queria dar alma de verdade, trauma de verdade, dor de verdade… E eu queria infundir isso com um pouco de cultura.” De acordo com o IMDb, durante as filmagens, ele quebrou a mão, dois dedos, teve um ombro rasgado e uma infecção ocular, evidente em seu olhar avermelhado.

Assim, Fúria Primitiva é uma ótima pedida para quem aprecia um cinema sem freios, sem preocupações, ousado e profundo. Quando tiver uma oportunidade, não deixe de vê-lo!

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1 comentário

  1. Mais uma vez, temos outro filme que é uma isca que provoca você com a ideia de um filme de ação sangrento super legal, enquanto o afoga com uma palestra sobre justiça social. O início do filme conta a história de um homem que tenta entrar em uma organização criminosa responsável pelo tráfico de pessoas e tráfico sexual de mulheres para poderosos milionários e bilionários.

    Justamente quando você pensa que está prestes a assistir um exército de um homem só ir à guerra contra criminosos de seu país, o filme é interrompido bruscamente quando faz um desvio para ensinar ao público uma lição sobre a comunidade hijra. , conhecidos por serem pessoas trans do sul da Ásia.

    Filme perde o estilo, o ritmo e nunca mais se recupera. Fúria Primitiva se torna a tentativa pobre de Bollywood de fazer um filme de John Wick, até mesmo no que diz respeito a mostrar o relacionamento de nosso protagonista com um cachorro.

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